15 de maio de 2020

3 Fases da Ação Social: Ver - Julgar - Atuar

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Entreguei-lhes a tua palavra, e o mundo odiou-os, porque eles não são do mundo, como também eu não sou do mundo. Não te peço que os retires do mundo, mas que os livres do Maligno. De facto, eles não são do mundo, como também eu não sou do mundo. João 17, 14-16

Os cristãos estão no mundo, mas não são do mundo, não vivem como muitos, instalados na pura mundanidade, mas entendem a vida como uma peregrinação para a casa do Pai - não temos aqui morada permanente, estamos a caminho da nossa verdadeira pátria (cf. Hebreus 13,14).

Esta é a verdade revelada e, como tal, indiscutível. No entanto, uma vez que os primeiros cristãos estavam convencidos que a segunda vinda de Cristo estava para breve (cf. 1 Tessalonicenses 4:15-17) ou talvez por influência da filosofia grega, acabaram por ser acusados no seu tempo de não serem bons cidadãos e de não participarem na vida social, vivendo à parte com mentalidade de ghetto.

O projeto individual e social de Jesus de Nazaré
Esta não era certamente a filosofia de vida de Jesus de Nazaré, tal como os sinópticos a descrevem. Jesus veio ao mundo não para o condenar, mas sim para o salvar (João 3, 17). Esta salvação, que devemos entender como saúde, aparece nos evangelhos com duas vertentes: uma individual e outra social.

A nível individual, Jesus apresenta-se como caminho, verdade e vida (João 14, 6), como modelo, como referência do que é verdadeira e genuinamente humano. Jesus é de facto verdadeiro homem e verdadeiro Deus: 100% Deus e 100% homem. Por isso, neste mundo, todo aquele que quiser ser autenticamente humano tem de ter Jesus como referência, como modelo e paradigma. Jesus passou grande parte da sua vida curando, devolvendo a saúde espiritual, psicológica, moral e física a todos os que se cruzavam com Ele.

Irmão universal, filhos adotivos
Ainda a nível humano, Jesus santificou purificou a humanidade ao fazer-se homem e, na sua ressurreição, fez da morte não um destino, mas uma passagem para a vida eterna. Na sua ascensão, levou para o Céu a humanidade purificada por ele na sua encarnação. Antes de Jesus, éramos simples criaturas de Deus, pois Deus só tinha um filho gerado não criado, enquanto que nós somos criados não gerados. Jesus constituiu-se irmão universal ao dar-nos o seu Pai como nosso Pai e ao fazer com que nos dirigíssemos, na oração que nos ensinou, ao seu Pai como nosso Pai. Jesus fez de nós filhos adotivos, e, portanto, co-herdeiros da vida eterna.

Transformar o mundo no reino de Deus
Venha a nós o vosso Reino, seja feita a Vossa vontade assim na terra como no Céu. Mateus 6, 9-10

É a primeira petição da oração que o Senhor nos ensinou, até porque Ele já nos tinha instruído noutra ocasião para, na nossa atuação neste mundo, buscarmos primeiro o reino de Deus que o resto nos seria dado por acréscimo (Mateus 6, 33); ou seja, o resto não devia ocupar-nos nem preocupar-nos.

E para os que não saibam ou de momento possam ter esquecido o que é verdadeiramente o Reino de Deus ou o Reino dos Céus para Mateus, a sua definição já se encontra no mesmo Pai Nosso: é a sociedade ou o mundo no qual se faz a vontade de Deus como esta já se faz no Céu. Como muita da pregação de Jesus se fez no contexto de uma refeição, utilizando o banquete como metáfora do Reino de Deus, muitos cristãos podem ter interpretado à letra as parábolas de Jesus, chegando a pensar que o Reino de Deus era um banquete. S. Paulo veio corrigir esta ideia dizendo “o Reino de Deus não é comida, nem bebida, mas justiça, paz e alegria no Espírito Santo” (Romanos 14, 17).

A nível social, vemos Jesus plenamente integrado na sociedade com o projeto de transformar o mundo no Reino de Deus. Todos os sinópticos o mencionam, em especial o Evangelho de S. Mateus que contém a maior coleção de parábolas sobre o reino de Deus, a que ele prefere chamar Reino do Céu.

É certo que não somos do mundo, que não temos aqui morada permanente, mas enquanto peregrinamos por Ele podemos ser como aquele pote de barro quebrado que vai deixando um regueiro de água que depois se transforma em flores. Não devemos ser como o outro pote de barro sem nenhum furo que conserva intacta e imaculada toda a sua energia e não faz nada com ela.

“Eu estou no meio de vós como quem serve” Lucas 22,27. 
“Eu vim ao mundo para servir e não para ser servido” Mateus 20, 28.

Jesus não é alheio aos problemas do mundo e não está somente interessado em salvar o salvável, deixando que os seus discípulos e o resto do mundo se percam. Jesus vem para salvar o mundo inteiro e delineia para o efeito um projeto social que é o Reino de Deus. No Sermão da Montanha, capítulos 5 a 7 do Evangelho de S. Mateus, escreve a constituição, ou seja, a lei fundamental pela qual esse reino desse ser gerido.

Já… mas ainda não
(…) se é pelo Espírito de Deus que Eu expulso os demónios, então chegou até vós o Reino de Deus. Mateus 12,28

As atuações de Jesus, pelo seu comportamento, pela sua palavra e pela sua obra, são o começo deste Reino de Deus. É Ele que dá o pontapé de saída, embora entenda que o Reino não vai chegar à sua plenitude no seu tempo. Sabe isso desde o começo e por isso escolhe 12 entre os seus muitos discípulos para continuar a sua obra.

Estes discípulos constituem-se em Igreja que, em si mesma, deve ser o fermento que vai levedar toda a massa do mundo e transformá-la num pão para todos (cf. Mateus 13, 33). A Igreja não existe para si mesma, ela tem uma missão: a de levar a Boa Nova do Reino a toda a criatura (Marcos 16, 15).

Neste sentido, não deveria enfrentar atritos com outras religiões ou homens de boa vontade. Pelo contrário, como todas as religiões buscam humanizar o Homem e a Sociedade, a Igreja deveria unir-se a outras forças e esforços que procuram fazer deste mundo um lugar mais digno e desta sociedade um reino de justiça, paz e integridade para a criação.

A Igreja tem uma missão, a mesma que tinha o seu fundador: a de continuar a sua obra, o seu projeto de transformar este mundo no Reino de Deus. A Igreja opera isto em todo e cada cristão que vive comprometido com a luta pela justiça e pela paz, chegando alguns até a dar a vida como o Mestre. Mas tem também uma doutrina constituída por escritos, encíclicas papais, que foram sendo redigidos pelos papas ao longo dos tempos sobre temas sociais; o conjunto destes escritos chama-se doutrina social da Igreja.

Desde o Papa Leão XIII, com a encíclica chamada Rerum Novarum de 1891 (Sobre as coisas novas – sobre a condição dos trabalhadores) até à última intitulada Laudato Si de 2015 (O Senhor seja louvado – Sobre a Ecologia) do Papa Francisco, a Igreja tem vertido o Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo sobre todos os temas sociais que afligem a humanidade, procurando iluminar com esse Evangelho estes temas e procurando soluções juntamente com o resto da sociedade.

História do método
Tenho demonstrado confiança na liberdade dos jovens, de forma a melhor educar a liberdade religiosa. Ajudei-os a VER, JULGAR e AGIR por si mesmos, mediante a realização de ações sociais e culturais próprias, obedecendo livremente às autoridades, a fim de se tornarem testemunhas adultas de Cristo e do Evangelho, conscientes das suas responsabilidades pelos seus irmãos e irmãs em todo o mundo. Joseph Cardjin, 1965

Joseph Cardjin, era um sacerdote belga, guia espiritual da Juventude Operária Católica (JOC) que tinha como objetivo superar a dicotomia entre fé e vida, levar a fé para a vida e trazer a vida do dia a dia para os âmbitos da Igreja, de modo a ser analisada à luz do Evangelho. Estávamos nos anos 60 em que se dizia que devíamos ser cristãos no partido político e militantes na Igreja, que devíamos ter numa mão o jornal e na outra a Bíblia. O método, que inicialmente tinha nascido como método de revisão de vida da JOC, começou a ser também usado pela Ação Católica, organização que também procurava levar a fé à vida, com o intuito de transformar a história segundo os critérios do Evangelho.

Desde o seu aparecimento, o método Ver-Julgar-Atuar tem sido o ex libris da atuação dos cristãos na sociedade. O Papa João XXIII cita o método na sua encíclica Mater ed Magistra 1961. Os bispos latino-americanos usaram-no na Conferência de Medellin, em 1968, na de Puebla, em 1979, na de Santo Domingo, em 1992 e na de Aparecida, em 2007. De todas estas conferências, a mais importante é a primeira, tendo dado origem a duas grandes correntes na Igreja latino-americana: uma para a igreja militante ou popular (as Comunidades Eclesiais de Base), a outra para a Igreja pensante (a Teologia da Libertação).

Fundamentos bíblicos do método
O Senhor disse: «Eu bem vi a opressão do meu povo que está no Egito, e ouvi o seu clamor diante dos seus inspetores; conheço, na verdade, os seus sofrimentos. Desci a fim de o libertar da mão dos egípcios e de o fazer subir desta terra para uma terra boa e espaçosa, para uma terra que mana leite e mel…» Exodo 3, 7-8

Deus é omnipresente, não dorme e bem vê o que acontece ao seu povo. Conhece a situação porque a avaliou, sabe qual é a raiz do problema, sabe qual a causa remota desse sofrimento: o exílio no Egito, a escravidão a que os judeus foram submetidos. Conhece as causas recentes desse sofrimento: leis mais duras, mais produção com menos meios e os inspetores que fazem cumprir essas leis. Por fim, Deus decide libertar o seu povo da terra do Egito, uma decisão radical, pois neste caso não havia meias medidas a tomar.

(…) para que vejam e saibam, considerem e compreendam, de uma vez por todas, que é a mão do Senhor que faz estas coisas, que o Santo de Israel as realizou. Isaías 41, 20

Depois de narrar tudo o que Deus fez pelo seu povo, conclui, convidando o povo a ver tudo quanto o Senhor realizou, a compreender isso intelectualmente e, finalmente, a render-se à evidência e a aderir de coração aos seus ensinamentos, a seguir a sua vontade. O cristão o mundo e os problemas que o afligem com os olhos do PAI, julga com os critérios do FILHO e atua sob o impulso e orientação do ESPÍRITO SANTO.

Ver com os olhos do PAI
A lâmpada do corpo são os olhos; se os teus olhos estiverem sãos, todo o teu corpo andará iluminado. Se, porém, os teus olhos estiverem doentes, todo o teu corpo andará em trevas. Portanto, se a luz que há em ti são trevas, quão grandes serão essas trevas! Mateus 6, 22-23

Observar sem julgar
É certo que o objetivo do “Ver” nesta primeira etapa da ação social do cristão não coincide com o “observar” da comunicação não-violenta. No entanto, podemos aprender e aplicar aqui algo da filosofia desta teoria. Uma boa observação é o que objetivamente uma câmara de vídeo capta e depois reproduz, sem tirar nem pôr. Descreve o que acontece, deixando de fora interpretações, julgamentos, avaliações.

Fácil de dizer, mas muito difícil de pôr em prática: quando relatamos o que acontece, normalmente fazemo-lo com uma avaliação e, muitas vezes, até esquecemos o que aconteceu e apenas referimos a nossa avaliação. Por exemplo, dizemos que o João é um bom rapaz, quando deveríamos dizer que vimos o João a defender um colega que estava a ser vítima de bullying.

Ver com olhos de criança
A criança não tem preconceitos nem ideias pré-concebidas, olha para a realidade e relata-a com extrema precisão e sinceridade, chegando até a desconcertar-nos a nós, adultos. Do ponto de vista físico, se não sofremos de miopia, não conservamos em adultos a visão nítida que tínhamos em crianças e, tal como na visão física se vão formando cataratas, na visão interior estas correspondem aos filtros que colocamos nos olhos por forma a ver apenas o que queremos ver e a fazer vista grossa ao que não queremos ver.

Perdemos a visão periférica e ficamos com uma visão redutora ou visão de túnel, como as mulas que puxam carroças com palas colocadas para não se distraírem nem se assustarem com o trânsito.

Ou vemos ou interpretamos
Não podemos ver e interpretar conscientemente ao mesmo tempo, pois são duas funções cerebrais diferentes. Ver é recolher dados, como quem faz a colheita de um produto agrícola. Nesta primeira etapa, o importante é recolher a maior quantidade possível de dados, sem olhar ao que colhemos.

No momento em que começamos a analisar algo do que colhemos, deixamos de colher novas informações. Os nossos olhos podem até permanecer abertos, mas já não veem. Toda a nossa atenção se volta para dentro e se fixa no dado que nos impactou e nos fechou ao resto. A partir deste momento, avaliamos, interpretamos, analisamos, mas já não vemos.

Contra factos não há argumentos, diz o povo. Saibamos os factos e coloquemos de lado os argumentos, pois levam à interpretação, à ideologia e a fechar os olhos - é mais a realidade que nos escapa que a realidade que recolhemos. Segundo Aristóteles, a visão é o sentido mais perfeito porque oferece evidência; a audição tem a mediação da palavra. A interpretação também não é possível sem palavras e conceitos: o que se observou e relata é uma tradução da realidade, com palavras e conceitos alheios ao que vemos. Como diz o provérbio italiano “traduttore traditore” já não é o mesmo.

Projetar ideologia no que se vê
Há uma pequena história que prova este ponto; partimos para o campo de visão com a nossa bagagem cultural, os nossos diplomas e o que fazemos. Não se trate de ver como uma criança veria, desapaixonadamente, sem colocar na realidade nada que não esteja lá. Partimos à procura de factos que provem os nossos argumentos.

Um sacerdote espanhol, com toda a sua bagagem europeia, depois de haver contemplado por algum tempo a situação deplorável e miserável em que vivia uma comunidade de camponeses latino-americanos, perguntou-lhes, “Mas vós não tendes fome e sede de justiça?” Eles responderam “Que é isso de fome e sede de justiça? Nós, senhor Padre, só conhecemos a fome de pão e a sede de água”.

Muitas se não mesmo todas as revoluções se fizeram por aproveitamento do povo e da sua ignorância: não foram queridas pelo povo. Alguém com uma ideologia, informa de maneira simplista e unilateral o povo para levantar os seus ânimos. Assim foi a revolução bolchevique e assim atua o populismo atual.  São revoluções que não partem da base nem vão ao encontro dos problemas reais que o povo tem na sua perspetiva.

Conta-se que um macaco e um peixe eram muito amigos e brincavam no rio todo o dia até que um dia choveu muito, o rio engrossou e o peixe tentava nadar contra a corrente para não ser levado pela água; o macaco viu a situação e foi salvar o seu amigo, trazendo-o para terra. É claro que o peixe sem oxigénio debatia-se entre a vida e a morte, abanando-se; o macaco ao ver isto disse, “Acabo de te salvar a vida e ainda protestas?”

Mesmo quando o militante social está bem-intencionado, se o que faz é feito unilateralmente segundo a sua ideologia, inferindo e imaginando o que possam ser as necessidades do povo sem o consultar, será paternalismo. Nós, missionários, vimos e fizemos muito isto com os povos indígenas e, como consequência, restam os “elefantes brancos” que deixámos para trás: depois de nos retirarmos, a obra não teve continuação.

Ver e questionar: questões exploratórias
No entender do Pe. Joseph Cardjin, assim como de todos os que na Igreja fizeram uso deste método, o nosso olhar deve ser um olhar que questiona. Quanto mais questionarmos, mais realidade se vai abrindo ante os nossos olhos. Mais uma vez, devemos ser como crianças de 5 anos que tudo questionam com os seus infindáveis porquês, ávidas de saber.
  • Que está a acontecer, onde, como e quando começou?
  • Quais as causas, as consequências, quem está envolvido, quem não está envolvido? Factos isolados ou gerais.
  • Que dizem, pensam e sentem as pessoas envolvidas e afetadas, como conceptualizam a sua experiência? Que tentaram fazer como solução?
  • Descobrir atitudes, modelos, paradigmas, traições, valores que podem estar na raiz do que acontece.
Olhar empático com os olhos do Pai
O centro de atenção é a pessoa, não as ideias nem as coisas. É um olhar empático, um olhar que suscita sentimentos; neste sentido, não é indiferente nem neutro, como não era neutro o olhar de Deus sobre o sofrimento do povo hebreu na terra do Egito. Deus é um Deus que desce, que chora com quem chora, assim como Jesus chorou a morte de Lázaro e a ruína de Jerusalém.

Quando alguém não consegue fazer-nos entender a sua situação, diz “coloca-te no meu lugar”. Deus em Jesus Cristo praticou isto: mesmo ao assumir a nossa natureza humana, foi empático connosco, olhou a realidade pelos nossos olhos, calçou os nossos sapatos, vestiu as nossas roupas, provou o mesmo sofrimento que nós e, por isso, conseguiu ajudar-nos.

Apesar de não ser neutro, Deus não toma o partido de uns contra os outros. Toma o partido da verdade e da justiça, mas não o partido de uns contra os outros. Deus quer a salvação do que sofreu o pecado e a salvação do que o provocou; do filho pródigo e do irmão mais velho. Deus não deita o menino fora com a água do banho Ele que faz chover sobre justos e injustos, diferencia entre pecado e pecador.

Julgar com os critérios do FILHO
Julgar é o ato mental pelo qual formamos uma opinião sobre algo; também é o ato mental pelo qual decidimos conscientemente que algo é de um modo e não de outro e o que fazer. Mas antes de chegar à decisão há muito trabalho prévio a cumprir.
É frequente alguém que está ao nosso lado a observar o mesmo que nós, perguntar-nos o que é que se passa, o que é que está a acontecer. Uma coisa é ver, outra é entender o que vemos, interpretar o que vemos, encontrar o sentido do que vemos, o que significa subjetivamente para cada um de nós e objetivamente para todos.

Os Evangelhos estão escritos desde o século I e, no entanto, a Igreja debateu a entidade e a missão de Jesus de Nazaré durante cinco séculos. Finalmente, conseguiu conceptualizar a identidade de Jesus ao defini-lo verdadeiro Homem e verdadeiro Deus, no concílio de Calcedónia, no ano 451. Tal como para ver uma floresta temos de sair dela, pois dentro dela só vemos árvores, também para interpretar verdadeiramente um facto - neste caso, Jesus de Nazaré - foi preciso distância e tempo para poder julgar melhor. Os homens e mulheres do seu tempo não chegaram a esta definição da identidade de Jesus, apesar de terem sido testemunhas oculares dos factos.

As aparências iludem
É um provérbio muito conhecido, mesmo no âmbito da ciência. Apesar de a ciência precisar dos cinco sentidos para analisar e conhecer o real, até a ciência sabe que há mais realidade que aquela que os cinco sentidos conseguem captar.

Por exemplo, usamos microscópios para chegar ao mundo do minúsculo e usamos telescópios para chegar ao mundo do maiúsculo. E, mesmo assim, há mais realidade que aquela que o microscópio ou o telescópio consegue captar. O mesmo acontece com o som e com os objetos dos demais sentidos.

Um outro problema é que os próprios cinco sentidos que nos ajudam a conhecer a realidade também nos enganam sobre a verdade dessa mesma realidade. Hoje sabemos que a Terra gira à volta do Sol, mas o que vemos é o Sol girando à volta da Terra.

É preciso ver para além das aparências, ter visão de raio X para ver o que está por detrás das coisas, para saber interpretar o que acontece e ver no que acontece os “sinais dos tempos”. Os animais estão mais atentos a estes fenómenos, e detetam tormentas, furacões, trovoadas, terramotos muito antes destes acontecerem e tomam precauções.

Foi neste sentido que o Papa João XXIII olhou para o mundo moderno e para a Igreja e se deu conta de que esta estava desfasada do mundo moderno. Por isso, convocou o Concílio Vaticano II para adaptar a Igreja aos tempos modernos. Na tradição de Israel, tal como a descreve o Antigo Testamento, esta era a função dos profetas: a de anunciar a vontade de Deus, denunciar os comportamentos contrários a ela e guiar o povo para Deus pelos caminhos tortuosos da História.

Julgar, questionando-se: questões de compreensão
Depois das perguntas exploratórias para recolher o máximo possível de dados sobre determinado problema, é tempo de colocar os dados, os acontecimentos, os factos, as realidades sobre a mesa, para serem analisados, interpretados, julgados. Para além de analisar, julgar também significa discernir o que está certo e o que está errado e depois partir para uma ação transformadora.

As questões de compreensão são parecidas com as questões exploratórias, com a diferença de que as primeiras eram colocadas para saber mais, para recolher mais dados relevantes, enquanto que estas últimas são questões que o investigador coloca a si mesmo e às quais precisa de responder para encontrar uma solução satisfatória para o problema ou situação em questão:
  • Quais são as causas do que acontece a curto e longo prazo, quais os agentes envolvidos?
  • Quais as repercussões do que acontece, quais são as possíveis consequências a curto e longo prazo e quem vai sofrê-las?
  • Quem beneficia, quais os benefícios, quem tem poder, quem abusa do poder, quem não o tem?
  • Quais as soluções para que todos ganhem, para que haja justiça, paz e harmonia?
Como usamos tubos de ensaio para analisar certas substâncias e colocamos reagentes para ver como se comportam, assim fazemos com as realidades sociais. Estas devem ser iluminadas, confrontadas, sobretudo com o Evangelho, a doutrina da Igreja, a tradição, o magistério, assim como com a História e outras ciências sociais relevantes para o tema em questão.

Julgar com o critério do Evangelho
Somos cristãos e como tal medimo-nos por referência a Cristo, tanto no nosso pensar como no nosso atuar. Procuramos chegar ao ponto a que S. Paulo chegou ao dizer “Já não sou eu que vivo é Cristo que vive em mim” (Gálatas 2, 20). Cristo é o nosso critério pessoal, mas, quando se trata de analisar problemas ou situações sociais, o Reino de Deus é o nosso paradigma ou modelo de sociedade de convivência fraterna entre irmãos, filhos do mesmo Pai.

Há critérios que servem de meio para avaliar a realidade, lei, constituição, etc. - neste caso, o Evangelho. Um tribunal também julga, vê e atua. Quando julga um ato, contrapõe-no à lei vigente e determina se infringiu ou não a lei. O ato é o que é, o Evangelho é o dever ser; o ato é a realidade, a lei e o evangelho são o ideal.

Jesus fez isto mesmo ao julgar, perante os fariseus acusadores, se os Apóstolos tinham ou não infringido a lei do sábado por terem nesse mesmo dia comido espigas que arrancaram das searas por onde passaram (Cf. Marcos, 2,23ss). Abriu mentalmente a sua Bíblia e procurou um episódio em que o rei David tinha feito algo que também não lhe era permitido fazer (Cf. 1 Samuel 21,6ss) mas que fez guiado pela sua consciência, que deve discernir em cada momento o que fazer e não apenas obedecer cegamente à lei.

Tudo o que o Evangelho refere, sobretudo o de S. Mateus, acerca do Reino de Deus é normativo para nós, é a referência nas relações sociais e representa o caminho para uma sociedade mais justa, mais fraterna e pacífica. A situação que temos diante de nós tem certamente respostas na Bíblia, sobretudo no Evangelho, e nele podemos encontrar situações semelhantes e respostas sobre o que fazer.

Julgar com o critério das ciências humanas
O cristão, ao contrário de outros na sociedade civil, não tem medo da ciência em geral, muito pelo contrário. As últimas descobertas, como a teoria da relatividade, o Big Bang, etc. parecem confirmar a fé, mais que negá-la.

Na encíclica Humane Generis de Pio XII, a Igreja aceita as descobertas de Darwin, o que veio ajudar a que muitos cristãos não lessem o livro do Génesis à letra no que respeita à criação do ser humano, pois não se pretende que este seja um livro de ciência.

No caso do aborto, a Igreja aceita a ciência que determina que a vida humana começa quando uma célula de um varão se junta a uma célula de uma mulher. A Igreja, baseada na ciência, defende a existência de vida humana desde este ponto. É a sociedade civil que nega esta evidência científica e legisla com base na mentira e na pseudo-conveniência de alguns contra os seres humanos desprotegidos que são os bebés abortados.

A Igreja até inspira ação social e legislativa por intermédio das suas encíclicas. Exemplo disto é o princípio de subsidiariedade que hoje faz parte da Constituição da Comunidade Europeia, assim como da Constituição dos Estados Unidos e que apareceu pela primeira vez em 1891, na encíclica Rerum Novarum do Papa Leão XIII que acima citamos.

Dentro das ciências humanas – Sociologia, Psicologia, Filosofia - devemos dar crédito à História. Não sei até que ponto é verdade ou mito que a História se repete. Provavelmente é verdade, quando as mesmas circunstâncias se sucedem, combinadas com a natureza humana que não muda. Nem sempre aprendemos com os erros passados, achando que esta situação é nova. Mas numa observação mais atenta dos mesmos factos a partir de uma perspetiva histórica, parece efetivamente que os mesmos erros se vão cometendo uma e outra vez…

Atuar por impulso e a orientação do ESPÍRITO SANTO
Os filósofos não têm feito, até agora, mais que interpretar o mundo de diferentes maneiras, trata-se agora de transformá-lo. Karl Marx

Karl Marx, consciente ou inconscientemente, usou o método de ver, julgar e atuar na sua filosofia. Teve o mérito de integrar a praxis na filosofia, que até então era um discorrer de verdades sem nenhuma aplicação prática. Com o seu materialismo histórico e dialético, Marx ofereceu uma filosofia que não se ficava só pelas opiniões, mas que via e analisava a sociedade do seu tempo, mais concretamente o capitalismo da era industrial, e partia para a ação.

É certo que Marx partiu para este método com uma carta na manga: a ideologia ateísta e materialista que lhe tinha proporcionado seu antecessor Feuerbach, ou seja, tentar interpretar a História e a realidade atual a partir de uma ótica materialista. Esse foi o seu erro. Como dissemos anteriormente, devemos observar sem teorias em mente; se o fizermos, veremos apenas o que confirma a teoria que à priori orienta o nosso olhar.

A praxis marxista, tanto de Lenine na revolução bolchevique na Rússia, como a de Mao Tsé-Tung na revolução cultural da China, é da responsabilidade destes senhores e não de Marx. Aliás, já no seu tempo havia tantas ideias acerca do que era e não era marxismo que o próprio Marx chegou ironicamente a afirmar que não era marxista.

De Marx recolhemos a sua boa observação, o seu olhar, portanto, e o seu julgamento baseado na análise geralmente acertada do problema do capitalismo. Esta análise foi legitimamente utilizada de alguma forma pela Teologia da Libertação na América Latina pois, como vimos atrás, a Igreja deve utilizar as ciências humanas nas áreas em que estas são especialistas.

Porém, o magistério do papa João Paulo II não entendeu isto, suponho que por causa do trauma pessoal vivido num dos países onde a prática comunista falhou, a Polónia. A Teologia da Libertação foi condenada em bloco e os seus teólogos vilmente expulsos das suas cátedras.

“De cada qual, segundo a sua capacidade; a cada qual, segundo as suas necessidades” - é uma das ideias que a sociedade europeia aproveitou de Marx e na qual se baseia a segurança social e o serviço nacional de saúde.

A ação é o projeto de transformação da realidade e equivale a traçar tarefas, planos, projetos, de acordo com as decisões tomadas na etapa anterior.

O método está orientado para a transformação da realidade de acordo com os critérios do Evangelho: em transformar o mundo no Reino de Deus. O Espírito Santo conduz este trabalho, como conduziu o ministério de Jesus.

“WWJD – What would Jesus do” - há uns tempos foram populares entre os cristãos do Canadá e da América do Norte Tshirts com esta expressão. A praxis cristã é precisamente isto: fazer em casa, numa situação da nossa vida, o que Ele faria. Pois Ele é a verdade do nosso olhar, o caminho do nosso julgar e a vida do nosso atuar.

Atuamos como Igreja
Jesus enviou os seus discípulos não como franco-atiradores, mas dois a dois: a praxis cristã é sempre uma praxis comunitária. Duas cabeças pensam mais e melhor que uma e a ação comunitária é sempre mais profunda, refletida, duradoura e transformadora que a ação individual, assente apenas no ímpeto de alguém.

Devemos fugir à tentação do imediatismo, de querer ter resultados imediatos. “Eu plantei, Apolo regou e é Deus quem faz crescer, recordemos” (1 Coríntios, 3, 6). Ser agente de libertação é ser fermento na massa (Mateus 13, 33). Para que o grupo faça uma ação concreta, é preciso um projeto com todos os seus detalhes.

A comunicação e a organização são elementos cruciais. É importante começar com objetivos razoáveis. As pessoas aprendem através do processo, tornam-se mais capacitadas. A ação libertadora parte das necessidades das pessoas, descobre a raiz do problema e parte para a ação com a participação de todos na construção da civilização do amor

Atuamos pelo impulso e orientação do Espírito Santo
O Espírito Santo e nós próprios resolvemos não vos impor outras obrigações além destas, que são indispensáveisAtos dos Apóstolos 15, 28

Já o próprio Jesus atuou sob o impulso do Espírito Santo, cheio do Espírito Santo fez e disse muitas coisas. Assim também nós devemos atuar como os apóstolos, num clima de oração, procurando a inspiração, a orientação e o impulso do Espírito Santo. Ele é a alma da Igreja que é o corpo místico de Cristo, Ele é Deus interior íntimo meu, como dizia Sto. Agostinho, é mais íntimo que o meu íntimo; Jesus veio e regressou à casa do Pai, o Espírito Santo veio para ficar connosco e para, atuando dentro de nós, ser a inspiração, a motivação, o motor e a orientação da nossa atuação no mundo.

Ver – Julgar – Atuar - Rever - Celebrar
Posteriormente, alguns alargaram estendem este método com outras duas realidades: Ver – Julgar – Atuar – Celebrar – Rever. Entendemos que as duas últimas realidades estão a mais, o celebrar pode ser feito em cada uma das etapas, sobretudo quando descobrimos a verdade das coisas ao julgar ou analisar o problema; quando dizemos “Eureka, descobri”, aí mesmo já pode existir uma celebração e não necessariamente apenas no fim do processo ou da ação.

Por outro lado, o rever também pode e deve ser feito tanto no fim do triplo processo como no fim de cada uma das etapas. Quando acontece no fim do processo, serve como olhar para o início do processo outra vez, ou seja, com o símbolo de reciclagem em mente, este processo de ver, julgar e atuar recomeça quando termina.
Pe. Jorge Amaro, IMC











1 de maio de 2020

3 Fases da ação individual: Pensar - Sentir - Agir

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Quando abordámos os três tipos de personalidade, dissemos que ninguém é puramente cerebral, visceral ou emocional. Apesar de os cerebrais terem maior tendência para pensar, os emocionais para sentir e os viscerais para agir, nenhuma destas atividades é exclusiva de cada uma destas personalidades. A razão, a emoção e a ação são comuns a todos os seres humanos: todos pensamos, sentimos e agimos.

Ao delinear as linhas mestras deste texto, “Pensar – Sentir – Agir”, pensei numa outra tríade que também faria sentido: “Ver – Julgar – Atuar”. No processo de discernir entre a primeira ou a segunda, dei-me conta de que apesar de haver pontos em comum há também pontos divergentes entre as duas tríades.

Na primeira, as emoções têm um lugar preponderante e na segunda não. Na segunda, o pensar tem um lugar preponderante, pois é precedido do ver ou observar. No meu entender, a primeira tríade é mais adequada à pessoa, enquanto ser individual, como fator de mudança ou conversão, enquanto que a segunda é mais adequada ao ser humano como parte de uma sociedade, para instigar mudança social, revolução ou evolução.

Comportamento tridimensional
Somos seres trinitários ou tridimensionais porque a existência de um supõe a existência de outros dois: Pai – Mãe – Filho(a); e se assim é, com toda a franqueza, não podemos dizer que existimos porque a nossa existência não se justifica por si mesma nem depende de si mesma. Não deveríamos dizer “penso logo existo”, mas sim “penso logo coexisto”.

Como seres tridimensionais que somos, o nosso comportamento é tridimensional também, pois somos o que pensamos, sentimos e fazemos. É incompleto o nosso ser e não nos sentimos bem quando vivenciamos uma só destas vertentes descuidando as outras duas. O que pensamos afeta os nossos sentimentos e a nossa ação; o que fazemos influencia o que pensamos e sentimos; o que sentimos afeta o nosso pensamento e a nossa ação.

Sentimo-nos frustrados, ansiosos e desassossegados quando pensamos e construímos castelos no ar e não na terra, ou seja, quando pensamos e programamos obras que nunca veem a luz do sol. Também nos sentimos mal quando fazemos as coisas sem pensar e nos saem mal no fim. Por fim, também nos sentimos mal quando, ao acionar os nossos projetos, não temos em conta os nossos sentimentos nem os sentimentos dos outros, reprimindo-os ou ignorando-os.

Proativo ou reativo
Palavra fora da boca é pedra fora da mão.

Embora não gostemos de admitir, a natureza animal em nós não desapareceu, apesar dos mais de 5 milhões de anos de evolução que existem entre nós e o primata que nos deu origem. Do mesmo modo, a formação do neocórtex humano não anulou o cérebro límbico ou emocional dos mamíferos e este não anulou o primeiro cérebro, o reptiliano.

Tal como estes três cérebros funcionam em uníssono, um dentro do outro, também a natureza animal, desde o primeiro microrganismo que apareceu no planeta até aos nossos antepassados primatas, está assimilada na nossa natureza humana atual por um fenómeno que Konrad Lorenz chama de tradição -o que uma geração aprende, passa para a próxima e assim sucessivamente.

Konrad Lorenz fundou uma ciência, a Etologia, que estuda o comportamento dos animais e a sua completa correspondência ou transposição para os seres humanos. De facto, desde as experiências de Pavlov com cães, os psicólogos comportamentais estudam ratos ou pombas, como fez Skinner, e aplicam as suas descobertas aos humanos.

Como indica o provérbio acima indicado, falamos sem pensar e acabamos por ferir alguém; muito do nosso comportamento ou ação não é proativo ou reflexivo, mas instintivo, automático, rápido e reativo como o comportamento animal. 

A tríade que devia começar com o pensamento seguido do sentimento e ação, começa no sentimento seguido de ação e só no fim surge o pensamento. Às vezes a ação é a primeira, seguida da emoção e do pensamento. O nosso comportamento é tridimensional porque sempre envolve pensar, sentir e agir. Dependendo da situação, o pensamento pode não vir em primeiro lugar, porém quer comece na ação, quer comece no sentimento, todos os três são sempre protagonistas.

O nosso cérebro reptílico é rápido; o límbico não tão rápido como o reptiliano, processa os dados com relativa rapidez; o neocórtex é extremamente lento e possui uma característica que os outros dois não possuem e que o torna ainda mais lento - duvida de si mesmo e da veracidade dos primeiros pensamentos ou soluções para um determinado problema. Os outros dois cérebros nunca têm dúvidas, estão sempre certos.

Por fim, antes de entrarmos nos meandros do pensamento, convém notar que a natureza animal nunca é anulada pelo pensamento reflexivo. Continua ali, embora nem sempre esteja presente a nível consciente, dependendo da natureza do problema ou do tema sobre o qual se debruça a nossa mente. Contudo, a nível das motivações profundas do nosso pensar ou agir, é omnipresente.

Pensar
Pensar é o primeiro ato da sequência pensar – sentir – agir. Todos os atos autêntica e genuinamente humanos provêm ou devem provir do pensamento discursivo e reflexivo, algo exclusivo do ser humano. Nenhum animal tem esta capacidade, por mais próximo de nós que esteja na evolução das espécies.

Pensamento e linguagem
A linguagem não se desenvolveu primeiramente como um meio de comunicação, mas sim como um modo de formar conceitos. Noam Chomsky

Qual dos dois apareceu primeiro, a linguagem ou o pensamento, é uma questão de primazia do ovo sobre a galinha ou da galinha sobre o ovo. Um pensamento sem o uso da linguagem seria ininteligível. Mas, é provável que o pensamento tenha existido antes da linguagem e que esta, como diz Chomsky, não tenha surgido primeiramente como forma de comunicação entre indivíduos, mas sim como instrumento para a formação de conceitos.

Uma prova disto pode ser o alfabeto chinês que ainda é pictórico, ou seja, cada símbolo representa um conceito, muito mais que uma letra, palavra ou frase construída pelo nosso alfabeto latino. Uma outra prova pode ser as palavras onomatopaicas, que são palavras ou conceitos que surgem da reprodução de ruídos ou sons naturais. Neste caso, o conceito e a palavra formam-se da relação da pessoa com a natureza, ou seja, do esforço de compreender e conceptualizar o observado e não como forma de comunicar com os outros seres humanos.

Por outro lado, a inteligência e a linguagem, podem definir-se da mesma forma. Se a inteligência se define como a relação entre neurónios que podem estar em partes diametralmente opostas do cérebro, a linguagem define-se pela relação entre conceitos que podem aparentemente não ter nenhuma relação entre si. 

Por conseguinte e contrariamente ao que se pensava, as crianças poliglotas são mais inteligentes que as que aprendem só uma língua. A criança pode aprender ao mesmo tempo várias línguas e falar indistintamente cada uma delas sem se confundir.

Dar uma cana ou ensinar a pescar?
A educação básica e secundária e, em muitos casos, até a universitária são muito pouco críticas. Baseiam-se na aquisição de conhecimentos, em encher de uma forma acrítica o saco da memória que depois se despeja num exame para obter um diploma. Em seguida, tudo é esquecido e já não faz parte da nossa vida. É a isto que chamo “dar um peixe” em vez de espevitar a criatividade que seria ensinar a pensar; dar os elementos suficientes para depois a criança, o adolescente ou o jovem adulto descobrir por si mesmo.

Nisto se baseava a maiêutica de Sócrates - o professor é um facilitador e, como tal, não deve de maneira paternalista dar comida mastigada ao aluno que se limita a engolir. No mesmo princípio se baseia a psicoterapia não diretiva: o psicoterapeuta ajuda o cliente ou paciente a descobrir o que se passa com ele. É muito mais eficaz quando o cliente descobre com a ajuda de perguntas exploratórias por parte do psicoterapeuta, do que se fosse o psicoterapeuta a descobrir o problema e a solucioná-lo bombardeando o cliente com conselhos. O que nós descobrimos é nosso, o que outros descobrem por nós não é nosso, mesmo que nos envolva. A mesma técnica a aplicou o popular pedagogo Paulo Freire na sua ação social de alfabetização.

Por outro lado, em relação aos afetos e sentimentos, a educação pretende ser completamente assética, como se estes fossem vírus subversores do sistema. Educa-se para uma profissão, não para a vida; é mais importante a inteligência abstrata literária e matemática que a inteligência emocional. Os afetos estão proibidos, pois o que se pretende enfatizar é a frivolidade, a competência, o egoísmo e o individualismo, não a solidariedade.  

O âmbito cognitivo do nosso comportamento e da nossa vida
Quando estamos a funcionar no âmbito cognitivo, deixamos de olhar para o mundo e voltamos o olhar para dentro. O mundo está agora dentro de nós, de uma maneira simbólica e cognitiva, sob a forma de conceptualizações. Passa a contar menos o contexto, a existência dos objetos, e mais a sua essência. Esta é a nossa forma de dominar a realidade que nos rodeia, ou seja, de conhecer. Eis algumas das funções ou operações da nossa mente ou pensamento, e como as define o dicionário. 
  • Analisar – Separar um todo nas suas partes ou componentes, para as estudar individualmente e assim poder compreender melhor a sua função ou relação com o todo. Investigar, examinar minuciosamente, esquadrinhar, dissecar.
  • Relacionar - Comparar coisas novas com outras já conhecidas para estabelecer a diferença entre umas e outras. É o mesmo que comparar: quando algo novo se apresenta à nossa mente, procuramos algo já conhecido e parecido, que tenha pontos em comum, e só depois procuramos as divergências.
  • Experimentar – Submeter a uma experiência, a um teste prático e real para, pela reação obtida, a conhecer melhor.
  • Deduzir - concluir, inferir, chegar a uma conclusão lógica a partir de uma experiência feita, ou depois de um processo de raciocínio lógico, como um silogismo.
  • Imaginar – Formar uma imagem mental abstrata de algo que não está presente no momento. É muito importante para podermos criar, descobrir, idealizar, inventar, estabelecer uma hipótese.
  • Conceptualizar – Formar um conceito acerca de uma coisa ou realidade; é o mesmo ato de conhecer, é arquivar essa coisa ou realidade sob de um título ou nome no nosso arquivo mental. Definir a identidade de uma coisa, julgar, avaliar.
  • Sistematizar - Organizar diversos elementos num sistema, ou seja, reduzir (factos, conceitos, opiniões, etc.) a um corpo de doutrina e formalizar uma teoria.
Pensar – Sentir - Agir
Quando partimos do zero, ou seja, quando se trata de realizar um projeto, esta será a tríade usada: do pensamento ao sentimento e depois à ação. Existem, porém, outras situações onde esta mesma tríade acontece de uma forma inconsciente. Muitas vezes, os nossos pensamentos, as nossas crenças provocam sentimentos sem nos darmos conta.

Por exemplo, se acredito (pensamento) que o meu chefe não me valoriza como deveria, como acho que mereço, começo a sentir-me mal (sentimento), e se vejo que o meu chefe valoriza a outros, posso sentir inveja (sentimento); e se, no meu entender, estes outros merecem menos que eu, posso chegar a sentir raiva (sentimento). Tudo isto pode fazer com que eu seja mais competitivo (ação) ou desleixado, desmotivado e fazer ainda menos (ação).

A terapia cognitiva, como adiante veremos, baseia-se nesta tríade. Há certas crenças irracionais ou falsas que provocam sentimentos e ações indesejáveis. Se eu modificar a crença, esses sentimentos deixam de se fazer sentir, assim como as ações por eles motivadas.

Sentir
Tomamos as decisões a nível emocional e depois justificamo-las a nível racional.
Daniel Kahneman psicólogo israelita e Prémio Nobel da Economia 2002

Ao falar das nossas emoções e sentimentos, não estamos a falar exclusivamente do cérebro límbico. Como dissemos, os três cérebros atuam em uníssono, ou seja, não vamos falar das emoções dos mamíferos, mas sim das emoções humanas tal como o neocórtex as entende. Porque um mamífero, mesmo um primata, não está consciente do que sente, ou seja, não sabe que está a sentir ira, medo, fome ou sono ou o que quer que seja, apenas sente.

É o nosso pensamento que atribui o sentido às nossas emoções, que as decifra e entende. Tal pressupõe que temos mais controlo sobre as nossas emoções do que achamos ter, pois é a nossa mente que as conceptualiza. Isto não só torna possível a terapia cognitiva como nos permite dominar as nossas emoções. Isto significa que podemos ter não só uma inteligência abstrata como descrevemos, mas também uma inteligência emocional. Ou seja, podemos aproveitar, tirar partido e utilizar as nossas emoções em favor da vida e não nos deixarmos dominar por elas, como acontece na depressão, quando perdemos o controlo pela ira ou qualquer outra paixão.

É certo que não somos responsáveis pelas nossas emoções, pelo que sentimos, mas somos responsáveis pelo que fazemos com elas. Assim sendo, se nos sentimos insatisfeitos ou até aborrecidos com o nosso desempenho, com os nossos sentimentos ou pensamentos, com o nosso comportamento em geral, só nós podemos mudar essa situação e ninguém mais.

Antes de abordarmos as emoções, convém ter uma noção clara do que estamos a falar. Alguns autores mencionam, muitas vezes no mesmo texto, a palavra emoção e sentimento, entendendo-as como sinónimos; outros fazem uma distinção entre emoção e sentimento entendendo emoção como sinonimo de instinto.

Instinto e emoção
O instinto é mais primitivo e provém do cérebro reptiliano, embora se manifeste nas emoções; ou seja, pelas emoções, posso saber de que instinto se trata. Por exemplo, o cérebro reptiliano tem três comportamentos: lutar, fugir ou esconder-se. Perante a invasão do território, ou perante o perigo de vida, o animal julga o invasor pelo tamanho. Se é maior que ele, sente medo e foge, imobiliza-se ou esconde-se; se é inferior a ele em tamanho, sente raiva e ataca.

A emoção, neste sentido, é a manifestação de um instinto, é o modo como o instinto se faz presente e age. Por exemplo, no caso do instinto sexual, a emoção seria a atração sexual ou a paixão; no sentimento seria o amor.

No contexto da comunicação não violenta, onde emoções e sentimentos são sinónimos, aprendemos que cada sentimento ou emoção está intimamente relacionado com uma necessidade, ou seja, com um instinto. Por outro lado, todos os sentimentos ou emoções são positivos ou negativos - se a necessidade à qual determinado sentimento se refere está satisfeita, o sentimento será positivo; se não está satisfeita, será negativo. No contexto do estímulo - resposta, o instinto é a necessidade, o estímulo ou emoção é a resposta a essa necessidade.

Emoção e sentimento
As sensações ou emoções são inatas, mas os sentimentos são construídos a cada momento pela mente. As sensações e emoções têm mais a ver com o corpo, os sentimentos como o amor têm mais a ver com a mente.

A emoção é uma reação a um estímulo ambiental e provoca um movimento, uma série de reações em cadeia - altera o ritmo cardíaco e respiratório, a pressão arterial, o sistema endócrino com segregação de hormonas, o sistema imunológico, dores inexplicáveis, choro, etc.

As emoções são intrínseca e essencialmente físicas, os sentimentos que as mesmas originam podem existir de forma independente, sem o suporte do corpo físico e praticamente sem nenhuma manifestação física; como exemplo, podemos referir a vaidade, o egoísmo, a inveja.

A emoção da euforia corresponde ao sentimento da alegria, a emoção do choro ao sentimento da tristeza, a emoção do pânico ao sentimento do medo, a emoção da raiva ao sentimento do ódio, a emoção da paixão ao sentimento do amor. O sentimento é uma emoção iluminada pela mente ou, se quisermos, a humanização de uma emoção. Os animais têm emoções, mas não têm sentimentos.

Inteligência emocional
Emoções fora de controlo tornam estúpidas as pessoas espertas.A inteligência emocional representa 80% do êxito na vida. Daniel Goleman

O pensar racional e abstrato é o mais indicado para nos relacionarmos com as coisas materiais, para as conhecermos e dominarmos. É o tipo de pensamento de que a ciência precisa. Por outro lado, precisamos da inteligência emocional para a arte, para as relações humanas e para a relação que estabelecemos connosco mesmos.

É a inteligência emocional e não o raciocínio abstrato ou matemático que determina as ações e as decisões mais importantes na nossa vida. Determina o êxito ou o fracasso das relações humanas e muitas vezes também das relações profissionais, uma vez que não há profissão que não envolva relações humanas.

Na nossa profissão, no interior das associações, instituições, fábricas e empresas, as aptidões técnicas representam apenas um fator. É muitas vezes a inteligência emocional que sustenta a matéria prima destas empresas que são os seus funcionários. A inteligência emocional aplica-se a quem lidera e a quem é liderado, a quem coordena o trabalho em equipa tão importante nas empresas modernas.

É a inteligência emocional que governa a quase totalidade dos atos da nossa vida diária; possuí-la é garantia de felicidade, não a possuir é certeza de fracasso, como afirma Daniel Goleman, o autor do livro “A inteligência emocional” (o mais vendido do ano de 1996). Neste livro, o autor diz-nos que é possível criar uma interação equilibrada e harmoniosa entre o cérebro racional e o emocional e ensina-nos a desenvolver essa inteligência emocional.

É a inteligência emocional que nos ajuda a conhecer e a dar um nome aos nossos sentimentos. A maior parte de nós é emocionalmente iletrada: se nos perguntam como nos sentimos, dizemos “bem”, mas não conseguimos identificar mais de quatro ou cinco sentimentos, quando na verdade existem dezenas deles, como vimos no nosso estudo da comunicação não violenta.

Depois de identificar os nossos próprios sentimentos, devemos tentar identificar os sentimentos dos outros, pois só desta forma a empatia é possível e, com ela, uma relação harmoniosa e construtiva com os outros. 

Terapia cognitiva
De acordo com a teoria que fundamenta a terapia cognitiva, fundada por Aaron Beck, as emoções e comportamentos são causados pelo diálogo interno que mantemos connosco mesmos. Na base deste diálogo estão pensamentos, pressupostos, crenças e muitas destas crenças são falsas ou irracionais.

O fundador da terapia cognitiva entende que basta desafiar essas crenças, esses pensamentos equivocados e falsos chamadas “distorções cognitivas" e confrontá-los com a razão, para que desapareçam as emoções que eles provocam, assim como as ações neles radicadas.  A terapia cognitiva foi comprovada como eficaz por estudos empíricos.

O princípio é simples e no fundo diz respeito a um conceito muito anterior a Beck e muito conhecido por nós, religiosos: o conceito de conversão que em grego é metanoia, ou seja, mudança de mente. Geralmente, quando a pessoa diz que mudou de ideias, está a dizer que mudou também de comportamento e que tomou outras decisões contrárias às que tinha tomado antes.

Sentir - Pensar - Agir
Segundo alguns estudos atuais e como também afirma Daniel Kahneman, somos seres mais emocionais que racionais, por muito que o neocórtex tenha mais do dobro do tamanho do cérebro límbico. Fundamentalmente, somos seres emocionais que depois recorrem à razão para justificar, explicar ou sancionar e validar os sentimentos.

Num sentido positivo, o que fazemos assemelha-se muito ao mecanismo de defesa descrito na fábula da raposa e das uvas. A raposa vê as uvas e deseja-as (sentimento), decide apanhá-las (pensamento), começa a saltar mas não consegue apanhá-las e sente-se frustrada (sentimento). Para se livrar deste sentimento negativo, declara as uvas como verdes, racionalizando o sentimento (pensamento).

O cérebro emocional é muito mais rápido que o racional, pelo que a primeira reação a tudo o que os nossos sentidos captam é uma reação emocional e não uma reação racional; tudo o que os nossos cinco sentidos captam provoca sentimentos muito antes de provocar pensamentos.

Uma mãe que procure uma escola para o seu filho e visite uma onde veja sujidade e desorganização,
 já nem se preocupará em saber se o desempenho dessa escola no contexto das outras é bom ou mau: decidirá de imediato que o seu filho não vai estudar ali.

Agir
De boas intenções está o inferno cheio

Por fim, estamos no âmbito pragmático do comportamento humano tridimensional. Como vimos em relação aos três cérebros e às três personalidades básicas, há pessoas mais cerebrais, que vivem confortavelmente instaladas na “sala de cima”, com muito pouco contacto com a realidade.

Também há pessoas para quem o mais importante são as relações humanas e por isso vivem no meio da sociedade e fogem a estar sozinhas e até mesmo a estar com elas mesmas. Por fim, há pessoas para quem o fazer é o mais importante, vivem no meio da ação e estão sempre a fazer algo de prático, utilizando mais os pensamentos que as emoções. São pessoas enérgicas, aprendem fazendo e estão sempre envolvidas em algum projeto. Quando não estão envolvidas num projeto ou não têm nada que fazer, podem entrar em depressão.

O “cogito ergo sum” vai mudando de face, dependendo da personalidade básica a que diga respeito: para os cerebrais aplica-se “penso logo existo”, para os emocionais aplica-se “sinto logo existo”, para os viscerais, “faço logo existo”.

No crepúsculo das nossas vidas, seremos recordados, não pelo que pensámos nem pelo que sentimos nem pelo que dissemos, mas pelo que fizemos. O capítulo 25 do evangelho de São Mateus diz que seremos julgados pelos atos de amor que realizámos ou não realizamos ao longo da nossa vida, (Mateus 25).

A comunicação não violenta ensinou-nos que o amor, mais que um sentimento, é uma necessidade: todos os seres humanos necessitam de amar e ser amados. A importância de um homem mede-se certamente pelas suas obras, mas é igualmente importante o pensar e o sentir por detrás das obras. Somos o que pensamos, sentimos e fazemos.

Podemos dedicar-nos apenas a pensar, ser intelectuais e até vivermos afastados dos outros. No entanto, serão sempre as nossas obras que nos salvam e que justificam a nossa vida, através da investigação científica, da criação da tecnologia que nos facilita a vida ou da produção de literatura que deleita e ensina.

Também podemos ser emocionais e escrever poesia, dedicarmo-nos às artes, à música ou a estabelecer harmonia e paz entres as pessoas. Serão também as nossas obras, a forma como materializamos os nossos sentimentos que darão valor à nossa vida perante nós mesmos e perante os outros.

E por fim, para os pragmáticos, para os que vivem no meio da ação, se esta não for bem pensada, iluminada pela razão e orientada pelos sentimentos, de nada serve.

Ainda que eu fale as línguas dos homens e dos anjos, se não tiver amor, sou como um bronze que soa ou um címbalo que retine. Ainda que eu tenha o dom da profecia e conheça todos os mistérios e toda a ciência, ainda que eu tenha tão grande fé que transporte montanhas, se não tiver amor, nada sou. Ainda que eu distribua todos os meus bens e entregue o meu corpo para ser queimado, se não tiver amor, de nada me aproveita. 1 Coríntios 13, 1-3

Agir - Sentir - Pensar
Esta é a tríade menos conhecida no sentido positivo, mas muito popular e muito frequente no sentido negativo. “Colocar o carro diante dos bois” - a ação antecipa-se ao pensamento e ao sentimento. Já nos avisava o poeta popular António Aleixo na sua famosa quadra: “para não fazeres ofensas e/teres dias felizes, não digas tudo o que pensas/pensa em tudo o que dizes”.

No sentido negativo, quando uma ação é irrefletida e não sentida vai fazer-nos sentir mal connosco mesmos e com os outros e pode até levar-nos a tirar conclusões falsas sobre nós mesmos e os outros. Por que não usar este mecanismo no sentido positivo?

Suponho que esta é a base da terapia que advém do condutismo ou behaviorismo. Em vez de lidar com as atitudes estudando a sua raiz psicanalítica e nunca chegarmos a ser o que pretendemos ser, a terapia behaviorista defende que praticando um conjunto de atos repetidamente, estes acabarão por criar a atitude desejada.

Amy Cuddy da Universidade de Harvard defende que se exibirmos uma atitude de poder, segurança e liderança mesmo sentindo-nos inseguros, acabaremos por ser e sentir o que a nossa postura física ou linguagem corporal mostra. Segundo ela, as nossas posturas corporais afetam os níveis hormonais, neste caso sobe a testosterona, e fazem-nos sentir mais seguros. Como afirmou uma vez numa conferência, “fake it until you become it” ou “finge até de facto te tornares naquilo que agora só finges ser”.

Muitos atores de teatro e de cinema aludem a este fenómeno: depois de desempenharem um papel durante muito tempo, tiveram sérios problemas para se descondicionarem dele. As nossas ações e a nossa forma de comunicar podem mudar os nossos pensamentos e os nossos sentimentos. Suponho que as hospedeiras de bordo que no desempenho da sua profissão devem sorrir sempre, mesmo estando a chorar por dentro, se tornam em pessoas mais positivas e otimistas a longo prazo.

A expressão inglesa “count your blessings” exorta-nos a enumerarmos todas as bênçãos que recebemos em vez de contarmos as desgraças. Mais explícito ainda nesta terapia positiva para exorcizar a nossa negatividade, temos o provérbio castelhano, “Al mal tiempo buena cara”, ou seja, sorri à vida, insiste, persiste e não desistas até que a vida te sorria a ti.
Pe. Jorge Amaro, IMC