15 de setembro de 2021

3 Etapas da vida cristã: Fé - Experiência - Missão

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(…) todo aquele que invocar o nome do Senhor será salvo. Como, pois, invocarão aquele em quem não creram? E como crerão naquele de quem não ouviram? E como ouvirão, se não há quem pregue? E como pregarão, se não forem enviados? Como está escrito: Quão formosos os pés dos que anunciam o evangelho de paz; dos que trazem alegres novas de boas coisas. Romanos 10, 13-15

No invocar o nome de Nosso Senhor Jesus Cristo como “Meu Senhor e meu Deus”, como fez S. Tomé (João 20, 28), está a nossa salvação. Quem acreditar, quem tiver fé, será salvo (Marcos 16, 16). Porém, para invocar a Cristo, é preciso ter fé, para que uma pessoa tenha fé tem de escutar a Palavra, alguém tem que lhe anunciar a Palavra de Deus. Esse alguém não pode ser um meio de comunicação, nem a Bíblia por si só.

Se lançássemos de paraquedas montes de Bíblias sobre uma tribo isolada, o facto de ler e reler a Bíblia não seria suficiente para que tivessem fé. Alguém enviado a partir de uma comunidade cristã tem de ir anunciar-lhes a Palavra. Alguém que partilhe com eles a sua experiência, o seu testemunho, alguém que vá proclamar o que o Deus em que acredita fez na sua vida.

A Bíblia é Palavra de Vida, por isso só pode ser anunciada por quem a vive, por quem a encarna ou se esforça por a encarnar. A fé é como um vírus positivo que passa de pessoa para pessoa, a fé é contagiante e só passa daquele que a tem por contágio, ou seja, daquele cuja fé opera maravilhas na sua vida.

João 1, 14 – “O Verbo se fez carne, e habitou entre nós” – A salvação para o mundo veio quando a Palavra eterna de Deus se fez carne na pessoa de Jesus de Nazaré. A salvação para cada um de nós, não é automática, passa pela fé que nos abre a porta às coisas de Deus, mas experimentamos essa salvação na medida em que paulatinamente encarnamos essa Palavra.

Quando a Palavra se fizer carne da nossa carne, ou seja, quando converter a nossa alma, coração e mente de tal forma que as nossas obras e o nosso comportamento no dia a dia e em cada situação for, regulado pela pauta do Evangelho, quando como S. Paulo pudermos minimamente dizer, “Já não sou eu que vivo, é Cristo que vive em mim” (Gálatas 2, 20), então poderemos dizer que somos cristãos, ou seja, outro Cristo na Terra.

Fala do evangelho em o todo tempo e em todo o lugar e se for necessário usa palavras. São Francisco de Assis

O cristão autêntico e genuíno, pelo próprio facto de o ser, é missionário. “A boca fala da abundância do coração”, portanto se a boca não fala é porque não há abundância no coração. Um copo quando está cheio de água ou vinho extravasa; se extravasa é prova de que está cheio e se não extravasa é prova de que não está cheio. Como diz o dito de São Francisco, o cristão já é missionário pelo simples facto de ser cristão.

O viver de cada dia de um cristão autêntico e genuíno é sal da terra e luz do mundo. (Mateus 5, 13-16). O seu viver é evangelizador per se, pois, mostra o caminho a tantas outras pessoas.

O contrário também é verdade: quando uma pessoa se afirma cristã mas a sua vida não coincide minimamente com o Evangelho, então em vez de ser um degrau para ajudar os outros no caminho cristão ascendente de Jesus, que é Caminho, Verdade e Vida, é uma pedra de tropeço, que em grego se diz “escândalo”, faz os outros cair, é um contratestemunho anti evangelizador, transforma-se num fariseu do tempo de Jesus que não entra nem deixa entrar, não se salva nem permite a salvação aos outros.

A Palavra encarnada faz um cristão autêntico. Este cristão transforma-se em Palavra anunciadora que, por sua vez, leva a que os que a ouvirem e virem encarnada a possam também eles encarnar. A Anunciação do anjo levou à encarnação da Palavra; toda a anunciação de alguém que encarnou a Palavra leva a outra encarnação. O movimento não se pode parar; anunciação – encarnação – anunciação – encarnação… “ad infinitum”, de geração em geração até aos confins do mundo.

O testemunho de alguém que tem fé, provoca a fé naquele que o ouve. A fé professada deste, abre a porta à experiência, ou seja, a que ele mesmo experimente a salvação da qual o evangelizador deu testemunho: uma vez experimentada esta salvação, ele mesmo se transforma em evangelizador, ele mesmo se transforma num missionário, em alguém que dá testemunho das maravilhas que o Senhor operou nele.

Como todo o discípulo se converte em mestre, a fé no testemunho de alguém leva à minha experiência, a verificar pessoalmente o que me dizem e, quando começo a sentir ou experimentar o mesmo, ou seja, a salvação, converto-me em missionário. É como aquela senhora que padecia de uma maleita e tomou um chá que a curou; uma vez experimentada a saúde (salvação significa saúde) foi e anunciou às suas amigas e vizinhas, aos quatro ventos, os benefícios daquele chá.

Este modelo ou paradigma da difusão do Evangelho, Fé – Experiência – Missão, já o encontramos nos próprios evangelhos: em Maria, mãe do Senhor, no episódio da Samaritana, em Maria Madalena, nos discípulos de Emaús. Debrucemo-nos aqui sobre o episódio da Samaritana, de Maria Madalena e dos discípulos de Emaús, deixando Maria para quando falarmos da Missão. No evangelho de João, Jesus chama a André, este partilha como seu irmão Simão a experiência de ter encontrado o Messias.

André e João – João, 36-42
A Igreja colocou o nascimento de João no solstício de verão, quando os dias começam a minguar, e o nascimento de Jesus no solstício de inverno, quando os dias começam a crescer. Isto porque João disse: “Convém que eu diminua e Ele (referindo-se a Jesus) cresça”. Pondo em prática este projeto, João cede a Jesus os seus discípulos; a dois deles, André irmão de Simão Pedro e João irmão de Tiago, assinala-lhes Jesus e diz:

Eis aqui o Cordeiro de Deus – Esta é a afirmação vinda de um sacerdote porque João, ao ser filho de um sacerdote Zacarias, era ele mesmo ipso facto um sacerdote. Como diz João Evangelista no seu evangelho, João Batista não é a Luz, ele veio para dar testemunho da Luz, por isso aponta o dedo a Jesus dizendo que Ele é o último cordeiro imolado, Ele vai substituir o sistema sacrificial.

Vinde, e vede. Foram, e viram onde morava, e ficaram com Ele aquele dia – André e João acreditaram no testemunho de João e dispuseram-se a seguir Jesus, para saber onde morava, qual era a sua doutrina, qual era a sua identidade. Veni vidid e vincit, foram, viram e venceram. Experimentaram a Jesus como manso e humilde de coração e a sua doutrina, não como um fardo pesado da lei de Moisés, mas como um jugo suave e leve.

Achamos o Messias (que, traduzido, é o Cristo). E levou-o a Jesus – Depois da experiência, ficaram tão (com)vencidos e tão alegres por terem encontrado o Messias, que não descansaram enquanto não foram partilhar essa alegria com os seus mais chegados, neste caso, o irmão de André. Há certas alegrias que, se uma pessoa não as partilhar, rebenta. A tristeza partilhada diminui, a alegria partilhada aumenta.

A Samaritana – João 4, 1-41
No caminho entre a Judeia e a Galileia, Jesus passou por Samaria e abeirou-se do poço de Sicar onde, séculos antes, Jacob tinha encontrado a sua amada Raquel. Ali encontrou uma mulher que àquela hora do dia, vinha à procura de amor com a desculpa de vir por água. As fontes e os poços sempre foram lugares de encontro entre amantes, pois são dos poucos lugares onde a mulher pode ir amparada pelo subterfúgio de ir buscar água.

Aquele que beber da água que Eu lhe der nunca mais terá sede (…)- Fizeste-nos Senhor para ti e o nosso coração anda inquieto enquanto não repousa em ti (Sto. Agostinho) – Jesus joga o mesmo jogo da Samaritana – o pedir água é só um subterfúgio para dar à Samaritana o que o seu coração anseia: o amor de Deus, um amor fiel, para sempre, que a livre de vir obsessivamente uma e outra vez tirar água do poço, ou seja, que a livre de andar de amante em amante, partindo o seu coração uma e outra vez.

Senhor, dá-me dessa água, para que não mais tenha sede, e não venha aqui tirá-la - Em Jesus encontrou a Samaritana a fonte do amor divino, uma água que jorra a partir de dentro até à vida Eterna. O amor humano enche o nosso coração, mas não totalmente; por outro lado, faz-nos dependentes do outro. O amor divino enche plenamente o nosso coração, não nos faz dependentes, mas sim livres. “Nada te perturbe, nada te espante, quem a Deus tem nada lhe falta só Deus basta” (Sta. Teresa de Ávila)

Deixou, pois, a mulher o seu cântaro, e foi à cidade, e disse àqueles homens: “Vinde, vede um homem que me disse tudo quanto tenho feito. Porventura não é este o Cristo?” – Ao passar pela experiência do amor divino, ao sentir dentro do seu coração o amor de Deus, a Samaritana fica tão contente que não pode deixar de transmitir aos seus conterrâneos o testemunho de tão sublime experiência. A prova de que não vinha buscar água está no facto de ter deixado o cântaro no poço, o que também prova que a sua sede estava, de uma vez por todas, satisfeita.

Muitos dos samaritanos daquela cidade creram n’Ele, pela palavra da mulher, que testemunhou: Disse-me tudo quanto tenho feito. – Jesus fez com a Samaritana uma leitura do passado à luz do presente, da experiência do amor de Deus. A Samaritana já não tinha que esconder o seu passado nem ter vergonha dele, pois este lhe foi revelado sob uma nova luz, como etapas para chegar a conhecer o amor verdadeiro.

Já não é pelo teu dito que nós cremos; porque nós mesmos o temos ouvido, e sabemos que este é verdadeiramente o Cristo, o Salvador do mundo. - Tudo o que faço é sentar-me nesta margem e vender água do rio, disse um evangelizador; o negócio prospera porque os compradores não veem o rio; desde o momento em que eles mesmos veem o rio, já não precisam que lhe venda água, eles mesmos podem vir aqui buscá-la. Os samaritanos já não precisam de acreditar no testemunho da sua conterrânea, não precisam de ter fé, porque vieram ter com Jesus, e experimentaram eles mesmos a sua salvação de em primeira mão.

Maria Madalena – João 20, 1-18
Maria Madalena, a líder das discípulas de Jesus, como Pedro o era dos discípulos, é a apostola dos apóstolos, porque estes não demonstraram nenhuma empatia pelo Mestre enquanto este suava sangue e vertia lágrimas e, apesar de lhes ter pedido para lhe fazerem companhia, adormeceram. Maria Madalena esteve aos pés da cruz do seu Mestre sem este lho ter pedido, enquanto que, de entre os discípulos varões, o administrador do grupo Judas vendeu-O, o presidente Pedro negou-O covardemente e os restantes fugiram como galinhas assustadas.

Maria Madalena é testemunha da morte e sepultura do Mestre. Ela foi a única discípula testemunha deste evento, pois José de Arimateia e Nicodemos eram amigos de Jesus às escondidas e, apesar de poderosos, nunca fizeram nada por Jesus em vida; ao roer-lhes a consciência por terem feito parte da maioria silenciosa do Sinédrio que condenou Jesus, quiseram sepultá-Lo. “Depois de burro morto, cevada ao rabo”.

Maria Madalena, por fim, apesar de se terem comportado tão mal os discípulos varões, foi ter com eles, quando de manhazinha, indo ao sepulcro para prestar homenagem ao seu Mestre, não encontrou o seu corpo. Se não fosse ela, eles nunca teriam sabido que o sepulcro estava vazio; ela é a anunciadora da pré-Ressurreição, ou seja, do sepulcro vazio que para o discípulo amado foi suficiente, pois, ao debruçar-se sobre o sepulcro vazio, acreditou que Jesus tinha ressuscitado e não que tinham roubado o seu corpo.

Disse-lhe Jesus: Maria! Ela, voltando-se, disse-lhe: Raboni, que quer dizer: Mestre. – Ver, já tinha visto; foi aquela voz particular pela forma como pronunciou o seu nome que revelou a Maria Madalena que Aquele não era o jardineiro, mas o seu Mestre.

Não me detenhas, porque ainda não subi para meu Pai. - Tentação natural esta de abraçar os pés do Mestre e chorar sobre eles lágrimas de alegria depois de ter esgotado as lágrimas de tristeza. Mas Jesus não pode ser detido, já não pertence a este mundo. E ela, tendo experimentado a Cristo Ressuscitado, também não pode deter-se pois tem de ir anunciar aos apóstolos que o Mestre afinal está vivo.

Maria Madalena foi e anunciou aos discípulos que vira o Senhor, e que Ele lhe dissera isto. – Corre Maria Madalena, agora pela segunda vez aos apóstolos, desta vez não para lhes dizer que tinham roubado o Senhor, mas para lhes dizer que tinha ressuscitado de entre os mortos e assim confirmar a fé que o discípulo amado tinha manifestado diante da tumba vazia.

Discípulos de Emaús – Lucas 24, 13-35
Cléofas e a sua mulher afastavam-se desiludidos de Jerusalém, já não havia nada nessa cidade que lhes chamasse a atenção. Jesus de Nazaré tinha sido até ali a razão do seu viver. Não tinham dúvidas de que era um grande profeta, poderoso em palavras e obras, como até o povo sabia e podia dar testemunho; eles, porém, esperavam que fosse mais que um profeta, que fosse o esperado das nações e Messias em pessoa.

Começando por Moisés, e por todos os profetas, explicava-lhes o que dele se achava em todas as Escrituras – Jesus ajuda os discípulos de Emaús a contextualizar a sua morte, ou seja, a ler a sua morte no contexto das Escrituras. Que ele era de facto o Messias tal como eles esperavam, mas um messias diferente que vem vencer não só o mal que afeta a Israel, mas o mal que afeta o mundo inteiro; que vem libertar não só Israel dos Romanos, mas dar a verdadeira liberdade a toda a criatura.

Fica connosco, porque já é tarde, e já declinou o dia. E entrou para ficar com eles. – Como o coração lhes ardia, como estavam a entender as Escrituras sob uma nova luz esclarecida e reveladora, como a sua alegria ia crescendo e queriam saber mais e não queriam perder tal companhia, convidaram o forasteiro a ficar com eles.

Abriram-se-lhes então os olhos, e conheceram-n’O (…) Porventura não ardia em nós o nosso coração quando, pelo caminho, nos falava, e quando nos abria as Escrituras? – Revela-se Jesus no partir do pão, gesto tão característico de Jesus que eles tinham experimentado tantas vezes. A forma como Jesus partira o pão era peculiar, como peculiar tinha sido, na manhã daquele dia, a forma como Jesus tinha pronunciado o nome de Maria Madalena. Chegámos ao auge da revelação, ficou completa a eucaristia com a comunhão com o Mestre, precedida da Liturgia da Palavra feita enquanto caminhavam.

E na mesma hora, levantando-se, tornaram para Jerusalém, - “Ite missa est”, ide a missa terminou, dizia o sacerdote quando a missa era em latim, que verdadeiramente significa que a Missa terminou, começando agora a Missão. A vida do cristão decorre entre a Missa e a Missão; é um vai e vem entre a expressão comunitária da nossa fé e a vivência da mesma na vida; um vai e vem entre a comunhão com Deus na Missa e a comunhão com os irmãos na vida. “Ite missa est” tanto significa que a “missa terminou” como “estais em missão”.


Muitos escutaram S. Paulo na sua pregação no Areópago de Atenas. A maioria não acreditou, mas houve alguns que acreditaram. Certamente todos ouviram as mesmas palavras de S. Paulo, o seu testemunho, uns acreditaram, outros não. A fé como dom de Deus é dado a todos, porém nem todos aceitam esse dom, alguns optam por não o aceitar.

Fé como opção
É frequente referirmo-nos à fé como um dom de Deus. S. Paulo diz, é o Espírito que dentro de nós clama Abbá, ó Pai (Rom. 8,15). Jesus diz que foi Ele que nos escolheu e não nós a Ele (João 15, 16). Se a fé é um dom de Deus, por que é que uns a têm e outros não? É acaso Deus injusto, que a uns dá a fé e a outros não? Então é a fé um dom ou uma opção? Ou é as duas coisas?

Tudo parte de Deus, a iniciativa é d’Ele, por isso a fé é dom; mas o dom não tem efeito sem a nossa resposta, sem o nosso assentimento e, por isso a fé também é opção. Somos salvos gratuitamente pela graça de Deus, por intermédio da fé. A fé é a nossa resposta à graça salvífica de Deus.

Neste sentido, a fé é um bilhete de ida e volta; é como uma carta que Deus nos envia, registada e com aviso de receção: é necessário que eu aceite a carta e assine o documento que a acompanha. A fé é como um cheque em branco que Deus assina e me envia; para que este cheque tenha valor ou me sirva de algo, eu tenho que escrever nele uma quantia de dinheiro.

A salvação é um dom gratuito de Deus, a fé nessa salvação é uma escolha livre do homem. Alguém disse que Deus alimenta as aves do céu, mas não lhes coloca a comida no ninho, elas têm de sair para a ir buscar.

Na manhã de domingo, Maria Madalena e o apóstolo João viram o sepulcro vazio; a primeira viu e pensou que tinham roubado o corpo do Senhor, o segundo viu e acreditou que Jesus tinha ressuscitado dos mortos.

Jesus censura e aponta o dedo à falta de fé das pessoas da sua geração (Mateus 17,17, Marcos 6,6, Lucas 24,25), assim como a dos seus discípulos (Marcos 16, 14). Se a fé não fosse uma opção, e fosse só um dom de Deus, não haveria razão para tal censura.

Jesus, amargurado porque os fariseus não quiseram acreditar, nem em João Batista, nem n’Ele próprio, chora sobre Jerusalém e condena as cidades, onde mais milagres foram feitos e nem assim acreditaram. Por fim, louva os pequenos e os humildes, porque ao contrário dos sábios, acreditaram e aceitaram a sua mensagem. Mateus 11, 16, 27.

Quando descobrimos a fé, damo-nos conta de que é um dom de Deus. No entanto, é antes a opção que fazemos diante do testemunho de alguém que é feliz porque acreditou, como disse Isabel à sua prima Maria, na Visitação.

Não consigo acreditar
A fé que não provém da razão deve ser posta em dúvida, e a razão que não leva à fé deve ser temida.  G. Campbell Morgan

Crer é dar o coração. Christian Bobin

Ante uma existência de Deus que não é possível provar nem desmentir inequivocamente, cabe-nos decidir, ou seja, optar. Tanto o teísmo como o ateísmo são opções, o agnosticismo opta por não optar. Já vários agnósticos me disseram “Não consigo acreditar”. Em psicoterapia, quando alguém diz “Eu não consigo”, o terapeuta traduz por “Eu não quero”.

Por exemplo, suponhamos que o paciente diz, “Eu não consigo deixar de fumar”; o terapeuta pergunta, “Deixar de fumar é impossível?” ao que o paciente responde “Não, já outros deixaram”, e o terapeuta conclui “Tu não queres deixar de fumar, porque se quisesses verdadeiramente, deixavas, pois, como diz o povo, “querer é poder”.

O mesmo pode ser dito do agnóstico ou ateu que diz “Não consigo acreditar”. Acreditar não é impossível: muitos acreditam, se não acreditas é porque não queres acreditar ou porque essa atitude é mais conveniente para ti. Tenho encontrado muitos agnósticos que o são porque está na moda e porque estão cheios de preconceitos em relação à fé, à religião, à Igreja e aos que são religiosos.

(…) escolhei hoje a quem sirvais; se aos deuses a quem serviram vossos pais, que estavam além do rio, ou aos deuses dos amorreus, em cuja terra habitais; porém eu e a minha casa serviremos ao Senhor. Josué 24, 15

A fé não é objeto da ciência, nem a ciência é objeto da fé. O conhecimento científico (com)vence-nos, satisfaz a nossa racionalidade completamente sem lugar a dúvidas; a fé não é assim. A razão ajuda-nos, mas não de forma racional ou razoável.

A razão não consegue racionalizar a fé por completo, só consegue fazê-la razoável; a outra parte é obséquio nosso. Por isso se diz que a fé é um obséquio razoável, porque a razão nos segue até determinado ponto, depois ficamos por nossa conta: ou saltamos ou não saltamos, ou abrimos a porta ou não, ou nos fiamos ou não, ou nos entregamos ou não, ou nos rendemos ou não. A fé é, por isso, uma opção.

Quem não se fia não é fiel
Quem é fiel no mínimo, também é fiel no muito; quem é injusto no mínimo, também é injusto no muito. Pois, se nas riquezas injustas não fostes fiéis, quem vos confiará as verdadeiras? Lucas 16, 10-11

Quem perdeu a fé, já não pode perder mais nada. Públio Siro

“Crê o ladrão que todos são da sua condição” – Quem não se fia não é fiel como não é fiel, não é de fiar. Porque julga os outros como se julga a si mesmo, como ele é ladrão pensa que todos são como ele, não acredita que alguém possa ser diferente.

Fé é na esfera espiritual o que o dinheiro é na esfera comercial. Anónimo

Nem só de religião vive a fé, nem só de ciência vive a razão. Fé e razão fazem parte de um todo e precisamos delas no nosso dia-a-dia. Praticamente todos os atos contêm um pouco de razão e um pouco de fé. Na nossa vida, a razão analisa, a fé decide; sem a razão decidiríamos prematuramente e faríamos mais erros do que os que já fazemos; sem a fé nunca chegaríamos a decidir, a arriscar uma solução para os nossos problemas, pois sempre pensaríamos que algo pode ter escapado à nossa análise e cairíamos no imobilismo.

Quando aceito um cheque por um serviço prestado acredito que tem cobertura. Seria indelicado e poderia perder um amigo se o recusasse. Quando subo a um avião, acredito que os polícias fizeram um bom trabalho no sentido de evitar que alguém colocasse uma bomba na bagagem e acredito que os pilotos estejam bem preparados e intencionados. Quando me sento para comer, num restaurante, confio que a comida esteja em boas condições e não exijo que seja analisada em laboratório antes de a consumir; é a falta de fé e o medo do envenenamento que faz com que na Etiópia a cozinheira sempre prove a comida à frente dos convidados.

Quando me uno a uma mulher em casamento, acredito que vai dar certo, que será para toda a vida. Quando solicito um empréstimo bancário, por mais que o banco analise a minha situação financeira, se eventualmente me concede o crédito pedido é porque tem fé que um dia o devolverei com juros. O cartão de crédito é, ao fim e ao cabo, um cartão de fé, e funciona com base nesta; fala-se da fé nos mercados como se fala na fé em Deus. Em suma, a fé não é só a moeda de troca entre nós e Deus, mas, é também, a moeda de troca entre nós próprios e os outros.

Como o Homem não é objeto da ciência, na vida do dia-a-dia não há certezas só há probabilidades. Tal como a razão, a fé é essencial nas relações humanas para o entendimento entre as pessoas. É com base na confiança, que as pessoas têm umas pelas outras, que as promessas e os compromissos são assumidos e aceites. Como quem não se fia não é fiel, para ser fiel é preciso acreditar, ter fé.

Confiança ou desconfiança original
O cordeiro manso mama na sua e na alheia, o bravo nem na sua descansado. Provérbio português

Muitas das nossas posições, opções e ideias ante Deus, os outros e a vida, por muito que nos custe admitir, têm mais a ver com a nossa experiência vital e existencial que com o nosso discernimento e pesquisa intelectual.

Habituado a ver os bebés a mamarem tranquilamente do seio das suas mães, achei anedótico quando vi na Etiópia alguns bebés ao mamarem num seio, colocarem a mão no outro, como que a dizer “não tenho suficiente com este, o outro também é meu, ninguém mo tire enquanto estou a mamar neste”.

O psicólogo Erik Erikson fala da confiança ou desconfiança original que o bebé recebe desde a conceção até ao nascimento e durante os primeiros anos da sua vida. Quando o bebé nasce já sabe instintivamente o que o espera, pois já foi ou não acolhido enquanto crescia no seio da sua mãe.

A confiança primária, ou seja, a fé, adquirida no seio materno e não defraudada nos primeiros anos de vida é uma condição fundamental para uma vida humana autêntica, bem-sucedida e feliz. A falta desta confiança original pode estar na base da opção pelo agnosticismo, ateísmo, pela falta de fé em geral e confiança nos outros, e pela atitude de estar sempre com um pé atrás.  

Cultivar a fé
E Jesus disse-lhe: Se tu podes crer, tudo é possível ao que crê. E logo o pai do menino, clamando, com lágrimas, disse: Eu creio, Senhor! Ajuda a minha incredulidade. Marcos 9 23-24

(…) se tiverdes fé como um grão de mostarda, direis a este monte: Passa daqui para acolá, e há de passar; e nada vos será impossível. Mateus 17, 20

A fé aumenta pela oração, é fortalecida pelo estudo da Palavra e cumpre-se quando nos submetemos diariamente ao Senhor Jesus. J. Charles Stern

Está claro desde a Bíblia que a fé não é um dom estático e imutável de Deus. Há certamente um substrato de fé que é dom de Deus e, como tal, comum a todos os seus filhos, mas depois há possibilidade de crescer neste dom ou de o deixar diminuir e perdê-lo por completo. Tudo na vida é dinâmico e a fé não é exceção. Deus também nos assiste no crescimento deste dom, porém deve haver um esforço da nossa parte; Deus não ajuda os preguiçosos.

Crescer pela oração – Pela oração comunicamo-nos com Deus e colocamo-nos numa dinâmica de aumentar o conhecimento de Deus, ao mesmo tempo que aumenta o nosso amor por Ele. Tal como acontece nas relações humanas, Deus só se revela aos que o amam; por isso, a mais conhecimento mais amor, a mais amor mais conhecimento.

Estudo – Fundamentalmente o encontro com a Palavra de Deus, as Escrituras, cresce com quem as lê em atitude de meditação para encontrar nelas o alimento de cada dia. Todo o cristão é livre de interpretar para si, com a ajuda do Espírito Santo, as Escrituras.

Na nossa leitura convém ter em conta a interpretação que a mesma Igreja faz das Escrituras, como descrita na tradição da Igreja nos seus dois séculos de seguimento do Mestre. O Magistério é palavra autorizada sobre a Escritura, podemos interpretá-la à nossa maneira, mas nunca contra a interpretação da Igreja.

Nós, católicos temos particular devoção pelos que nos precederam na vida da fé. A nossa devoção e veneração por eles devem traduzir-se na imitação das suas virtudes e numa exortação a seguir, também nós, o Mestre como eles seguiram.

Prática dos sacramentos – Sobretudo pertencer a uma pequena comunidade cristã; “Unus christianus, nulus christianus”, tal como os discípulos necessitaram de um mestre, todo o cristão necessita de pertencer, associar-se a um grupo de pessoas que partilham a mesma fé. Este grupo de pessoas transforma-se paulatinamente numa comunidade de vida quando partilha a prática da fé e celebra a memória da vida, morte e ressurreição do Senhor.

EXPERIÊNCIA
O que era desde o princípio, o que ouvimos, o que vimos com os nossos olhos, o que temos contemplado, e as nossas mãos tocaram da Palavra da vida (Porque a vida foi manifestada, e nós a vimos e testemunhámos, e vos anunciamos a vida eterna, que estava com o Pai, e nos foi manifestada); o que vimos e ouvimos, isso vos anunciamos, para que também tenhais comunhão connosco; e a nossa comunhão é com o Pai, e com seu Filho Jesus Cristo. 1 João 1, 1-3

A experiência de Jeremias 15, 16 e Ezequiel 3, 1-3
Filho do homem, come o que achares; come este rolo, e vai, fala à casa de Israel. Então abriu a minha boca, e me deu a comer o rolo. E disse-me: Filho do homem, dá de comer ao teu ventre, e enche as tuas entranhas deste rolo que eu te dou. Então o comi, e era na minha boca doce como o mel. Ezequiel 3, 1-3

Dá-me o livrinho. E ele disse-me: Toma-o, e come-o, e ele fará amargo o teu ventre, mas na tua boca será doce como mel. E tomei o livrinho da mão do anjo, e comi-o; e na minha boca era doce como mel; e, havendo-o comido, o meu ventre ficou amargo. E ele disse-me: Importa que profetizes outra vez a muitos povos, e nações, e línguas e reis. Apocalipse 10, 9-11

O profeta Jeremias e o profeta Ezequiel, assim como o autor do livro do Apocalipse, têm todos a mesma experiência com respeito à Palavra de Deus; é doce ao paladar, é agradável ouvi-la pois diz a verdade e ficamos convencidos que é a verdade. Porém, assimilá-la, digeri-la e sobretudo pô-la em prática é difícil.

É certo que ela é o único caminho, verdade e vida e só com ela seremos felizes e nos sentiremos realizados, porque ela é o testo para a nossa panela, ela apela à nossa natureza humana que não pode ser vivida de outro modo. Por isso a Palavra é Palavra de Vida, porque só nela e por ela teremos vida autêntica e verdadeira.

Porém, a nossa natureza está debilitada e fragilizada pelo primeiro pecado de Adão e Eva; a nossa natureza é uma natureza caída e a nossa inclinação para o mal transformou-se, como o primeiro pecado, numa segunda natureza quase tão natural como aquela que Deus nos deu.

Da experiência à Metanoia
Quem é minha mãe? E quem são meus irmãos? E, estendendo a sua mão para os seus discípulos, disse: Eis aqui a minha mãe e os meus irmãos; porque, aquele que fizer a vontade de meu Pai que está nos céus, esse é o meu irmão, e irmã e mãe. Mateus 12, 48-50

Passar pela a experiência de Cristo é encarnar a Palavra, é comê-la como Jeremias, digeri-la e extrair dela o alimento para a vida espiritual, como fazemos dos vegetais, cereais, carne, peixe e frutas para nos mantermos vivos. Passar pela experiência de Deus é metanoia, ou seja, mudar de mente, mudar de ideias; como a mente governa a nossa vida, quando mudamos de mente ou de ideias, mudamos também o nosso comportamento e as nossas obras.

É, por outro lado, fazer a mesma experiência de Maria; quando temos fé como ela teve, concebemos a Jesus como ela concebeu, por obra e graça do Espírito Santo que é de facto o que nos faz gritar Aba Pai. Uma vez concebido Jesus no nosso seio pela fé, Ele cresce dentro de nós como o fez dentro de Maria; e quando já não sou eu que vivo, mas é Cristo que vive em mim, como disse S. Paulo, então eu dou à luz a Cristo, ou seja, faço missão, falo d’Ele, falo de como Ele modificou a minha vida.

A experiência de fazer-se cristão é, portanto, conceber a palavra pela fé, fazê-la crescer pela oração e prática dos sacramentos, até encarnarmos totalmente a Palavra e esta se transformar em carne da nossa carne, dá-la à luz, ou seja, dá-la aos outros na Missão.

São três as atitudes para com Jesus: conhecê-Lo, – amá-Lo, – segui-Lo. Nestas três atitudes, sempre podemos crescer; conhecê-Lo melhor para amá-Lo mais e para O seguirmos de mais perto. Vejamos exemplos de experiência e metanoia, ou seja, de conversão, mudança de mente e de vida.

Bartimeu – O encontro com Jesus curou-o da sua cegueira. Abriu-lhe os olhos e começou a ver a vida de outra forma; de um salto, deixou para trás a vida anterior (simbolizada pela capa) e seguiu Jesus. Marcos 10, 46-52

Samaritana – Encontrando em Jesus a verdadeira água, abandonou no poço o cântaro, símbolo de uma vida feita de vaivéns, em busca de uma água que nunca chega a saciar.

Paulo de Tarso – O encontro com Cristo inverteu a marcha da sua vida; a mesma energia que usou para combater Cristo, serviu depois para difundir a boa nova do Mestre por todo o mundo antigo.

Francisco de Assis – Jovem e filho único de uma rica família burguesa que podia pagar todos os seus caprichos, encontrou Cristo e abandonou a riqueza material para abraçar a riqueza espiritual.

Nuno Álvares Pereira – Jovem, nobre, famoso herói de Aljubarrota, possuía meio Portugal e merecia, mais que o Mestre de Avis, ter sido rei de Portugal; abandonou tudo por uma riqueza maior: Cristo.

Teresa de Ávila – Depois da visão beatífica chegou a afirmar, “Vivo sem viver em mim e tão alta vida espero que morro porque não morro”. Já nada a prendia a esta Terra, depois de experimentar a Cristo e ainda sendo jovem queria já morrer e voar para Ele. S. Paulo experimentou isto mesmo queria já ir para Ele, mas viu a conveniência de ficar ainda entre os jovens para divulgar a Palavra entre eles.

Francisco de Borgia - Nobre da grande família dos Borgia, servia com dedicação o Imperador da Europa, Carlos V, casado com a belíssima Isabel de Portugal, filha mais velha de Dom Manuel I. Ao contemplar a jovem e bela imperatriz no seu leito de morte disse: "Nunca más, nunca más, servir a señor que se me pueda morir".

MISSÃO
Porque não podemos deixar de falar do que temos visto e ouvido. Atos 4, 20

Se somos cristãos autênticos somos missionários. Ser missionário não é algo que nos propomos fazer, não precisamos de espevitar a nossa inteligência, motivar a nossa força de vontade e canalizar as nossas forças e o nosso tempo para o anúncio do evangelho. Para o cristão autêntico, anunciar o evangelho é natural, flui naturalmente da sua vida. Ai de mim se não anuncio o Evangelho, é como se não vivesse, dizia S. Paulo. (1 Coríntios 9, 16)

Missão é dar razões da nossa esperança
(…) estai sempre preparados para responder com mansidão e temor a qualquer um que vos pedir a razão da esperança que há em vós. 1 Pedro 3, 15

Para os que creem que vimos do nada e vamos para o nada e que, consequentemente, vivem sem sentido, nós devemos dar-lhes as razões da nossa esperança. E quando forem muito intelectuais e não pudermos responder às suas perguntas, simplesmente dizer com toda a humildade, “eu não tenho a cultura suficiente para responder às tuas perguntas, mas doutores tem a Santa Madre Igreja que decerto podem responder e satisfazer a tua sede de verdade”.

Sal da Terra e luz do Mundo
O Cristão é sal da terra e, como tal, derrete o gelo que faz cair tanta gente no inverno, ou seja, derrete as ratoeiras que certa gente coloca para fazer cair o seu semelhante. O sal conserva a carne, o peixe e os outros alimentos. Por isso, quando há um cristão numa instituição, empresa, escola, governo ou fábrica, o tecido social que constitui essa entidade não se corrompe.

O sal dá sabor à comida, o cristão dá sabor e sentido à vida, pois a vida sem Cristo não faz sentido. O sal fixa a água no nosso organismo, sem sal ficaríamos desidratados, nós que somos constituídos por mais de 70% de água. Cristo é o Caminho, a Verdade e a Vida e, assim como deu uma água eterna à Samaritana, assim a dará a todo o que n’Ele acredita.

O cristão é também luz que serve para ver e revela a verdade das coisas, a verdadeira natureza, cor e carácter de cada coisa, revela a verdade de cada um e de cada coisa. A luz também revela ou desvela as maquinações do mal, pois quem faz o mal, foge da luz; a luz denuncia o mal, expõe as maquinações os maldosos e os seus planos.

O cristão é luz sobretudo porque é farol, para que as pessoas ao verem as suas boas obras glorifiquem o Pai do Céu, ou seja, como os insetos são atraídos pela luz, assim o cristão atrai as pessoas a Cristo. Quando o cristão é uma vela apagada, ou seja, quando as suas obras não coincidem com a sua fé, então é uma pedra de tropeço, é uma luz que mata a todos os que são atraídos por ela, e uma escuridão na qual todos tropeçam.

Maria, modelo de Missionária
Maria, não temas, porque achaste graça diante de Deus. E eis que em teu ventre conceberás e darás à luz um filho, e pôr-lhe-ás o nome de Jesus. Lucas 1, 30-31

Maria é modelo, paradigma para a nossa vida cristã e missionária, pois foi ela a primeira a trilhar o caminho nas suas três etapas: Fé – Experiência – Missão. Pela fé, ela abriu a porta a Deus que encarnou por obra e graça do Espírito Santo, e cresceu no seu seio.

Maria disse ao anjo: Como se fará isto, visto que não conheço homem algum? Lucas 1, 34

Maria não acreditou assim, sem mais nem menos, sem fazer as suas perguntas, sem usar a sua mente, também para ela a fé era um obséquio razoável. O anjo não só lhe respondeu à razão inquisitiva dizendo que o Filho de Deus não viria ao mundo por vontade humana, mas por obra e graça do Espírito Santo, como também lhe deu uma prova da omnipotência de Deus, ao dizer que a sua velha prima Isabel tinha concebido.

Eis aqui a serva do Senhor; cumpra-se em mim segundo a tua palavra. E o anjo ausentou-se dela. Lucas 1, 38

Como isto nunca tinha acontecido e só ia acontecer uma vez, Maria podia não ter dado o salto de fé, a opção pela fé, mas deu, apesar de o anjo não ter respondido certamente a todas as suas questões. Fiou-se da sua Palavra e, por isso, a sua prima lhe dirá “feliz és tu porque acreditaste”.

A minha alma engrandece ao Senhor, e o meu espírito se alegra em Deus meu Salvador; porque atentou na baixeza de sua serva; pois eis que desde agora todas as gerações me chamarão bem-aventurada, porque me fez grandes coisas o Poderoso; e santo é o seu nome. Lucas 1, 46-49

Falou dessa experiência à sua prima Sta. Isabel, ou seja, foi primeiro missionária do povo de Israel para depois, com o nascimento do Seu filho, O dar ao mundo inteiro, simbolizado nas três etnias em que a raça humana se divide e simbolizado nos magos que visitaram Jesus. Ante a sua prima Isabel, Maria abre o seu coração e a sua boca para entoar o seu Magnificat, para testemunhar as maravilhas que o Senhor operou na sua vida.

O missionário, portanto, não é primeiramente aquele que anuncia o evangelho, o que catequiza, o que fala “objetivamente” de Jesus, da sua história, vida e milagres e doutrina; isso seria proselitismo, não missão. O missionário não fala “objetivamente” de Cristo, mas subjetivamente, pois é a partir da sua experiência e vivência de Cristo, que anuncia o “Kerigma”, ou seja, o evangelho.

Ser missionário é dar testemunho de como Cristo é a minha salvação, ou seja, de como Cristo me trouxe saúde física, espiritual, psíquica e moral, de como Cristo me trouxe vida e vida em abundância – felicidade. Ser missionário é entoar perante os homens o nosso Magnificat como Maria entoou o seu perante a sua prima Isabel.

Conclusão: Ser cristão é fazer a mesma experiência de Maria; como ela, pela fé, concebo a Jesus como Palavra que se faz carne no meu comportamento e obras; e, quando “já não sou eu que vivo, mas Cristo que vive em mim” (Gal. 2, 20), dou-O à luz, ou seja, anuncio-O aos outros.

Pe. Jorge Amaro, IMC




1 de setembro de 2021

3 Virtudes teologais: Fé - Esperança - Caridade

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Agora, pois, permanecem a Fé, a Esperança e o Amor, destas três, a mais importante é a Caridade.
1 Coríntios 13, 13

Os tratados clássicos dividem as virtudes em dois grupos: as humanas ou adquiridas e as divinas ou infundidas. Entre as virtudes adquiridas, distinguem-se principalmente quatro: Prudência, Justiça, Fortaleza e Temperança. Entre as virtudes infundidas estão a , a Esperança e a Caridade, também chamadas de teologais, porque não são o resultado do esforço humano, mas um dom infundido por Deus nos seus filhos.

Eu, porém, entendo que nem as humanas são puramente humanas, pois sempre estamos sob a influência da Graça divina, nem as divinas são puramente divinas pois o consentimento e o esforço humano são sempre requeridos. A este propósito, Sto. Agostinho dizia que tudo o que fazemos de bom é por graça de Deus, ou seja, como um dom.

– É atitude, convicção ou crença na existência de um Ser Supremo que é, ao mesmo tempo, imanente e transcendente e que se revelou historicamente em Jesus de Nazaré, Seu filho único, que viveu entre nós, morreu, ressuscitou e subiu aos Céus para nos preparar um lugar, deixando-nos o Espírito Santo para nos guiar e acompanhar no caminho até esse lugar. A Fé relaciona-nos com Deus.

Esperança – Mais que a atitude de confiança razoável ante a incerteza do futuro, a nossa Esperança tem um nome, é a salvação que Deus nos promete e nos oferece em Jesus Cristo, Seu filho. A Sua ressurreição de entre os mortos faz da morte uma passagem para o além e não um destino final. A Esperança relaciona-nos connosco mesmos, respondendo à nossa inquietude interior.

Caridade – É a virtude que regula a nossa ação e a forma como nos situamos na vida em relação à criação e aos outros homens. A Caridade regula o quanto eu faço parte da vida dos outros e os outros fazem parte da minha vida. A Caridade coloca-nos em relação com os outros: valho na medida em que sirvo; quem não vive para servir não serve para viver.

As virtudes na Trindade, a Trindade nas virtudes
A Fé em Deus Pai abre-nos à Esperança que encontramos no Filho pela sua ressurreição e motiva um presente de Caridade, fazendo-nos ver a Cristo em cada irmão. E quem vê o Filho vê o Pai, como Jesus disse a Filipe. A Esperança é a filha unigénita da mãe Fé, como Cristo é Filho de Deus Pai e, tal como o Espírito Santo procede do Pai e do Filho, assim a Caridade procede da Fé e da Esperança.

Deus Pai é a nossa Fé, criador do Céu e da Terra, é o nosso passado, a nossa memória histórica, é o nosso Pai, é Ele quem explica o nosso ser. Deus Filho, historicamente Jesus de Nazaré, é a nossa Esperança, nele temos um irmão mais velho que viveu, morreu e ressuscitou, abrindo-nos as portas do Céu e uma saída airosa desta vida. O Espírito Santo que procede do Pai e do Filho, é a Caridade que procede da Fé e da Esperança.

Se a Fé e a Esperança são pensamento e sentimento, a Caridade é ação; é a forma como ocupamos o nosso lugar no mundo durante o tempo que Deus nos deu de vida. Para o exercício desta virtude, precisamos da pessoa de Deus que veio para ficar, o Espírito Santo que habita em nós em forma de sete dons ou talentos, e que nos inspira, guia e alenta no aqui e agora das nossas vidas e no caminho de regresso ao Pai.

As virtudes e o tempo
Ó tempo volta para trás /Traz-me tudo o que eu perdi /Tem pena e dá-me a vida/A vida que eu já vivi.
Manuel Paião 1984

Quando já vivemos alguns anos, o passado começa a ser maior que o futuro; as memórias deste passado afloram à mente mais que os projetos do futuro. Posso entender o autor da canção acima citada no sentido de que a lembrança das alegrias e prazeres do passado causa tristeza no presente; a saudade como lembrança de prazeres do passado não é um sentimento alegre, mas triste.

Ao contrário, a lembrança dos sacrifícios passados a nível individual para atingir um ideal a nível comunitário quando nos dedicámos a alguém, quando colocámos a nossa vida ao serviço de uma causa, traz-nos alegria ao presente. É como se ainda estivesse a acontecer: a alegria da vitória das batalhas vencidas no passado ainda se repercute e faz sentir no presente, dando um impulso à nossa autoestima e fazendo-nos dizer, “Valeu a pena…”

A vida humana é espácio-temporal, ou seja, ocupamos um espaço, o nosso lugar no mundo, o nosso ser e a forma de estar, o nosso papel no conjunto da História da humanidade, durante um tempo. Este tempo é, como tudo, tridimensional, ou seja, subdivide-se em passado, presente e futuro. Estes três tempos são interativos, ou seja, nem o futuro é só sobre o futuro, nem o passado só sobre o passado, nem o presente lida só com o aqui e agora. Os três são reais, os três estão vivos, os três auto- influenciam-se e coexistem.

Tanto os três tempos como as três virtudes são interativos como dissemos. Porém, cada virtude tem mais que ver com um tempo que com o outro. É claro que a Esperança tem que ver com o futuro, esse é o seu conteúdo, sendo a Fé projetada no tempo, no futuro. A Caridade deve ocupar o nosso presente e a Fé é a virtude que inspira o nosso passado.

2 Timóteo 4, 7 – “Combati o bom combate, acabei a carreira, guardei a Fé”. A Fé vem do passado para nos dar autoestima, um sentir que valeu a pena, que não foram em vão as nossas lutas. A Esperança vem do futuro para nos dizer “não tenhas medo”; a Caridade surge do presente para nos dar as prioridades que nos vencem o stress ao dizer, “buscai PRIMEIRO o Reino de Deus e a sua justiça, e tudo o resto vos será dado por acréscimo”. (Mateus 6, 33)

Gramaticalmente, a nossa existência não se define num presente simples gramatical; também não nos serve um gerúndio simples. O tempo gramatical que mais reflete o que a nível da existência nos acontece será uma mistura de presente perfeito com gerúndio. Aplicando este tempo à citação de S. Paulo seria “venho mantendo a Fé”. No presente perfeito a ação começou no passado, continua no presente que se abre ao futuro.  

A Fé e o passado – entre a depressão e a autoestima
Um psiquiatra disse que o cristão deve ter uma fraca memória do passado. Eu não diria que devemos esquecer o que no passado nos correu mal para poder viver sem depressão e com um mínimo de autoestima. O que precisamos de ter para com o nosso passado é uma visão benevolente, devemos reconciliar-nos com ele e com todas as pessoas que dele fizeram parte, incluindo nós mesmos, é claro. O passado passou é certo, mas continua a ser reinterpretado no presente.

Certos factos que dele fizeram parte já tiveram várias interpretações ao longo da nossa vida. À medida que conhecemos mais de nós mesmos, ou seja, que temos uma visão de conjunto da nossa vida, mais facilmente é possível encaixar de forma positiva cada facto negativo da nossa vida passada. Não há males que por bem não vieram, e Deus escreveu direito nas linhas tortas da nossa vida.

Devemos ser capazes de entoar o nosso Félix Culpa sobre o nosso passado para que este venha ao nosso presente de forma positiva e não de forma negativa, perseguindo-nos. Como Júlio Verne na sua viagem ao centro da Terra, nós temos de viajar ao nosso passado para o inundar com a luz do nosso presente (onde não entra o sol, entra o médico) e assim evitar que este invada o nosso presente de forma sub-reptícia, clandestina e negativa.

O que conhecemos de nós mesmos, do nosso passado, podemos controlar; o que não conhecemos de nós mesmos, controla-nos a nós. Por isso é necessária esta viagem de peregrinação do presente ao passado. Ao voltar ao presente depois desta viagem ao passado, sou capaz de estabelecer a Fé como o fio condutor da minha vida; tal como num colar de pérolas, este fio aglutina cada um dos factos do passado de uma forma harmoniosa que explica positivamente como cheguei a ser o que sou hoje.

Este fio que aglutina todos os factos de uma forma positiva é a nossa Fé em Cristo, centro, origem e destino das nossas vidas. Tal como a Terra à volta do Sol, o nosso ano (litúrgico) é passado à volta da Sua pessoa e da sua Palavra, desde o Seu nascimento até à Sua Ascensão aos Céus, num movimento helicoidal do passado para o futuro.

Isto faz de cada Natal, cada Páscoa e cada Pentecostes acontecimentos sempre velhos e sempre novos; onde eu estava no Natal do ano passado não é onde estou agora. Por isso, cada festa é sempre a mesma e sempre diferente neste caminhar helicoidal à volta de Cristo para o futuro.

A Esperança e o futuro – entre a ansiedade e a Esperança
«Não vos preocupeis, dizendo: “Que comeremos, que beberemos, ou que vestiremos?” (…) o vosso Pai celeste bem sabe que tendes necessidade de tudo isso. Procurai primeiro o Reino de Deus e a sua justiça, e tudo o mais se vos dará por acréscimo. Não vos preocupeis, portanto, com o dia de amanhã, (…)  Basta a cada dia o seu problema.» Mateus 6, 31-34

Desde o momento em que somos adotados por Deus como filhos, não devemos preocupar-nos. As crianças vivem ocupadas e procuram estar sempre ocupadas, mas não preocupadas. Deixam para os pais as preocupações, são eles que devem preocupar-se com o bem-estar da criança. Assim deve ser a nossa relação com Deus nosso Pai: devemos andar ocupados com os assuntos do Reino de Deus e deixar para Ele o nosso sustento, o nosso vestir, o nosso futuro.

Como já referimos noutros textos, o homem bíblico caminha para o futuro de costas, guiando-se pelo passado. À medida que caminhamos de costas para o futuro, ampliam-se os horizontes e cada facto particular é visto e colocado à vista do geral como uma peça de um puzzle. Por outro lado, esse mesmo passado fornece-me os instrumentos de navegação para o futuro. No mar, tanto sobre a água como debaixo dela os submarinos não se guiam pela vista, mas pelos instrumentos; o mesmo acontece com os aviões no ar. O nosso passado são os instrumentos de navegação para o futuro pois, por mais que queiramos, desconhecemos o futuro; mas como é conhecido por Deus, nele confiamos.

(…) se Cristo não ressuscitou, logo é vã a nossa pregação, e também é vã a vossa Fé. 1 Coríntios 15, 14

De onde vimos, para onde vamos e que sentido tem a nossa vida são as perguntas que todo o ser humano se faz desde o momento que se conhece como pessoa. Cristo é a única resposta cabal a estas perguntas.

Em Cristo pomos a nossa Esperança de que a nossa morte é um nascimento para a vida eterna, não o fim da vida, uma morte eterna. É este futuro que dá sentido ao nosso presente e, sem este futuro, nada do presente faria sentido. Se, como creem os ateus e agnósticos, vimos do nada e caminhamos para o nada, se nada é o princípio e nada é o fim, como pode ser o meio algo com sentido? Como pode ter sentido algo que começa em nada e acaba em nada?

Sem futuro, o presente é nauseabundo por mais prazenteiro que seja. Assim o experimentou Sartre, Nietzsche antes dele e Camus depois dele: “se vens do nada, não há Fé, se vais para o nada, não há Esperança o mais certo é que não haja Caridade pelo que a vida carece de sentido, é nauseabunda.

Sei em quem confiei. 2 Timóteo 1, 12

Não caminhamos para o ocaso das nossas vidas, mas para a aurora da vida eterna. Por isso, por mais felizes que estejamos, o melhor está para vir; por mais sofrimento que tenhamos, decrépitos, limitados, enfermos e velhos, o melhor está sempre para vir, não é aqui nas circunstâncias e vicissitudes do aqui e agora que colocamos a nossa confiança, pois sabemos que não temos aqui cidade permanente, mas buscamos a futura (Hebreus 13,14)

A Caridade e o presente – entre o stress e a tranquilidade
«Vinde a mim, todos os que andais cansados e oprimidos, que Eu vos aliviarei. Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração e encontrareis descanso para o vosso espírito. Pois o meu jugo é suave e o meu fardo é leve.» Mateus 11, 28-30

Se o Senhor não edificar a casa, em vão trabalham os construtores. Se o Senhor não guardar a cidade, em vão vigiam as sentinelas. De nada vos serve levantar muito cedo e trabalhar pela noite dentro, para comer o pão de tanta fadiga, pois, até durante o sono, Ele o dá aos seus amigos. Salmo 127, 1-2

O nosso presente pode ser invadido pelo remorso do passado ou pelo medo, preocupação e ansiedade pelo futuro. Desta forma, ficamos stressados, desorientados, paralisados, sem saber para onde ir e o que fazer, como Marta (Lucas 10, 38-42) que andava de um lado para o outro como uma barata tonta.

O Mestre chama-nos a ir a Ele, a aceitar o Seu jugo, a Sua lei, a Sua forma de proceder e fazer as coisas e assim encontraremos descanso. É o Senhor que guarda a cidade: não é por muito madrugar que amanhece mais cedo. Tudo o que devemos fazer é não guardar para amanhã o que podemos fazer hoje.

A prioridade é o reino de Deus e a sua justiça, tudo o resto vem depois. Muitas vezes nos damos conta de que fomos varrer a casa dos outros e, ao regressar, encontrámos a nossa casa varrida. É ajudando os outros que nos ajudamos a nós mesmos. É ajudando a solucionar os problemas dos outros que encontramos os nossos magicamente resolvidos. Por isso, os outros não vêm aumentar o nosso stress, vêm eliminá-lo. É isso que significa “buscai primeiro o reino de Deus e a sua justiça que o resto se vos dará por acréscimo”.

Quando pedires um favor, pede a quem está ocupado, e não a quem está desocupado, pois te dirá que tem muito que fazer. O problema do stress é, fundamentalmente, um problema de prioridades. Muitas vezes autossabotamo-nos, quando cheios de stress nos colocamos a fazer primeiro o menos prioritário, colocando de lado e adiando de forma compulsiva o que verdadeiramente conta.

Fátima Trinitária: Meu Deus eu creio, adoro e amo-Vos…
Meu Deus, eu creio, adoro, espero e amo-Vos. / Peço-Vos perdão para os que não creem, / não adoram, não esperam, e não Vos amam.

A vidente e “evangelista” de Fátima, Lúcia, disse ao então cardeal Ratzinger, que o objetivo “prático” de todas as aparições era fazer crescer o povo de Deus nas virtudes teologais da , Esperança e Caridade, que estão presentes na mensagem desde a primeira oração ensinada pelo Anjo: “Meu Deus eu creio, adoro, espero e amo-Vos…”

Uma oração simples e singela, mas completa; um convite ao cristão a viver as três dimensões do tempo humano, Passado – Presente – Futuro, inspirando-se nas três virtudes teologais, Fé – Esperança – Caridade. A vida humana decorre exclusivamente no presente; um presente que, quando está cheio de Caridade, inspirada no passado da dos nossos pais, se torna em razão da Esperança que nos projeta para o futuro, sem medo nem ansiedade.

A virtude da Fé: “Eu Creio” – A Fé é a pedra filosofal que nos faz ver a vida e a realidade com outros olhos. A Fé é um passo que damos para além do que é racional e razoável; é um risco, uma decisão, uma opção fundamental. É a chave que abre a porta da Salvação, Salvação esta que significa Céu para o futuro mas que, no presente, no aqui e agora, se traduz em paz, felicidade e sentir-se bem, física, espiritual, psicológica e moralmente.

A virtude da Esperança: “Espero” – A virtude teologal da Esperança é a Fé projetada no futuro que confere um sentimento de segurança no momento presente. O cristão não precisa de ansiolíticos porque não tem ansiedade; perfeitamente ancorado na Fé que se traduz, no presente, no aqui e agora, em Caridade para com Deus e o próximo. “Quem não deve não teme” diz o provérbio; o cristão não teme porque não está em dívida com ninguém, nem com Deus, nem com os homens.

A Fé também assegura aos cristãos que, por pior ou melhor que seja o momento presente, tudo é passageiro e a sua história terá um final feliz. O final da sua história já está assegurado na morte e Ressurreição do Senhor. Se temos a Fé que nos permite acreditar que até os cabelos da nossa cabeça estão contados, como diz o evangelho, vivemos na certeza de que ainda que o momento presente possa ser de sofrimento e angústia, o melhor está para vir e a nossa história terá um final feliz. Assim sendo, o medo e a ansiedade desaparecem e os altos e baixos da nossa vida são vividos na Esperança e na Fé na providência divina e não no temor.

“Por fim o meu coração Imaculado triunfará” – Nesta Fé e nesta Esperança viveram os pastorinhos; em especial, Lúcia, que em breve ia perder a companhia dos seus primos. Ao aperceber-se que ia ficar sozinha no mundo, Lúcia deve ter sentido uma enorme tristeza, o que levou a Senhor a perguntar-lhe: “E tu sofres muito por isso”? De seguida, a modo de consolo e conforto disse, “O meu Imaculado Coração será o teu refúgio e o caminho que te conduzirá a Deus”, ou ao Céu que já lhe tinha sido prometido a ela, a Jacinta e a Francisco logo na primeira aparição.

A virtude da Caridade: Adoro… e amo-Vos – Só vivemos no presente, inspirados no passado e confiantes no futuro. O presente da nossa vida deve ser cheio de Caridade; a Caridade, o Amor, só podem ser vividos no momento presente. “Não guardes para amanhã o que podes e deves fazer hoje”. As boas intenções não salvam ninguém, nem a nós mesmos. A Caridade não pode ser projeto, mas ação no momento presente. A Caridade não pode ser adiada.

Adoro - O momento presente deve ser cheio de amor a Deus. Encontrar tempo e buscar um lugar para estar com Ele, como Jesus fazia e como Francisco de Fátima também fazia, isolando-se das suas companheiras, detrás de algum cabeço ou matorral, ou passando o tempo da escola na Igreja de Fátima, consolando o Deus escondido.

Amo-Vos – Quando amamos a Deus de todo o coração como Pai, olhamos para o outro com outros olhos; já não é o nosso inimigo, o nosso rival a quem tememos ou invejamos, mas sim o nosso irmão a quem desejamos todo o bem do mundo. Neste sentido o amor a Deus não existe sem o amor ao próximo e vice-versa, por isso, para Jesus, os dois fazem parte de um único mandamento do amor.

Três virtudes, três Papas
Há quem queira ver uma encarnação das virtudes teologais na vida dos três últimos papas da Igreja. João Paulo II, o que transpôs o umbral do terceiro milénio, é o papa da Esperança; Bento XVI, que escreveu uma encíclica sobre a Fé, proclamou o ano da Fé e toda a sua vida como teólogo se debateu pela razoabilidade da Fé, é, consequentemente, o papa da Fé; o Papa Francisco, pelo nome que escolheu, pelas suas palavras e gestos, o Papa da Caridade.


Confia no Senhor de todo o teu coração, e não te estribes no teu próprio entendimento. Reconhece-o em todos os teus caminhos, e ele endireitará as tuas veredas. Provérbios 3, 5-6

Ora, a fé é a certeza daquilo que esperamos e a prova das coisas que não vemos. (…) sem fé é impossível agradar-lhe; porque é necessário que aquele que se aproxima de Deus creia que ele existe, e que é galardoador dos que o buscam. Hebreus 11, 1, 6

Andamos pela fé não pela vista. 2 Coríntios 5,7

Ter Fé é assinar uma folha em branco, e deixar que Deus escreva o que quer. Sto. Agostinho
A Fé – um sexto sentido – transcende o intelecto sem contradizê-lo. Gandhi

A primeira das três virtudes é a base para as outras duas. Fé era, na mitologia romana, a deusa da confiança, filha de Saturno e Opis. Ter Fé significa acreditar, confiar, apostar, aderir a uma pessoa ou grupo de pessoas ou a uma doutrina. Acreditar, crédito, significa o mesmo que fiar-se, mas tem uma raiz etimológica diferente, pois o conceito de crer deriva de cor que em latim significa coração; colocar a mão sobre o coração é um ato simbólico que significa crer, confiar e até comprometer-se, ser leal, fiel.

Fé é a aceitação mental da verdade de uma doutrina, afirmação ou existência de um Ser Supremo, para a qual não há certezas imediatamente constatáveis. De maneira semelhante, a Bíblia define, por sua vez, a Fé em Hebreus 11, 1 como sendo, o firme fundamento das coisas que se esperam, e a prova das coisas que se não veem.

A Fé é um salto razoável preparado racionalmente, como quem caminha no seu caminho e chega a um ponto que tem de saltar para o lado de lá do precipício; Fé é um salto para o futuro ou um ver a realidade presente a partir de um futuro hipotético não presente. Fé é navegar no mar ou no ar ou debaixo do mar sem a visão do caminho ou rota que percorremos. Fé tem a criança que se lança no ar para os braços expectantes do seu pai ou mãe.

Do ponto de vista do conhecimento, a Fé não pertence à análise nem ao conhecimento lógico dedutivo, a Fé tem mais que ver com a síntese e com o conhecimento intuitivo. Ter Fé é intuir que algo está certo sem todas as garantias; é passar um cheque em branco, é emprestar dinheiro ou um livro e acreditar que ele volta. Fé é apostar e arriscar.

A teoria da relatividade geral de Einstein foi durante muito tempo um objeto de Fé; nascida de uma intuição do seu fundador, só há bem pouco tempo começámos a ter provas da veracidade desta teoria. A nova física quântica que admite realidades invisíveis e imperecíveis contradiz e é bem diferente da física mecânica de Newton, onde a realidade parecia funcionar na perfeição, como um relógio suíço

Racional, irracional, razoável

Muitos cientistas que olhavam para a Fé como superstição, com a teoria da relatividade e nova física quântica são obrigados a reconhecer que nem todo o conhecimento científico é lógico-dedutivo e suscetível de ser comprovado empiricamente no imediato. Estes cientistas são dualistas pois, entre o racional da ciência e o irracional da superstição, não reconhecem um conceito intermédio razoável, plausível humanamente entendível.

Fides quarens intellectum – A grande máxima de Sto. Anselmo fala da Fé como forma de conhecimento que capacita o intelecto a ir mais além de si mesmo, a saltar para o outro lado se não houver caminho para lá chegar. A Fé não é irracional pois se esforça por entender, não é de imediato comprovável como muita ciência do nosso tempo, por isso é razoável.

O concílio Vaticano I define de facto a Fé como um obséquio razoável. Razoável é a mistura do racional com o irracional. Ter Fé é ler os sinais dos tempos, detalhes impercetíveis que nos indicam que algo está para acontecer. Nós os humanos só sabemos do fogo quando vemos o fumo, os animais da selva sabem que há um fogo por perto muito antes de verem ou cheirarem o fumo. Em muitos outros fenómenos atmosféricos e da natureza, os animais são muito intuitivos para se protegerem dos desastres que estão eminentes.

A Fé identifica-nos com um passado

O património da humanidade não é constituído só pelos monumentos históricos, mas por tudo o que a raça humana é e fez ao longo dos 5 milhões de anos da sua existência neste planeta. Tudo isto está geneticamente incorporado no ADN de cada criança que vem a este mundo, é algo assim como o inconsciente coletivo de Jung, é parte de nós e define-nos como tal. Tudo isso é passado.

“Libris ex libris fiunt”, quando quero criar algo novo, em qualquer campo do saber, tenho que pesquisar sobre o que já foi feito naquela matéria, para assim agregar o fruto do meu trabalho. Só Deus tem a capacidade de criar do nada.

A Fé num Deus pessoal, Criador de tudo e de todos, que se revelou pelos profetas e depois no Seu Filho, que nos enviou o Espírito Santo, já tem uma história. A minha adesão a esta Fé leva-me a fazer parte desta história e dá-me identidade e sentido de pertença a um povo e uma comunidade.

O mesmo sucede a nível individual. Sei o que sou e do que sou capaz ao olhar para trás, e ver o desempenho dos meus talentos e dos meus defeitos nas diversas circunstâncias que a vida me atirou ao longo da minha história pessoal. É a aprovação desse passado que me dá o sentido de autoestima de que preciso para me relacionar adequadamente comigo mesmo, com Deus, com os outros e com o meu ambiente. Se estou apanhado pelo meu passado, refém do meu passado, não estou livre para os outros nem para Deus.

Até Deus que vive na eternidade, fora do espaço e devir do tempo, para se apresentar aos homens, fez-se valer da sua convivência com eles no passado, apresentando-se a Moisés como sendo o Deus de Abraão, de Isaac e de Jacob…

ESPERANÇA
(…) pela esperança que vos está reservada nos céus, da qual ouvistes falar quando vos foi anunciada pela palavra da verdade, o Evangelho. Colossenses 1:5

Lembrando-nos sem cessar da obra da vossa fé, do trabalho do amor, e da paciência da esperança em nosso Senhor Jesus Cristo, diante de nosso Deus e Pai, 1Tessalonicenses 1, 3

Tendo iluminados os olhos do vosso entendimento, para que saibais qual seja a esperança da sua vocação, e quais as riquezas da glória da sua herança nos santos; Efésios 1, 18

Mantenhamo-nos firmes na confissão da nossa esperança; porque fiel é o que prometeu. Hebreus 10,11

É provável que o Senhor tenha criado a esperança no mesmo dia em que criou a primavera. Bern Williams

Eles não sabem nem sonham /Que o sonho comanda a vida /E que sempre que o homem sonha
O mundo pula e avança /Como bola colorida /Entre as mãos duma criança
António Gedeão

Enquanto há vida há esperança. Marcus Tullius

A segunda das três virtudes é filha da Fé, tal como Jesus Cristo é Filho Unigénito do Pai e de facto é n’Ele que se firma a âncora da nossa Esperança. Como afirma taxativamente S. Paulo, “se Cristo não ressuscitou, é vã a nossa Fé, (1 Coríntios 15,14); tudo se desmorona como um baralho de cartas, se Cristo não ressuscitou, toda a nossa vida carece de sentido e de fundamento como um castelo de areia. Cristo é a única garantia de vida para além da morte porque Ele mesmo passou esse umbral, não como Deus que era, mas como homem no qual se encarnou, Jesus de Nazaré.

A mensagem de Jesus não trata de configurar só o nosso presente e salvar o nosso passado, tem que ver também com o futuro porque é acerca de algo que já está aqui, mas ainda não na sua totalidade: o Reino de Deus. É o projeto da construção do Reino que liga o passado, o presente e o futuro, que nos leva a caminhar numa dinâmica arquétipo de Egito, deserto, terra prometida.

A Esperança cristã é a virtude pela qual desejamos e trabalhamos pelo reino dos Céus e pela vida eterna. Colocando a nossa Fé em Cristo e nas suas promessas, apoiamo-nos nas nossas forças, mas também na ajuda complementar do Espírito Santo. A Esperança cristão é o cumprimento de tudo o que Deus prometeu ao seu povo desde Abraão.

A Esperança projeta-nos no futuro
Obstinado o burro, como não queria andar, o moço atou uma cenoura, na ponta de um cordel, que pendurou num pau, depois montou no burro e colocou a cenoura dois palmos à frente do focinho do burro. Na esperança de trincar a cenoura, o burro lá ia andando, não se dando conta de que a cenoura também se deslocava.

A Esperança é a Fé com rodas; a Fé dinâmica que nos projeta no futuro. Todos precisamos de uma “cenoura” para caminhar. O sonho é o motor da vida; não está no presente, o que inspira o nosso presente.

Martin Luther King foi um daqueles que, projetado no futuro, hipotecou a sua vida na luta pela igualdade entre brancos e pretos; um sonho que ele sabia que não se realizaria na sua vida. No dia anterior ao seu assassinato, inspirando-se em Moisés que depois de 40 anos a caminhar pelo deserto viu a Terra Prometida, na qual não entrou, desde o alto do Monte Nebo disse: “Estou grato a Deus porque me concedeu ver a Terra Prometida, posso não entrar nela convosco, mas estou certo de que nós, como povo, um dia entraremos nela.”

Para quem não sabe para onde vai, não há ventos favoráveis - Só se vive com sentido no presente se este estiver impregnado de futuro. Viver um presente sem a presença do futuro é andar à deriva. E quando o presente é doloroso, é a Esperança num futuro melhor que nos ajuda a suportá-lo.

Acerca do Reino de Deus os teólogos dizem que “” está presente no meio de nós, desde que Cristo o trouxe, “mas ainda não” na sua plenitude. Parafraseando esta ideia, podemos dizer que: enquanto que a fé nos ajuda a olhar para o presente como um “”, a Esperança leva-nos a olhar para esse mesmo presente com um ainda como um “ainda não” na sua plenitude.

Esperança ajuda-nos a desinstalar-nos do presente e a continuarmos a caminhar sabendo que, por melhor que estejamos, este não é ainda o Reino. A Esperança que nos traça o rumo do futuro dá-nos uma meta, um caminho a percorrer, um saber para onde ir.

Não há mal que sempre dure, nem bem que sempre ature” - É a Esperança que nos desinstala do presente quando este é risonho, dizendo-nos que ainda não chegámos, e é a Esperança que nos tira do desespero de uma situação presente. A vida é feita de altos e baixos, tal como o eletrocardiograma e o eletroencefalograma. A Esperança faz com que não percamos a cabeça nos altos e não nos desesperemos nos baixos.

Nem todos os otimistas têm Esperança, mas todos os que têm Esperança são otimistas; não olham para a garrafa meia vazia, mas sim meia cheia. A Esperança é uma forma positiva de interpretar o presente, de o ver pelos filtros dos sinais dos tempos, impregnado de um futuro risonho para todos porque Deus assim o quer para todos; Ele quer que tenhamos vida e a tenhamos em abundância.

CARIDADE
Meus irmãos, que aproveita se alguém disser que tem fé, e não tiver as obras? Porventura a fé pode salvá-lo? E, se o irmão ou a irmã estiverem nus, e tiverem falta de mantimento quotidiano, e algum de vós lhes disser: Ide em paz, aquentai-vos e fartai-vos; e não lhes derdes as coisas necessárias para o corpo, que proveito virá daí? Assim também a fé, se não tiver as obras, é morta em si mesma. Mas dirá alguém: Tu tens a fé, e eu tenho as obras; mostra-me a tua fé sem as tuas obras, e eu te mostrarei a minha fé pelas minhas obras. Tiago 2, 14-18

Ainda que eu falasse as línguas dos homens e dos anjos, se não tivesse amor, seria como o metal que soa ou como o sino que tine. E ainda que tivesse o dom de profecia, e conhecesse todos os mistérios e toda a ciência, e ainda que tivesse toda a fé, de maneira tal que transportasse os montes, e não tivesse amor, nada seria. E ainda que distribuísse toda a minha fortuna para sustento dos pobres, e ainda que entregasse o meu corpo para ser queimado, e não tivesse amor, nada disso me aproveitaria. 1 Coríntios 13, 1-3

Quem não ama não conhece a Deus, porque Deus é amor. 1 João 4:8
Todas as vossas coisas sejam feitas com amor. 1 Coríntios 16, 14

A terceira das três virtudes que procede da Fé e da Esperança, tal como o Espírito Santo procede do Pai e do Filho; e é de facto o Espírito Santo que nos ampara na vivência e prática desta virtude. A Fé fundamenta, a Esperança inspira e motiva, a Caridade é a ação, pois procede da Fé e da Esperança como o Espírito procede do Pai e do Filho.

É na Caridade ou pela Caridade que validamos a Fé e a Esperança ou que provamos que temos Fé e Esperança. Se não há Caridade, a Fé está morta e, se a Fé está morta, a Esperança que é a sua filha nunca nasceu. O valor da Fé e da Esperança está no seu papel de alicerce da Caridade e de possibilitarem a mesma.

Pela Caridade sabemos quem tem Fé e quem tem Esperança. Por outro lado, é na Caridade que a Fé e a Esperança se alimentam e crescem. É a Caridade que retroalimenta a Fé e a Esperança, fazendo crescer as duas. A Caridade leva a mais Fé e a Fé leva a mais Caridade.

Agora entramos na mais fina virtude teologal que é resultado das duas anteriores: ora se temos Fé, significa que acreditamos na revelação de Deus se temos Esperança, significa que temos a inspiração para perseverar, e também significa que temos em nós os valores que nos foram dados a partir da revelação de Deus, para praticá-los.

É aqui que entra a Caridade — que é a forma visível da Fé – é a Caridade que confirma a Fé e Esperança, pelo que temos como afirmação: “A fé sem obras é morta.”, pois significaria que não aderimos à revelação de Deus. Isso implicaria, por outras palavras, uma negação dos mandamentos: amar o próximo como a ti mesmo, ajudar os pobres, ensinar os necessitados e evangelizar, etc.

A Caridade é Amor, assim como é uma forma de amizade com Deus. Deus Ama-nos, logo devemos amar a Deus e se Deus nos ama significa que também devemos amar o próximo, logo temos a ordem: amar a Deus, a si e ao próximo. Se na fé amamos a Deus sobre todas as coisas, na caridade amamos ao próximo como a nós mesmos.

A caridade preenche o nosso presente
Obras son amores que no buenas razones… Provérbio castelhano

Ao contrário do passado e do futuro, o presente está nas nossas mãos, nele e só nele somos livres para atuar. O presente é o aqui e agora da nossa vida que deve ser cheio de ação, de atos de Caridade e Amor. Para o cristão, viver é amar e amar é servir, colocar-se ao serviço dos que mais necessitam.

Considerando o que Madre Teresa de Calcutá fazia e o muito que havia para fazer ante tanta pobreza e miséria, um jornalista disse um dia, “O que a Madre faz é como uma gota de água no oceano”; ao que ela respondeu com muita humildade, “sim, mas se o não fizesse o oceano teria uma gota de água menos”.  

Deus não nos pede que revolucionemos o mundo, ou que façamos o melhor, só nos pede o nosso melhor. Na parábola dos talentos, o que conseguiu mais, não é mais louvado que o que conseguiu menos; na parábola dos trabalhadores da vinha, os que trabalharam o dia inteiro, não receberam mais do que os que trabalharam só uma hora; na parábola do semeador, os que produzem 100%, não são mais exaltados que os que produzem 60% ou que os que só produzem 30%.

Muito ou pouco, tudo o que o Senhor nos pede é que demos fruto. Que a nossa vida seja produtiva; que deixemos cá mais do que o que cá encontramos. Que sejamos parte da solução e não parte do problema; ou seja, que o nosso viver e atuar seja um contributo para a solução dos problemas deste mundo e não um contributo para os agravar.

Seremos julgados pelo muito ou pouco que amamos
É na Caridade que o Amor de Deus se manifesta no amor ao próximo e vice-versa. Como Cristo está no pobre e necessitado, é amando o pobre e o necessitado que vivemos o evangelho e que amamos a Deus.

Ao fim seremos julgados pelo muito ou pouco que amamos; segundo Mateus 25 as perguntas do juízo final estão já aí, mau seria que não passássemos um exame cujas perguntas já são conhecidas. Estas perguntas não são sobre a Fé nem sobre a Esperança; estas, em relação à salvação, são acessórias; valem na medida em que fizeram aumentar a Caridade ou não.

O juízo final não é sobre a Fé, que religião ou prática tivemos, nem sobre a Esperança, mas sim exclusivamente sobre a Caridade. Tive fome, tive sede, estava nu, na prisão, doente, era peregrino, forasteiro, estrangeiro e tu me prestaste ou não prestaste assistência.

A matéria do juízo final não é uma questão shakespeariana, ser ou não ser, mas sim um pouco mais positivista ou pragmática, fazer ou não fazer. De boas intenções está o inferno cheio, por isso, é pelas obras, pelos frutos que conhecemos uma pessoa, tanto vales quanto fazes.

Como é o nosso fazer, o nosso obrar e não o nosso ser que vai a julgamento, não estamos em vantagem sobre os agnósticos, os ateus, os muçulmanos ou os fiéis de qualquer religião. O importante é o que chegaste a fazer; se bem que a religião cristã é a plenitude da verdade, todas as religiões têm algo de verdade, e é por essa verdade todas elas levam à autorrealização do homem, à felicidade e ao Céu.

Muitos com poucos meios (refiro-me aos fiéis de outras religiões) chegaram mais além na perfeição que outros, como os cristãos, com todos os meios de santidade ao seu dispor. Não esqueçamos que:  “A quem muito foi dado, muito será exigido; e a quem muito foi confiado, muito mais será pedido". (Lucas 12, 48)

Conclusão - As três virtudes funcionam na nossa vida como um GPS: a Fé, conecta-nos com Deus, a nossa estrela orientadora ou satélite, dizendo-nos onde estamos e o que somos, ou seja, pecadores. A Esperança diz-nos para onde queremos ir e o que queremos ser, isto é, Santos. A Caridade é o único meio e roteiro para chegar à santidade.

Pe. Jorge Amaro, IMC