1 de junho de 2021

3 Mães: Terreal - Celestial - Eclesial

… Estarei convosco todos os dias, até o fim do mundo. Mateus 28, 20

Enquanto crianças, temos duas mães na Terra e uma no Céu; enquanto adultos, temos duas no Céu e uma na Terra. Os cristãos, ou pelo menos os católicos, têm sempre uma mãe na Terra e outra no Céu. Com o tempo, podemos perder, e perderemos certamente, a mãe que nos deu à luz; mas nem assim ficamos órfãos: a Santa Madre Igreja nunca a perdemos, pois, tal como as outras duas, precede-nos e continuará na Terra depois do nosso tempo, até ao fim dos tempos.

Recebemos a vida que Deus nos transmitiu através da nossa mãe que nos deu à luz. Esta é a nossa mãe individual, que desde bem cedo nos leva à Santa Madre Igreja, onde encontramos uma mãe que é, ao mesmo tempo, temporal, como a que nos deu à luz e “eterna” ou, melhor dizendo, temporalmente eterna pois durará enquanto o tempo existir. Assim, temos sempre duas mães na Terra e uma no Céu, ou duas no Céu e uma na Terra. Nunca estamos órfãos pois, onde quer que estejamos, temos sempre uma ou duas mães que nos consolam e nos confortam.

A NOSSA MÃE NA TERRA
Mãe… Palavra tão pequenina, bem sabem os lábios meus, que és do tamanho do Céu e apenas menor que Deus. Mário Quintana

Mamã, é a primeira palavra que aprendemos, sendo papá a segunda. Estas são as únicas duas pessoas às quais nunca tratamos pelo próprio nome. Nunca esquecerei o funeral do pai de um sacerdote que nunca nomeou o nome do pai, nem ao princípio, nem na homilia, nem no cânone, nem nas orações de despedida, mas sempre se referiu a ele como “pai”.

A nossa mãe não tem nome, é apenas a nossa mãe e, quando nos relacionamos com ela mesmo em adultos, voltamos a ser a criança que éramos, voltamos a submeter-nos. Para uma mãe, o filho nunca cresce; para um filho, a mãe nunca envelhece. Recordo o afeto e o respeito com que a minha mãe, nos seus 40 anos, tratava a sua mãe. Os filhos aprendem a ser filhos quando veem a forma como os seus pais se relacionam com os pais deles.

Maternidade versus paternidade
Dizem que as mães querem mais /Ao filho que mais mal faz / Por isso te quero tanto /Que tantas mágoas me dás. Horácio Menano, Fado Solitário

Para nós, católicos, não deixa de ser insólito que S. José, que apenas foi pai adotivo de Jesus e não pai biológico, seja o padroeiro dos pais. É justo que assim seja por duas razões:

a paternidade educadora e educativa é mais importante que a progenitura biológica; ser pai biológico não custa nada, comporta apenas um ato sexual que se supõe que seja por amor e com amor; ser pai educativo implica toda uma vida de dedicação e sacrifício por um filho.

Por outro lado, é justo que seja S. José o padroeiro dos pais, da paternidade ou do amor paternal porque, no fundo, se pensarmos bem, todos os pais são “existencialmente” pais adotivos. Enquanto que o ser mãe biológica comporta conceber e alimentar primeiro no seu seio, depois do nascimento dos seus seios; ser mãe, é uma experiência física psicológica e espiritual, ao passo que o ser pai biológico acontece a nível genético, não físico, nem afetivo nem espiritual.

Todos os pais, tanto biológicos como adotivos, vêm a conhecer os seus filhos muito mais tarde. E para que este filho reconheça o seu pai são precisos anos; ao princípio só conhece a mama, depois mais tarde vê mais além da mama, a mamã. Só quando o bebé com
eça a comer papa é que vem a conhecer o papá.

Nos primeiros anos da sua existência, o bebé não precisa do pai, a mãe basta-lhe. Só quando começa a abrir-se ao mundo e, precisamente como ajuda para se ir separando da mãe, o pai ajuda o bebé a integrar-se na sociedade, sendo fundamental no momento da socialização.

Depois, mais tarde na vida, como criança adolescente, jovem e adulto, o pai é “um arameu errante”: está sempre mais distante do seu filho que a mãe. Mãe e casa no sentido de lar são uma e a mesma coisa; a mãe é sempre um porto seguro ao qual se pode regressar para fugir das tempestades da vida.

Tanto o amor paternal como o maternal são incondicionais, mas se dos dois tivéssemos que escolher o que é mais incondicional, nem precisaríamos de pensar para chegar à conclusão de que é o maternal. O pai é mais exigente e, de alguma forma, para dar amor precisa de ver frutos. Certos pais sujeitam o seu amor ao triunfo ou ausência dele na vida dos seus filhos. Alguns pais chegam mesmo a abandonar os seus filhos quando estes não se corrigem ou não vão bem na vida.

A mãe não pode deixar de amar o fruto das suas entranhas e, ao contrário do pai que pode chegar a pôr de lado o filho que não singra na vida, a mãe é capaz de se dedicar ainda mais a esse filho, precisamente por isso, por a vida lhe ser adversa. Tal como Sta. Mónica que rezou 30 anos pela conversão do filho, uma mãe nunca desiste.

Amor versus instinto
Jesus sintetizou os 10 mandamentos com as suas centenas de adendas no “amor a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a ti mesmo” e disse que todo o Antigo Testamento se resumia a isso. O que prevaricava e não cumpria os mandamentos teria de fazer um sacrifício, dar algo das suas possessões para oferecer a Deus em resgate da dívida que tinha contraído com Ele quando o ofendeu.

Ao fim da sua vida, Jesus deu o seu mandamento, “dou-vos um mandamento novo”, este não estava no Antigo Testamento, mas era seu, era novo. Amai-vos uns aos outros como eu vos amei. Já não é amar ao outro como nos amamos a nós mesmos, mas muito mais do que nos amamos a nós mesmos. O sacrifício agora já não é oferecer algo do que tens, mas oferecer-te a ti mesmo. Por isso Jesus diz, ninguém tem maior amor que o que dá a vida pelos seus amigos.

Por aqui nos damos conta do longe que estamos do cumprimento do evangelho. Se conseguíssemos amar o nosso próximo como nos amamos a nós mesmos já não estaria mal, mas muitas vezes nem isso conseguimos – somos egoístas e queremos muito mais para nós que para o nosso próximo.

Se perguntarmos, porém, a uma mãe se ama o seu filho como se ama a si mesma ou mais do que se ama a si mesma, a resposta será fácil: qualquer mãe ama o seu filho muito mais do que se ama a si mesma e certamente estaria disposta a morrer por ele se um deles tivesse que morrer. E as fêmeas dos mamíferos e das aves não protegem também as suas crias e estão também elas dispostas a morrer por elas? É isto amor ou instinto maternal?

Chama-se paternalismo, mas deveria chamar-se maternalismo porque o comportamento ou atitude de “mãe galinha” é mais próprio das mães que dos pais. Uma mãe galinha será uma péssima sogra; de facto, todas as anedotas são contra as sogras e não contra os sogros. Não há muito que ouvi um marido queixando-se, “a minha mulher não faz nada sem consultar a mãe dela; todos os dias passam horas ao telefone…” e concluía, “casei-me com duas mulheres” … Muitas mulheres têm dificuldade em cortar o cordão umbilical, em separar-se dos seus filhos. Mas não há verdadeiro crescimento sem separação; nenhuma árvore cresce bem à sombra de uma outra árvore, necessita da luz direta do sol.

Convém que ele cresça e eu diminua – Toda a educação deve levar à autonomia e à independência; manter o outro na nossa dependência, como se fossemos eternos, não é prepará-lo para a vida sem nós. Os pais sabem que são temporais, ser pai ou mãe é um trabalho temporário até os filhos atingirem a idade adulta. Não há escolas eternas, ninguém é estudante para sempre, ninguém é filho em idade de educação para sempre.

Isto é claro nos animais que estão perto de nós na evolução das espécies; há um tempo em que a fêmea deixa de reconhecer a cria e de se comportar com ela como mãe; esta deve valer-se por si mesma. Vemos isto nas andorinhas ao fim do verão; supostamente já devem ter aprendido a voar e quando não se lançam do ninho no primeiro voo são mesmo os pais que as empurram, que as empurram para a vida.

Nos animais há, portanto, um mecanismo que põe fim ao instinto maternal; o mesmo não acontece nos humanos. Neste, como em outros campos, deve ser a maturidade psicológica que tem que pôr fim ao instinto e transformá-lo num amor adulto que busca a autonomia e o bem do outro, não o manter numa eterna dependência enfermiça para ambos, tanto para a mãe como para o filho.

A maternidade configura a feminilidade
Como a participação na gestação de um ser humano é pouco significativa para o varão, poucas mudanças ocorrem nele com o nascimento do seu filho. Muitos continuam até a comportar-se como se não fossem pais. O mesmo não acontece no caso da mulher. O seu corpo muda não só durante os 9 meses, mas depois destes. A principal mudança, porém, opera-se a nível psíquico e espiritual.

Muitos maridos se queixam de que depois das suas esposas serem mães, estas vivem quase exclusivamente para o seu filho, negligenciando o marido. É como se ser mãe lhes enchesse as medidas, lhes bastasse; muitas mães chegam a afirmar que o amor da sua vida não é o marido, mas o seu filho.

Por estranho que pareça, também nós não olhamos para uma mulher da mesma forma depois da sua experiência de maternidade. Se virmos uma mulher de seios descobertos o nosso sentimento é um, se virmos essa mesma mulher amamentando um bebé, já não olhamos para os seus seios da mesma forma. Olhamos para ela e para os seus seios em relação ao bebé, não os abstraímos do bebé.

Modelo de identificação para a filha
Filho és pai serás, como fizeres assim acharás

Depois do complexo de Édipo ou de Electra, as crianças começam a olhar mais para o progenitor do mesmo sexo. Mesmo na escola, as crianças que estão a descobrir a sua própria identidade juntam-se mais às outras crianças do mesmo sexo do que às do sexo oposto. A mãe é modelo de identificação para as meninas, assim como o pai o é para os meninos.

Libris ex libris fiunt – A menina olha para a mãe como uma semideusa e trata de imitá-la em tudo; supostamente imita as suas virtudes, mas frequentemente também imita os seus defeitos. Os pais deviam ter consciência dos seus defeitos e tentar contê-los para não os passar para os próprios filhos, pois como alguém dizia, a educação é aérea – é o ambiente que se cria em casa que é educativo, são as atitudes exibidas pelos pais no dia a dia da vida familiar que são educativas ou deseducativas.

Para que a humanidade cresça, os pais devem passar aos seus filhos as suas virtudes e não os seus defeitos. Os filhos deviam, como numa corrida de estafetas, purificar, refinar a humanidade recebida dos seus pais e levá-la a um outro patamar.

O primeiro amor para o filho
Dicem que el hombre no es hombre mientras no oye su nombre de labios de una mujer. António Machado

O complexo de Édipo para o menino e o complexo de Electra para a menina não são sonhos de uma noite de verão ou fantasias de Freud. São reais e todos os experimentámos na nossa vida infância. Como o pai é para a menina, a mãe é o primeiro amor da vida do menino, a primeira experiência com o sexo oposto. Não é a menina que encontra no jardim de infância, na escola primária ou na escola secundária; essa menina já é a segunda, a primeira foi a mãe.

Como as primeiras experiências, tanto boas como más, são as que nos marcam mais profundamente para o resto das nossas vidas, a vivência com a nossa mãe, para além de ter o peso e a importância de uma primeira experiência, também se transforma em arquétipo, paradigma ou modelo das experiências posteriores.

Passaremos o resto da nossa vida, inconscientemente, medindo todas as mulheres em relação à nossa mãe que, sem querer, é inconscientemente o padrão do que entendemos por mulher e, ao fim acabamos por casar-nos com ela como muito bem diz Freud. Ou seja, casamo-nos com uma mulher que é como ela, se a vivência com a nossa mãe tiver sido positiva ou que é totalmente oposta a ela, se a vivência com a nossa mãe tiver sido negativa. Tanto num caso como no outro, ela, a nossa mãe, é sempre o ponto de referência.

Evidentemente tudo o que disse em relação à nossa mãe vale de igual forma para as meninas na sua relação com o pai. Dizem que as meninas que têm uma boa relação com o pai namoram muito mais tarde pois, para o que precisam num homem, já o têm em casa. As que se relacionam mal com o pai ou têm um pai distante, desinteressado e inexistente, começam a namorar mais cedo e, inconscientemente, não andam à procura de um namorado ou de um noivo, mas sim de um pai que não têm em casa. Evidentemente a consequência de uma relação estabelecida com base nestas motivações é inevitavelmente o fracasso.

Por experiência posso afirmar que nenhuma mulher pode substituir a mãe se esta existir. Em pleno complexo de Édipo, entre os cinco e seis anos de idade, estando eu completamente enamorado pela minha mãe como toda a criança nessa idade, não sentia que o meu amor fosse correspondido porque a minha mãe sempre foi fria e distante, pouco afetiva em gestos ou em palavras.

Por este tempo, ao entrar para a escola, tive como professora a D. Soledade uma jovem e belíssima professora no seu primeiro ano letivo. Ela gostava muito de mim e, como era muito afetiva, não se cansava de mo referir por palavras e por gestos; mas eu não lhe correspondia, lembro-me muito bem como se fosse hoje, de andar confuso, de não entender por que a minha mãe não era como a minha professora e de como desejava receber amor só da minha mãe. Em resultado deste estado, um dia agredi a minha pobre professora, dei-lhe um valente pontapé nas canelas. A dor foi tão forte que até se lhe soltou o sangue do nariz, coisa que lhe acontecia com frequência.  

A NOSSA MÃE NO CÉU
Quando Jesus viu sua mãe e perto dela o discípulo que amava, disse à sua mãe: Mulher, eis aí o teu filho. Depois disse ao discípulo: Eis aí a tua mãe. E dessa hora em diante o discípulo levou-a para a sua casa. João 19, 26-27

O mundo foi ingrato para com Jesus e, provavelmente, Maria, sua mãe, foi das poucas pessoas que o amou. Por isso nos momentos finais da sua vida, Jesus não se esqueceu da sua mãe que, como a viúva de Naim, estava a perder o seu único filho sendo já viúva e se preparava para ficar sozinha no mundo. No episódio da viúva de Naim, Jesus dá um filho a uma mãe; no alto da cruz, Jesus dá uma mãe a um filho, ao discípulo amado que representa todo o discípulo de Jesus.

Não é bom discípulo, não é discípulo amado do Mestre quem não acolhe a Maria, sua mãe, na sua casa, quem a deixa aos pés da cruz com um filho morto nos braços, quem a abandona à sua dor e não a consola no seu lar.

Maria é mãe de Cristo porque foi ela que lhe deu um corpo, que o concebeu no seu seio virginal; Maria é mãe da Igreja porque assistiu em oração com os apóstolos ao seu nascimento com a vinda do Espírito Santo. Já conhecedora do Espírito Santo por quem tinha concebido por obra e graça, Maria era a pessoa mais qualificada para guiar os apóstolos nos caminhos do Espírito, a pessoa mais capacitada para os catequizar em preparação para o Pentecostes do Crisma dos Apóstolos, a treinadora dos apóstolos em matéria do Espírito Santo. Uma Igreja sem Maria como mãe seria um orfanato, como diz o Papa Francisco.

Maria é nossa mãe agora e na hora da nossa morte. Maria constantemente ora por nós em todos os agoras da nossa vida e certamente na hora da nossa morte, como diz a oração da Ave Maria. Ela que assistiu, confortou o seu filho com a sua presença na agonia da cruz, certamente estará aos pés da nossa cruz também no momento da nossa passagem para o Pai, ou seja, do nosso nascimento para o Céu, para a vida eterna. Maria assiste por isso ao nosso nascimento para a vida eterna, como assistiu ao nascimento do seu filho para esta vida e para a vida eterna e como assistiu ao nascimento da Igreja.

Ave versus Eva
À vossa proteção recorremos, Santa Mãe de Deus. Não desprezeis as nossas súplicas em nossas necessidades, mas livrai-nos sempre de todos os perigos, ó virgem gloriosa e bendita. Amém

Eva não foi a nossa mãe, mas sim a nossa progenitora: só nos deu à luz, mas não nos educou. A mãe que educa, cria e alimenta é chamada na Etiópia “Injera enat”, ou seja, a “mãe do pão” que, muitas vezes, não coincide com a que deu à luz.

Tive como colega de noviciado e estudante de teologia um jovem que à tia chamava mãe e à mãe chamava tia. Àquela que o tinha dado à luz ele chamava tia e àquela que o tinha educado como mãe e que era biologicamente a sua tia, chamava mãe. Eram duas irmãs: uma teve o meu colega de uma forma acidental, mas mais tarde encontrou o homem da sua vida; este não aceitava o filho dela, pelo que a sua irmã, que não pensava em casar-se, ficou com ele para que ela ficasse livre e pudesse iniciar uma vida nova com o seu noivo.

O meu colega não tinha para com a sua progenitora a quem chamava tia nenhum sentimento filial e, no entanto, tinha sido ela que o tinha dado à luz; sentimento filial tinha só por aquela que o tinha criado com muito amor, educado e guiado na vida, dedicando-se a ele exclusivamente, pois nunca quisera casar. E, no entanto, a nível biológico, era só a sua tia.

No ser humano, a biologia pouco conta. Chamamos-lhe Madre Teresa de Calcutá e suponho que ninguém se atreveria a negar-lhe o título de madre. No entanto, como todos sabemos, ela nunca foi biologicamente mãe, embora se tenha comportado como tal para muitas crianças órfãs e até adultos, que viram nela a mãe que nunca tiveram.

A devoção do povo cristão, ao menos dos católicos e ortodoxos, a Maria parte da proximidade que temos com a nossa mãe na terra. Ela está mais perto de nós que o nosso pai e, muitas vezes, fazemos dela intermediária entre nós e ele, pois temos mais confiança com a nossa mãe que com o nosso pai. Ela está sempre ao nosso lado e acompanha-nos mais que o nosso pai. Esta experiência faz com que o povo cristão tenha por Maria uma especial devoção e projete nela a mesma experiência, o mesmo tipo de relacionamento que teve ou tem com a sua mãe.

Maria é nossa mãe porque, como toda a mãe, está atenta às necessidades dos seus filhos, como esteve nas bodas de Caná e está ainda hoje ao visitar-nos em Guadalupe, Lourdes e Fátima. Maria é a nossa mãe porque ela nos educa com o evangelho do seu filho quando nos diz “fazei tudo o que ele vos disser”. Eva foi a nossa progenitora, Ave é a nossa mãe do Céu que acompanha a nossa vida na terra até nos unirmos a ela no Céu.

Com minha Mãe estarei, Na Santa glória um dia / Junto à Virgem Maria, no céu triunfarei. No Céu!  No Céu!   Com minha mãe estarei. No Céu!  No Céu!   Com minha mãe estarei… canto popular mariano

MATER ECCLESIA
Pode uma mulher esquecer-se daquele que amamenta? Não ter ternura pelo fruto de suas entranhas? E mesmo que ela o esquecesse, eu não te esqueceria nunca. Eis que estás gravada na palma de minhas mãos, tenho sempre sob os olhos tuas muralhas Isaías 49, 15-16

Igreja, corpo místico de Cristo
Aproximai-vos do Senhor, que é a pedra viva, rejeitada pelos homens, mas escolhida e preciosa aos olhos de Deus. E vós mesmos, como pedras vivas, entrai na construção deste templo espiritual, 1 Pedro 2, 4-5

Não conhecendo ainda os mistérios da vida que a biologia nos revela, a melhor imagem que Pedro encontrou para se referir à Igreja como corpo místico de Cristo onde Ele é a cabeça, foi a de um templo construído com pedras colocadas umas sobre a outras, como peças de lego. Mas como um templo é algo inanimado, assim como as pedras de que é formado, então chamou-lhes pedras vivas.

Se tivesse os conhecimentos em biologia que hoje temos, usaria a imagem do nosso próprio corpo para explicar como a Igreja é o corpo místico de Cristo. Olhamos para o nosso corpo como único, livre e independente, como unidade indivisível, mas na verdade, do ponto de vista biológico, o nosso corpo é constituído por triliões de células, sendo cada uma destas células um organismo vivo, ou seja, um ser vivo.

O que nos parece um todo único, autónomo e indivisível, é na verdade uma comunidade de triliões de seres vivos. Estão unidos porque são familiares de sangue uns dos outros. O nosso corpo é formado por uma irmandade de triliões de células; sim, as células atuais que formam o nosso corpo são todas irmãs e por isso se mantêm juntas; se assim não fosse já se teriam separado.

Quando nos transplantam um órgão, o nosso corpo rejeita-o porque é formado por células estranhas às nossas; as células do órgão em questão, são células irmãs entre si, mas não da mesma família que as células que formam o nosso corpo. Por isso, a pessoa que vive com um órgão transplantado tem de tomar todos os dias medicação que vai enganar o seu corpo para que este não rejeite o órgão que recebeu.

As células do nosso corpo são irmãs entre si porque todas elas são descendentes daquela célula mãe ou primigénia que se formou no momento em que fomos concebidos. Neste momento que ocorreu 9 meses antes do nosso nascimento, metade de uma célula proveniente do nosso pai, um espermatozoide X ou Y fundiu-se com outra metade de célula proveniente da nossa mãe, um óvulo que, do ponto de vista cromossómico é sempre X, originando uma célula nova com um código genético novo.

Imediatamente esta célula começa a dividir-se e a reproduzir-se, até formar o corpo completo de um ser humano. Apesar de cada uma das nossas células ser a unidade mais pequena da vida e, portanto, autónoma e independente, o que as mantém unidas formando um corpo é o facto de todas elas terem o mesmo código genético.

E pluribus unun – Como células do corpo místico de Cristo, que é a Igreja, o que nos mantém unidos é a mesma fé em Cristo. Esta fé, presente em todos nós, funciona no nosso interior como o código genético (ADN) no interior das células. Tal como as células que formam o nosso corpo são diferentes entre si, as células do sangue são diferentes das dos ossos, das dos músculos, da pele e de cada um dos órgãos, também nós, cristãos, somos pessoas de diferentes grupos étnicos, geografias, línguas, países e culturas e, no entanto, conseguimos manter-nos unidos numa só Igreja Católica porque todos nascemos, crescemos, vivemos e nos movemos na mesma fé em Cristo, que é o código genético ou ADN da Igreja, o que matem os cristãos, de diferentes géneros raça povo e nação, todos unidos.  

Universalidade da Igreja católica
Como válida só se tenha a Eucaristia celebrada sob a presidência do bispo ou de um delegado seu. A comunidade reúne-se onde estiver o Bispo e, onde está Jesus Cristo, está a Igreja católica. Sem a união do Bispo não é lícito batizar nem celebrar a Eucaristia; só o que tiver a sua aprovação será do agrado de Deus e assim será firme e seguro o que fizerdes" Sto. Inácio de Antioquia Epístola aos Esmirniotas 8, 2 (AD 107)

Sto. Inácio de Antioquia da Síria (68-107), segundo Eusébio de Cesareia, foi um dos primeiros bispos da segunda comunidade cristã fundada depois da comunidade de Jerusalém – Antioquia da Síria. Foi precisamente ali que os seguidores de Cristo, até então chamados nazarenos, foram, pela primeira vez, chamados cristãos, segundo o livro dos Atos dos Apóstolos, 11, 26.

Apesar dos seguidores de Cristo terem sido apelidados de cristãos, a Igreja nunca foi chamada cristã. Até ao ano 107 chamava-se simplesmente Ecclesia. No entanto, o bispo Inácio, ao dar-se conta da vocação universal da Igreja, chamou-a católica. Efetivamente, o primeiro nome que a Igreja teve foi católica no ano 107, segundo reza o escrito de St. Inácio acima citado, quando ainda só havia uma única Igreja, a fundada por Jesus.

Todos nós, batizados católicos, em países tradicionalmente católicos, quando chegamos à idade da autoconsciência, por volta dos seis ou sete anos de idade, ao mesmo tempo que nos reconhecemos como pessoas e cidadãos de um país, também nos reconhecemos como membros de uma organização supranacional, a Igreja Católica.

Não é coincidência que os pais fundadores da União Europeia, o francês Robert Schumann, o alemão Konrad Adenauer e o italiano Alcide de Gasperi, fossem todos católicos. Segundo o historiador Alan Fimister, num livro sobre Robert Schuman, a União Europeia é de facto um projeto católico em linha com a doutrina social da Igreja, desde a Encíclica Rerum Novarum do Papa Leão XIII (1878-1903). O princípio da subsidiariedade, hoje lei europeia e também emenda da Constituição dos Estados Unidos, apareceu pela primeira vez nesta mesma encíclica.

Todas as igrejas ortodoxas, assim como as protestantes, são Igrejas nacionais ligadas a uma cultura particular e na África até mesmo à particular idiossincrasia de uma tribo. Só a Igreja Católica, a que Jesus fundou, é verdadeiramente supranacional e supra cultural.

Os católicos são certamente mais universalistas que os protestantes e os ortodoxos, pois beberam universalismo da mesma forma que se amamentaram no seio das suas mães, uma vez que foram batizados poucos dias após o seu nascimento, na Igreja que Cristo fundou e que é católica.

O termo católico romano
A Igreja nunca chamou a si mesma católica romana, pois em, si mesmo, o termo é uma “contradictio in terminis”; se o termo católico significa universal, a Igreja que é católica não é romana, se é romana não é católica. O termo nasceu e foi promovido pela Igreja anglicana em Inglaterra para, de alguma forma, justificar o cisma da Igreja; para os anglicanos que criaram o termo, a Igreja Católica do Credo de Niceia era composta pela Católica Romana, Católica Anglicana, e Católica Ortodoxa.

Como os anglicanos são uma igreja do Estado de Inglaterra e invejam tanto a catolicidade da igreja de que Jesus fundou, da qual já fizeram parte, que nos colocaram um nome local "Romano" para diminuir a nossa catolicidade que os incomoda tanto, e permitir-lhes também usar o termo católico. A verdade é que só a Igreja Católica é, de facto, católica, todas as outras protestantes ou ortodoxos são igrejas nacionais, igrejas locais ou provinciais que existem apenas numa área geográfica bem demarcada.

Foram precisamente os bispos católicos de língua inglesa que alertaram já os seus colegas, tanto no Concílio Vaticano I como no II, para que a Igreja nunca usasse o termo ao referir-se a ela mesma.

O termo é ainda usado, mas só nos países que falam inglês; muitas paróquias da arquidiocese de Toronto usam o termo na completa ignorância da ideologia que lhe subjaz; pelo menos o Cardeal e os seus bispos auxiliares tinham obrigação de saber e de respeitar a vontade dos seus congéneres ingleses nos dois últimos Concílios da Igreja Católica.

“Mater et magistra”
Gaudet Mater Ecclesia… Alegra-se a Santa Mãe Igreja, porque, por singular dom da Providência divina, amanheceu o dia tão ansiosamente esperado em que solenemente se inaugura o Concílio Ecuménico Vaticano II, aqui, junto do túmulo de São Pedro, com a proteção da Santíssima Virgem, de quem celebramos hoje a dignidade de Mãe de Deus. João XXIII Discurso de abertura do Concílio Vat. II

A Igreja como mãe
Segundo o Papa Francisco numa das suas homilias, a Igreja é a nossa Mãe que nos gerou no dia do nosso batismo e, tal como uma mãe, educa-nos e protege-nos com mansidão e bondade. Conceber a Igreja sem este sentimento materno, é pensar numa associação rígida, sem calor humano; uma igreja assim concebida, diz o papa, faz-nos a todos órfãos.

Chamar mãe à Igreja não é tão comum entre os protestantes como o é entre os católicos, provavelmente porque estes não se relacionam com Maria, mãe do Senhor, como mãe da Igreja porque assistiu ao nascimento desta tal como assistiu ao nascimento do seu filho, e como mãe nossa, dada pelo próprio filho no alto da cruz.

Do sentimento de maternidade de Maria, mãe de Cristo, mãe de Deus, mãe da Igreja se deduz por afinidade, o sentimento de maternidade da Igreja. A Igreja é nossa mãe porque Maria é mãe da Igreja e nossa mãe também.

A Igreja como mestra
Doutores tem a santa Madre Igreja que vos saberão responder…

Na Igreja, nem todos são profetas, nem todos são doutores e nem todos podem responder a todas as perguntas. O dito acima citado é a resposta de um homem humilde a quem um não-crente coloca uma pergunta difícil à qual não sabia responder. Reconhecendo humildemente que não consegue responder, encaminha-o para quem na Igreja o pode guiar até à resposta à sua pergunta.

Em nenhum outro há salvação, porque debaixo do céu nenhum outro nome foi dado aos homens, pelo qual devamos ser salvos. Atos 4, 12

A Igreja é mestra no ensinamento e na proposição aos homens de Cristo como modelo, paradigma, referência da humanidade. Quem quer ser autenticamente humano, mede-se em relação a Cristo, pois só por Ele se pode ir ao Pai Deus. Mesmo olhando para a narrativa do evangelho do ponto de vista puramente humano, não há debaixo dos céus narrativa que contenha mais humanidade que a vida, os ditos e os feitos de Jesus de Nazaré.

Quem não recolhe comigo, dispersa, diz o Senhor. Não há debaixo do Céu nenhum outro modelo de humanidade que seja igualmente válido e que leve à felicidade e autorrealização de todos os sonhos que o modelo de Cristo, que é caminho, verdade e vida.

A nossa vida em frente do altar
Em verdade, em verdade vos digo: aquele que crê em mim fará também as obras que eu faço, e fará ainda maiores do que estas, porque vou para junto do Pai. João 14,12

A Igreja é sacramento universal de salvação, ou seja, a Igreja é a legítima dispensadora das graças de Deus por intermédio do seu filho, graça primigénia. Cristo não veio ao mundo só para os israelitas da sua geração. Não faria sentido que a ação do filho de Deus ficasse reduzida aos homens de um lugar e de um tempo. A Igreja é os pés, a boca, as mãos do Senhor, pois atua aqui e agora, no aqui e agora de todos os tempos e lugares, o mesmo que Cristo que, humanamente, só podia viver uma vez e agir em Israel há 2 000 anos.

Salvação significa saúde, por intermédio da Igreja que é o seu corpo, nós acedemos aos bens que nos vêm de Jesus, a quem ela representa no aqui e agora da história social e da nossa individual. Estes bens são os sacramentos.

Diante do altar, a Igreja Mater et Magistra acolhe-nos no seu seio logo que a nossa mãe física nos dá à luz, no sacramento do batismo, quando iniciamos a nossa caminhada com Cristo ao nosso lado. Os nossos pais entregam-nos à maternidade da Igreja, pois a sentiram como mãe, eles mesmos durante a sua vida.

Mais tarde, no mesmo lugar diante do altar, recebemos pela primeira vez a eucaristia e, toda a nossa vida ali vamos em cada domingo, para entrar em comunhão com Aquele que é a razão da nossa vida, o pão e o vinho do nosso sustento. Mais tarde, ainda no mesmo lugar diante do altar, recebemos o crisma, respondendo desta vez pessoalmente às mesmas perguntas que nos fizeram no dia do nosso batismo, no pleno uso da nossa liberdade.

Mais tarde, ainda é ali que nos ordenamos sacerdotes, que fazemos os votos temporais ou perpétuos na vida religiosa ou nos casamos. Ali voltamos cada domingo na comunhão ou para participar nos sacramentos dos nossos filhos e parentes e, por fim, tal como no dia do nosso batismo, ali nos levam e diante do Círio Pascal aceso se apaga aquela vela que anos atrás ali foi acesa e que até ali brilhou. A nossa vida começa, decorre e acaba em frente do altar da Igreja, nossa mãe que sempre nos acompanha guia, alimenta, consola e conforta.

A vida começa como termina e termina como começa. No batismo somos levados à igreja para o nosso enterro somos levados para a igreja; a primeira vez e a última vez que vamos à igreja somos levados. A liturgia do enterro é muito semelhante à liturgia do batismo. O caixão está coberto de branco como estávamos no momento do nosso Batismo e a água benta é usada novamente como foi no dia do nosso batismo.

Conclusão: a nossa mãe terreal dá-nos à luz, cuida de nós, e educa-nos para a liberdade e independência; a nossa mãe eclesial inicia-nos na fé em Cristo, modelo de vida humana, e educa-nos para a igualdade e interdependência como membros de uma comunidade; a nossa mãe celestial "roga por nós agora e na hora da nossa morte", ou seja, assiste-nos no nosso nascimento para a vida eterna.

Pe. Jorge Amaro, IMC


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