15 de abril de 2020

3 Tipos de personalidade: Cerebral - Emocional - Visceral

Sem comentários:
Antes de falar das três personalidades básicas do ser humano, precisamos recordar que não é mera coincidência o facto de o cérebro humano, como vimos anteriormente, também ser composto por três partes. De facto, como veremos, existe uma conexão íntima entre cada uma das três partes do cérebro humano, e cada uma das três personalidades básicas.

Três cérebros, três personalidades
Referimos anteriormente que o nosso cérebro é uno e trino, ou seja, são três em um e um em três, como as bonecas russas chamadas matrioskas. O cérebro reptiliano ou instintivo é o mais antigo, sendo comum a todos os vertebrados; sobre este ou em redor deste formou-se e cresceu o nosso segundo cérebro, com a evolução dos répteis aos mamíferos: o cérebro mamífero, límbico ou emocional, comum a todos os mamíferos e primatas anteriores ao ser humano na evolução das espécies.

Por fim, na passagem dos mamíferos aos primatas e destes ao ser humano, formou-se à volta do cérebro límbico o maior e mais volumoso neocórtex, o cérebro racional. Este apenas está presente no ser humano e em alguns primatas superiores, embora não tão desenvolvido como no ser humano.

No processo de aquisição de informação, os três cérebros funcionam harmoniosamente. Captamos a realidade por intermédio do nosso cérebro reptiliano, pois ele é o responsável pelo bom funcionamento de todo o organismo, pelas nossas perceções e pelos nossos cinco sentidos.

O que percecionamos através dos nossos cinco sentidos evoca emoções muito antes de evocar pensamentos. A primeira leitura interpretativa do que percecionamos da realidade é-nos dada pelo nosso cérebro límbico ou emocional, ou seja, o que vemos, ouvimos, cheiramos, tocamos ou provamos evoca primeiro emoções ou sentimentos e só depois pensamentos, memórias ou experiências.

Eventualmente, depois de uma primeira interpretação por parte do nosso cérebro límbico, é a vez do neocórtex dar também o seu parecer e processar a informação, comparando-a com experiências passadas, posicionando-se perante o tema em questão e eventualmente decidindo ou não uma ação.

A coordenação e harmonia que existem na recoleção de dados e na interpretação dos mesmos pelos três cérebros parecem não existir na hora de aplicar a informação recebida ao mundo circundante e aos outros. O ideal seria que uma pessoa reagisse instintivamente quando a situação requer uma reação instintiva, como acontece quando  há a perceção de perigo, emocionalmente quando a situação requer uma resposta emotiva, como por exemplo sensibilizar-se por alguém que precisa de ajuda e ajudar essa pessoa, ou racionalmente quando se trata de resolver um problema.

Na realidade, não é isto que acontece. Agimos instintivamente perante um problema racional; agimos de forma racional e fria quando devíamos mostrar compaixão; e agimos de forma instintiva e impulsiva como se estivéssemos em perigo, quando de facto não estamos. Deveríamos antes usar a razão e pensar antes de falar ou agir.

Pela educação e por certas tendências inatas, algumas pessoas são mais propensas a usarem em primeiro lugar um dos cérebros em detrimento dos outros dois. Usando uma linguagem genética, no comportamento do dia a dia, um dos cérebros é dominante, um outro é recessivo e o terceiro é quase inexistente. Por outras palavras, um é o principal, outro secundário e o terceiro negligenciado, pouco operativo ou pouco usado.

Pessoas cerebrais
A sua personalidade é governada predominantemente pela razão. Aqueles que conduzem as suas vidas principalmente pelo processo do raciocínio negligenciam as emoções e os instintos, ou seja, não estão realmente em contacto consigo mesmos, vivem no mundo das ideias e dos conceitos como se estivessem na caverna de Platão. Têm medo das emoções e não confiam nos seus instintos por os considerarem intangíveis e irracionais; o que não é claro racionalmente, não existe.

A predominância da inteligência racional faz com que estas pessoas se foquem na observação, na análise e precisem de pensar muito antes tomar decisões. Muitos deles são introvertidos (tendo dificuldade em falar e expressar os seus sentimentos) e preferem interagir mais com o mundo das ideias do que com as pessoas. Têm a sensação de não serem capazes de lidar com situações imprevisíveis e são muito lentos nas suas reações, parecendo apáticos, amorfos e distantes.

Por tudo isto, porque vivem na sua cabeça e estão dissociadas ou divorciadas tanto do seu cérebro límbico como do seu cérebro reptiliano, são pessoas muito pouco intuitivas, desconectadas da realidade interior e exterior. Os intelectuais e os cientistas são grandes analistas e especialistas nos distintos ramos da ciência e do saber, porque a sua fonte de conhecimento preferida é a lógico-dedutiva.

Tal como os instintivos, os racionais também são muito observadores. Ao contrário dos viscerais, que gostam de observar as outras pessoas, os racionais gostam mais de observar a natureza e os factos. Gostam de entender os mecanismos por detrás das coisas, gostam de saber a motivação lógica dos factos, gostam de saber e entender como e por quê as coisas acontecem, ou seja, a razão das coisas.

Por isso podem ser bons em praticamente qualquer coisa que desperte o seu interesse. São organizados, metódicos, determinados e inteligentes para se dedicarem a qualquer matéria que capte o seu interesse.

É aos cerebrais especialistas que se aplica o dito “sabem cada vez mais de cada vez menos”. Perdidos no detalhe que analisam até à saciedade, perdem a visão de conjunto, pelo que são pouco ecléticos, podendo até ser arrogantes, intolerantes e sobranceiros.

São lúcidos, congruentes, clarividentes e lógicos; falam com eloquência e possuem um pensamento veloz; gostam de debater e discutir, são hábeis políticos com grande capacidade de convencer os outros em relação às suas causas. Quando um racional consegue chegar a uma conclusão lógica final, dificilmente está errado, pois ser correto e lógico é um dos seus princípios.

Muito parecidos com os instintivos ou ainda piores que eles, o grande ponto fraco do racional é a sua baixa sociabilidade. O racional tem uma tendência natural para ser autossuficiente, não cultiva as relações com as outras pessoas e isola-se. Também se concentra mais na absorção e análise de ideias do que na ação. Por isso mesmo, é um eterno indeciso, duvida de tudo e de todos, o que faz com que seja indolente e inativo.

Le cœur a ses raisons que la raison ne connaît point – Esta afirmação de Pascal foi proferida no contexto da religião. De entre os três tipos de personalidade, os que sentem mais dificuldade em ser crentes são precisamente os racionais ou cerebrais, pois a fé está mais ligada à realidade da vida captada pelo cérebro reptiliano ou às emoções ou ao  coração, campo do cérebro límbico, estando menos ligada à razão por não poder ser racional. Tenho para mim que os grandes ateus e agnósticos -  Feuerbach, Karl Marx, Freud e Nietzsche - eram todos cerebrais e racionais.

A fé é para pessoas ignorantes – Para os cerebrais só existe o que é captado pelos cinco sentidos e discernível pela razão. Não há realidade para além disto. São capazes de fazer afirmações materialistas e simplistas, como a de um famoso cirurgião que afirmou ter operado todas as partes do corpo humano e nunca ter encontrado a alma; ou como o primeiro cosmonauta russo que, ao voltar da primeira viagem ao espaço, disse que não tinha visto lá Deus.

A fé é um obséquio razoável: não podendo ser racional pois não é matéria da ciência, também não pode nem deve ser irracional ou supersticiosa; tem de ser razoável, ou seja, plausível, humanamente credível. Os racionalistas não conseguem compreender que se Deus existe e é criador de tudo e de todos, é também criador da razão humana. Assim, a criatura não pode nunca chegar a conhecer totalmente o seu criador, como a parte nunca pode entender o todo.

Não consigo acreditar – É outra atitude típica dos cerebrais; como sabemos em psicologia, quando alguém diz “não consigo” o que verdadeiramente quer dizer é “não quero”. Assim sendo, o que verdadeiramente estão a dizer é “eu não quero acreditar”. Quando um fumador nos diz, “eu não consigo deixar de fumar”, devemos perguntar-lhe “deixar de fumar é impossível?”. Ele dirá que não, que é possível. Então podemos rematar “não digas que não consegues deixar de fumar, mas sim que não queres deixar de fumar, pois como diz o povo querer é poder”.

O agnóstico ou ateu não quer descer da torre da razão, que entende como única forma de conhecer. Como nega a espiritualidade em todas as suas formas, tem a tendência para ser uma pessoa materialista e até para idolatrar algumas realidades materiais. No fundo, mais que materialista ou ateu, acaba por ser politeísta.

Por causa do medo e do orgulho em relação ao mundo emocional e instintivo, os racionais ficam de fora de muitas realidades da vida. São racionais, mas não são razoáveis. Os intelectuais podem chegar a ser maçadores, aborrecidos, monocromáticos e deprimentes. A vida instintiva e emocional pode ser motivo de grandes tristezas e riscos, mas também é o único veículo da alegria e felicidade.

Pessoas emocionais
Os emocionais funcionam a partir do cérebro límbico e consideram-se mais humanos que os cerebrais, que apelidam negativamente de intelectuais, frios e distantes; os instintivos são considerados desumanos e cruéis. Os emocionais acham orgulhosamente que só eles são autenticamente humanos, só eles sentem e são capazes de sentir verdadeiramente e acham que ninguém os entende.

Viver é amar, dizem com razão, e quem não ama não sabe o que é a vida nem o que é Deus, pois até Deus é amor. Para uma pessoa racional é importante responder à pergunta porque vivo eu? Para uma pessoa emocional é mais importante responder para quem vivo eu.

As pessoas nas quais predomina a inteligência emocional estão mais focadas nas relações humanas que estabelecem com as outras pessoas e fazem delas o centro das suas vidas. Por isso, quando surgem conflitos nesta área, nada é mais importante que a resolução desses conflitos. Os emocionais tendem a preocupar-se com a sua imagem para obter a aprovação dos outros, evitar as críticas e mostrar que são especiais.

Com a comunicação não violenta, aprendemos que as emoções são positivas ou negativas e que estão intimamente relacionadas com necessidades satisfeitas, quando são positivas, e com necessidades insatisfeitas, quando são negativas. Também aprendemos que não é possível sentir um mesmo sentimento por mais de 40 segundos; com estes dois dados da comunicação não violenta, podemos concluir que o emocional é o menos estável dos três caracteres, vivendo numa contínua montanha russa de altos e baixos que pode criar um maníaco depressivo - um momento está eufórico, no momento seguinte sente-se deprimido.

Por um lado, é verdade que a vida humana é composta por altos e baixos. De facto, tanto a eletrocardiograma como o eletroencefalograma, que graficamente são representados por linhas com altos e baixos, indicam que uma pessoa está viva. Se um ou outro começar a apresentar menos altos e baixos, indicará que a vida está a esvair-se; uma linha contínua sem oscilações assinala que a vida se extinguiu. Assim é a vida física e assim é, de alguma forma, a vida emocional. Mas se a parte emocional não consegue uma certa constância e autodomínio, a vida da pessoa e dos que lhe são próximos transforma-se um inferno.

A constância é o meio termo anímico entre os altos e os baixos que permite ao emocional não perder a cabeça quando está eufórico, quando tudo parece correr bem, e não se desesperar quando está no fundo do poço, quando tudo parece correr mal. O emocional deve aprender animicamente, não só intelectualmente, o que o provérbio diz “não há mal que sempre dure nem bem que sempre ature” - a vida pode ser um céu e um inferno, mas nem o céu nem o inferno são definitivos, mas sim passageiros.

Os sentimentais necessitam do intelecto para dominar as emoções e não serem dominados por elas. As emoções dizem mais de nós, da nossa identidade, que os pensamentos. Mas não devem ser elas a governar a nossa vida. Ninguém é responsável por aquilo que sente, não somos donos das nossas emoções, mas somos responsáveis por aquilo que fazemos com elas. Elas mostram o caminho a seguir, mas somos nós e o nosso intelecto que decidimos ou não tomar esse caminho.

As decisões puramente emocionais induzem muitas vezes a pessoa em erro. Não devemos decidir nada sob a influência de uma emoção muito forte como o amor, a ira, o ressentimento, sendo aconselhável até que a emoção passe. Nesse estado emotivo, a razão da pessoa fica anulada, como se estivesse bêbada não sabe o que faz nem o que diz, está fora de si.

Caindo em si… (Lucas 15,7) - A parábola do filho pródigo alude precisamente a esta situação de tomar decisões a quente, sob a influência de alguma paixão. Tudo o que o filho pródigo fez, desde a sua decisão de pedir a herança ao pai até gastá-la, foi feito inconscientemente sob o domínio de uma ou várias paixões. Quando caiu em si, voltou a si, teve consciência da sua situação.

As emoções definem melhor uma pessoa que os seus sentimentos. Por isso, são o que há de mais autêntico em nós. No entanto, embora isto pareça contraditório, as emoções podem também divorciar-nos de nós mesmos, fazer-nos ficar fora de nós mesmos, abandonar a nossa identidade, quando estamos sob o seu domínio.

As pessoas emocionais são altamente sensíveis. Segundo os estudos, uma em cada cinco pessoas ou entre 15 a 20% da população, são pessoas sensíveis ou emocionais. Embora no mundo ocidental se considere culturalmente que as mulheres são mais emocionais que os homens, na realidade não parece ser assim. Há igual número de homens e mulheres emocionais, apesar de a educação ser diferente para homens e mulheres.

As pessoas emocionais são pessoas empáticas, porque entendem bem o seu mundo interior, e porque são altamente sensíveis. Facilmente se colocam no lugar do outro, conseguem ver e sentir as coisas sob o seu ponto de vista. A empatia é uma das qualidades mais importantes do ser humano; sem ela não haveria qualquer possibilidade de entendimento entres os seres humanos.

Os emocionais são certamente mais intuitivos que os cerebrais, pois o seu centro - o cérebro límbico - comunica com o cérebro reptiliano; filogeneticamente, a emoção está mais perto do instinto que do pensamento. A intuição é usada para as relações sociais, mais que para as descobertas científicas ou materiais. Nas pessoas emocionais, a intuição está ao serviço da empatia, de perscrutar o outro e sintonizar-se com ele. Por causa desta sintonização conatural, os emocionais são pessoas muito humanas e educadas.

A enorme sensibilidade nem sempre joga a seu favor. De facto, os emocionais também são sensíveis às críticas, têm pouca capacidade para as suportar e continuar a funcionar. Por exemplo, os instintivos têm a atitude de “os cães ladram e a caravana passa”, não se importam com o que os outros possam pensar deles. Os emocionais, como querem ser populares, associar-se, relacionar-se com toda a gente, buscam o apreço dos outros e não toleram as suas críticas. Isto leva-os a usar técnicas para minimizar as probabilidades de serem criticados, o que faz com que sejam menos genuínos e até mesmo seletivos nas suas relações sociais, evitando a companhia dos que podem criticá-los.

Os emocionais são pessoas intensas que vivem com intensidade as suas paixões. Por isso são mais suscetíveis a ansiedade e depressão, como já referimos. Por outro lado, entre os três tipos de personalidade, estes são os que melhor trabalham em equipa porque, em discussões ou diálogos, preferem perder o argumento em vez de perder a pessoa. São os mais sociáveis e dados ao outro, os mais altruístas.

Viscerais e instintivos
As pessoas predominantemente viscerais tendem a serem pessoas impulsivas, pois a sua atenção está sempre voltada para o exterior, para a resolução de tudo. O visceral está sempre em estado de alerta para poder controlar tudo e todos os que o rodeiam.

A energia vital do visceral é a ira ou raiva, que pode aparecer no discurso ou nas atitudes, mesmo nas pessoas que não expressam abertamente a raiva - podem ter um mecanismo para a conter ou não estarem cientes dela, mas ela está lá.

Buscam o poder e são muito críticos com quem o detém relativamente a questões de verdade e justiça ou mesmo em relação à pessoa ser suficientemente forte para manter o poder que tem. Neste sentido, são hábeis em golpes de estado ou em tirar o tapete por baixo dos pés de quem tem o poder injusta ou imerecidamente. Em tudo, lidam com as situações como se fossem sempre uma questão de sobrevivência, de vida ou morte.

Como existe uma correlação entre o cérebro reptiliano e a personalidade instintiva, não é difícil concluir que os instintivos são pessoas de ação. O cérebro dos répteis não pensa nem sente, tem apenas três funções: ataca, foge e imobiliza-se ou esconde-se. Assim, as pessoas instintivas dão mais importância à ação que ao sentimento e ao pensamento.

Sendo as vísceras, o estômago, o instinto, o móbil primário da sua personalidade, como humanos que são, precisam dos outros dois cérebros e, por estranho que pareça, os instintivos tendem a fazer um bypass entre o cérebro instintivo e o neocórtex com o intuito de justificar e iluminar humanamente a sua ação, ficando marginalizada a emoção e o sentimento (o cérebro límbico).

O instintivo precisa do neocórtex, mas não perde muito tempo nele como os cerebrais que dão voltas e voltas a uma questão e, consumidos pela dúvida, nunca chegam a uma decisão; os instintivos pensam, processam o problema, rapidamente chegam a uma conclusão e atuam; frequentemente, a solução vem através da intuição que é a arma mais forte dos instintivos.

Intuição, a arma dos viscerais ou instintivos
A intuição é chegar ao conhecimento e certeza de algo de uma forma rápida, sem a lenta deliberação do pensamento que opera de uma forma lógico-dedutiva. Precisamente porque não é uma conclusão tomada ao fim de um processo intelectual, é difícil defini-la.

A matemática é uma ciência lógico-dedutiva, assim como todas as outras ciências para as quais o conhecimento resulta da observação, experimentação, e interpretação dos resultados. Porém, muitas das descobertas científicas dos nossos dias não seguiram este processo. A máquina a vapor foi uma intuição, bem como a teoria da relatividade de Einstein, para a qual só agora começam a surgir provas empíricas da sua veracidade.

É provável que a intuição seja também um pensamento lógico-dedutivo, mas que segue um processo, mas rápido a nível inconsciente. O consciente capta apenas a solução do problema, sem se aperceber dos passos dados para lá chegar. Pode ainda provir da observação, experiência e interpretação do observador, mas o processo é inconsciente.

Observamos a linguagem corporal de alguém e o nosso inconsciente interpreta e decifra essa linguagem corporal. Rapidamente chegamos a uma conclusão sobre essa pessoa. E como a linguagem corporal é sempre verdadeira, precisamente porque quem a emite não tem consciência dela, a intuição acerta quase sempre.

Os instintivos são bons observadores e nenhum pormenor lhes escapa. Todos os detalhes são vistos, julgados e avaliados até mesmo inconscientemente, acabando por motivar as intuições. Observam a linguagem corporal, o tom de voz, as palavras que os outros escolhem para se expressar - tudo é minuciosamente observado e avaliado.

A intuição assenta na crença de que o universo, em todos os seus aspetos e manifestações, opera obedecendo às mesmas regras e leis. As leis da física observam-se tanto no mundo material como no mundo psicológico ou espiritual; o movimento de um planeta à volta da sua estrela mimetiza o movimento do eletrão à volta do núcleo no interior do átomo; o movimento dos planetas do sistema solar em redor do Sol parece descrever a espiral do ADN, o nosso código genético.

Metáforas, comparações, alegorias, parábolas, analogias operam e são possíveis porque no fundo existe uma correlação entre todos os assuntos, de tal modo que o que acontece numa determinada matéria ou tema pode ajudar-nos a compreender o que acontece numa outra matéria ou tema, aparentemente sem qualquer relação com a primeira.

As pessoas intuitivas possuem um cérebro metafórico; a pessoa mais importante do planeta, Jesus de Nazaré, possuía uma mente metafórica e facilmente encontrava parábolas, alegorias e comparações para explicar realidades abstratas, como o Reino de Deus. Explicou a necessidade da sua morte com o grão de trigo, dizendo que se o grão de trigo não morrer não serve para nada (João 12,24).

A pessoa instintiva ou visceral em vez de operar a partir do neocórtex, tendo em conta os outros dois cérebros, de alguma forma subverte a natureza humana ou ignora a evolução e opera a partir do cérebro reptiliano, usando ou “manipulando” os outros dois, sobretudo o neocórtex ao qual se liga diretamente e utiliza como base de dados para as suas intuições.

Para os instintivos, os cerebrais vivem na lua, os emocionais são umas madalenas, só eles próprios são pragmáticos e operativos, pois têm os pés na terra e fazem com que as coisas aconteçam. O valor de um homem está nas suas obras; a pessoa não vale pelo que sente, diz ou pensa, mas pelo que faz; de boas intenções está o inferno cheio, diz o ditado. Pelos sues frutos os conhecereis diz Jesus.

Como a ação é tudo o que o instintivo valoriza, tende a ser impaciente e impulsivo. Tende a pôr o carro à frente dos bois e, como muita da sua ação não é premeditada nem deliberada, é frequente errar.

Os instintivos são pessoas de ação, têm a mente cheia de projetos e obras que querem ver realizados. Por isso evitam as relações sociais, uma vez que elas suscitam sentimentos e emoções, o que, para um instintivo, é como areia movediça que não consegue controlar e que pode desviá-lo da sua meta. Digamos que o instintivo conhece o amor pelo poder, mas não o poder do amor.

As pessoas que estão em contacto com os seus instintos tendem a ser introvertidas, precisam do silêncio e da solidão para estar em contacto consigo mesmas. Contrariamente ao que muitos pensam, uma pessoa introvertida não é uma pessoa antissocial, tal como o extrovertido não é uma pessoa altruisticamente social.

O extrovertido precisa dos outros para ser ele mesmo, o introvertido não depende dos outros: pode desfrutar da companhia dos outros, mas rapidamente se cansa e precisa de voltar à sua solidão, pois é nela que recupera a sua energia vital e mental e consegue ligar-se a si mesmo.

De entre as três personalidades, os instintivos ou viscerais são os mais raivosos e irados, mas são também os primeiros a perdoar ou a pedir perdão, a virar a página. Repetem para si mesmos e para os outros “águas passadas não movem moinhos”. Os instintivos evitam guardar rancor e ressentimentos, permanecer irados, tristes ou deprimidos, já que isso lhes tira a energia de que precisam para que a sua intuição funcione.

Os três tipos de personalidade e o eneagrama
O eneagrama é a teoria psicológica que mais utiliza e desenvolve esta divisão da personalidade humana em três tipos, que advêm do facto de termos três cérebros relacionados com as três funções básicas da psique humana - o instinto, o sentimento e o pensamento.

No eneagrama, entendemos que existem 3 inteligências: a visceral, que é responsável pelos nossos impulsos e instintos e é gerida pelo cérebro reptiliano, sediada no abdómen (por isso se chama visceral, por se manifestar na região das vísceras); a inteligência emocional, sediada no peito e regida pelo cérebro límbico e que é responsável pelo que sentimos e pelo forma como interpretamos as emoções e, por último, a inteligência racional, sediada na cabeça e regida pelo neocórtex, que é responsável pelo raciocínio, cognição e memória.

Chamamos-lhes 3 inteligências porque elas são a maneira como entendemos e interagimos com o mundo à nossa volta. Apesar de todos termos as três inteligências, cada pessoa, ao longo do seu desenvolvimento, se especializa numa delas e passa a ter a tendência de querer lidar com as situações da vida utilizando apenas uma dessas dimensões.

Por que nos limitamos a uma só dimensão? É a nossa história pessoal que faz com que nos inclinemos mais para uma dimensão que para outra. Vejamos, as três funções do psiquismo humano - o instinto, o sentimento e o pensamento - estão relacionadas com as três necessidades básicas de cada ser humano: a necessidade de autonomia, de reconhecimento e de segurança. A forma como estas necessidades básicas são ou não são satisfeitas, vai influenciar a nossa personalidade mais cerebral ou emocional ou visceral.

Se a satisfação de uma destas necessidades foi problemática e conflituosa ou traumática, a criança desenvolve a personalidade ou o antídoto ou padrão correspondente, como uma solução de emergência para resolver o problema e assim se reforça um ou outro centro de inteligência.

Autonomia - A emoção vital dos viscerais é a ira em resposta ao facto de a sua necessidade de autonomia não ter sido satisfeita. Todo o ser humano busca liberdade, independência; neste sentido, somos seres territoriais, defendemos a nossa identidade, estabelecemos fronteiras entre o eu e o tu.

Reconhecimento - A emoção ou sentimento vital dos emocionais é a vergonha, pelo facto de a necessidade de reconhecimento não ter sido satisfeita. Sentir-se querido e amado é muito importante para uma criança, tal como o sentido de pertença a uma família.

Segurança - Por fim, a emoção vital dos cerebrais é a ansiedade e o medo em resposta ao facto de a sua necessidade de segurança não ter sido satisfeita. Isto equivale a sentirmo-nos seguros onde estamos, conhecermos bem o sítio, sabermos a verdade das coisas, sentirmos clareza confiança.

A criança que reagiu com ira à dificuldade de satisfazer a sua necessidade de autonomia, cresceu como uma pessoa visceral; a que reagiu com vergonha à falta de reconhecimento, desenvolveu o carácter emocional; a que sentiu medo perante a falta de segurança, cresceu como cerebral.

O eneagrama identifica três diferentes personalidades no interior de cada centro de inteligência, o que no total perfaz 9 personalidades diferentes. Não vamos, por motivos de espaço, descrever cada uma destas personalidades que o eneagrama identifica com números de 1 a 9, mas vamos identificar os seus números entre parênteses em cada tríade.

Tríade emocional (2, 3, 4)
Os emocionais percecionam o mundo através do filtro cognitivo da inteligência emocional. Estão atentos ao próprio estado de humor e sentimentos e aos dos outros, a fim de poderem conservar a sua sensação de ligação a eles. São os mais dependentes dos outros, dependem tanto da aprovação dos outros que se ajustam aos gostos deles. Neste sentido, estão mais preocupados com o que parecem do que com o que são realmente.

É claro que o que subjaz a este comportamento e o motiva é a emoção da vergonha, que os faz sentir como se sempre houvesse algo muito profundo e escondido neles que os faz sentir indignos ou errados. Esta emoção ou sentimento de falta pode ser inconsciente e estar escondido sob comportamentos de orgulho ou arrogância e sobranceria.

Por causa do fingimento e hipocrisia de manter uma aparência que os faça populares, acabam por ter problemas de identidade, - a certa altura, já não sabem se são eles ou a máscara que usam para obter a aprovação dos outros. Em certo sentido, parece que nunca crescem, pois, a sua autoestima está sempre dependente da estima que recebem ou não dos outros.

Evidentemente, não só os tipos do centro emocional, como, também todos os outros tipos dependem da inteligência emocional para desenvolver as qualidades superiores do centro emocional, como a compaixão, a bondade, a compreensão e a capacidade de se identificarem com o próximo.

Tríade cerebral (5, 6, 7)
Os cerebrais ou racionais percecionam o mundo e o ambiente que os rodeia através do filtro cognitivo das faculdades mentais. Os objetivos desta estratégia são minimizar a ansiedade ou medo de lidar com situações potencialmente dolorosas e adquirir uma sensação de certeza por meio dos processos mentais de análise, conceção, imaginação e planeamento.

São clarividentes, pensam com clareza e chegam a desenvolver teorias complexas. Os problemas surgem quando se trata de atuar. É como se estivessem sempre a preparar-se para a ação, mas esse momento nunca chega, como se falhasse o motor de arranque. Estão sempre na dúvida que é em si mesma uma manifestação do medo de errar.

“De boas intenções está o inferno cheio”. Eles diriam como Descartes, “Cogito ergo sum”, confundindo o seu ser essencial com o conteúdo das suas mentes; mas isso equivale a confundir o mapa com o território.

Evidentemente, não só os tipos do centro mental como todos os outros tipos dependem da inteligência mental para desenvolver as qualidades superiores do centro mental, como a sabedoria, o entendimento e a prudência.

Tríade visceral (8, 9, 1)
Os viscerais tendem a perceber o mundo através do instinto e da inteligência das sensações físicas e sinestésicas. Usam a posição que ocupam e o poder que detêm para transformar a vida naquilo que eles acham que ela deve ser.

Centrados e focados mais nos seus corpos e na ação que nos seus sentimentos ou pensamentos, a sua principal emoção ou energia vital é a ira, que utilizam como mecanismo de defesa. Esta ira que é clara e evidente na personalidade 8 pode estar reprimida na personalidade 1 e inconsciente na personalidade 9, mas existe sempre e é real.

Voltados para a ação, para o exterior, chegando a ser muito ativos e carismáticos, trabalhadores e hábeis percetores da realidade dos outros, estão desligados de si mesmos, desconhecem o seu íntimo, os seus sentimentos e pensamentos, o seu ser, a sua identidade.

Evidentemente, não só os tipos do centro instintivo como todos os tipos dependem da inteligência somática para ter acesso à energia necessária para a ação, para discernir quanta força deve ser aplicada às diversas situações e para adquirir a sensação firme de estar ligado a este mundo. 
Em resumo

Racional
Emocional
Visceral
Corpo
Cabeça
Peito
Abdómen
Cérebro
Neocórtex
Mamífero
Reptiliano
Ante a realidade
Observa/pensa
Relaciona-se
Atua/controla
Sente-se
Inseguro/ansioso
Não aceite
Irado
Busca
Entender
Ser aceite
Autonomia
Em stress
Preocupa-se
Chora
Grita
Meta
Sabedoria
Amor
Coragem

Como posso desenvolver as outras inteligências?
Uma sugestão para desenvolver as outras inteligências menos fortes é procurar conviver com pessoas nas quais elas sejam predominantes

Para desenvolver uma determinada inteligência existem estratégias específicas. Para desenvolver a inteligência racional devemos evitar a reação rápida, parar, respirar fundo, dar tempo ao tempo, contar até 10, praticar meditação, perguntarmo-nos qual o porquê das coisas ou por que fulano disse o que disse, observar e procurar interpretar.

Para desenvolver a inteligência emocional basta perguntarmo-nos sempre (antes de agir ou responder a algo) como nos sentimos; devemos conseguir identificar a emoção que sentimos no momento; por outro lado, procurar identificar os sentimentos do outro e sobretudo inquirir como nos sentiríamos se a outra pessoa dissesse ou fizesse connosco o que pretendemos dizer ou fazer com ela?

Para desenvolver a inteligência visceral devemos prestar mais atenção às sensações do nosso corpo (ele dá sinais), fazer exercício, praticar artes marciais (elas ajudam-nos a ligarmo-nos à energia vital dos viscerais, à raiva ou à ira), praticar meditações dinâmicas.
Pe. Jorge Amaro, IMC

1 de abril de 2020

3 Cérebros: Reptílico - Mamífero - Humano

Sem comentários:
Criado à imagem e semelhança de Deus, o ser humano é, tal como o seu Criador, uno e trino pois a existência de um indivíduo pressupõe a coexistência de outros dois.

Existe em três tempos - o presente, o passado e o futuro – e em três níveis de consciências - inconsciência, pré-consciência e consciência; no seu desenvolvimento passa por três fases - oral, anal e genital; a sua mente divide-se em três partes – Id, Ego e Superego - e possui três cérebros que funcionam autónoma e diferenciadamente no interior um do outro, como uma matrioska de três bonecas.

A teoria dos três cérebros ou do cérebro trino pertence ao neurocientista americano Paul MacLean (1960) que entendeu que as fases da evolução da vida em diferentes espécies até chegar à autoconsciência de si mesma nos seres humanos teve repercussões na génese e evolução do nosso cérebro.

O cérebro trino e a evolução das espécies
O cérebro humano é uma recapitulação da evolução, ou seja, inclui em si todo o conteúdo das fases evolutivas anteriores; o nosso primeiro cérebro é reptílico, do tempo em que os répteis dominavam a Terra. Depois deste veio o reino dos mamíferos, pelo que o nosso segundo cérebro é o cérebro mamífero ou límbico. De entre os mamíferos surgiram os primatas, os nossos antepassados, e, com eles, o nosso terceiro cérebro - o cérebro humano ou neocórtex.

De invertebrado a réptil
O primeiro ser vivo do nosso planeta era um ser unicelular, ou seja, possuía uma só célula; como exemplo de animal unicelular que ainda existe hoje temos a ameba. Ao surgirem os animais pluricelulares, as células tiveram que desenvolver mecanismos para poderem comunicar entre si. Esses mecanismos são ou impulsos elétricos ou sinais químicos: assim nasceram as neuromas, células especializadas em passar mensagens.

Estas células começaram a agrupar-se perto do olho e da boca do ser vivo e assim se formaram os primeiros cérebros, os dos moluscos e dos insetos, antes dos primeiros vertebrados, peixes ou répteis. Pensa-se que o cérebro nasceu há 750 milhões de anos.

A diferença do cérebro dos vertebrados (peixes, anfíbios, répteis, aves e mamíferos) e invertebrados (moluscos e insetos) é que podemos considerá-los como pré-cérebros, pois não concentram em si todas as funções vitais. Por exemplo, muitos insetos conseguem sobreviver durante dias sem cabeça, pois as funções principais de sobrevivência não estão concentradas no cérebro. O primeiro cérebro a controlar todas as funções vitais do animal foi o cérebro reptílico, comum a todos os vertebrados acima mencionados, incluindo os primatas e o ser humano

De réptil a mamífero
“Mais vale estar sozinho que mal acompanhado” - O réptil não cria laços afetivos com nada nem com ninguém. Para o réptil, todos os outros seres vivos para além de si mesmo são inimigos ou comida ou as duas coisas. O réptil é um ser solitário que não convive com os seus semelhantes nem sequer com as suas crias que nascem sozinhas de ovos previamente depositados e escondidos.

“A união faz a força” – O mamífero, ao contrário do réptil, é um animal intrinsecamente social. Os mamíferos nascem do corpo da mãe e durante algum tempo alimentam-se dela e relacionam-se com ela, bem como com os seus congéneres o resto das suas vidas. Ao contrário dos répteis que olham com indiferença para a sua prole, entre os mamíferos, os pais nutrem as suas crias física e afetivamente, protegendo-as do mundo hostil a ponto de arriscarem e às vezes perderem a própria vida. Uma vida tão diferente tem que ter como base um cérebro mais complexo, que assume, integra e engloba o cérebro reptílico, mas vai muito além deste.

Em virtude do relacionamento inexistente no cérebro reptílico, o cérebro dos mamíferos ou límbico desenvolveu motivações e emoções que regulam as relações que se estabelecem entre os animais da mesma espécie e os que não são da sua espécie. Se para os répteis a sobrevivência se resume apenas a comer e fugir ou atacar o inimigo, para os mamíferos a sobrevivência, não excluindo o que significa para os répteis, vais mais além e envolve a dor e o prazer.

O mamífero não se contenta com sobreviver, quer ser feliz e por isso busca o prazer e evita a dor. Grava experiências prazenteiras que repete uma e outra vez e também as experiências dolorosas que procura sempre evitar: “gato escaldado de água fria tem medo”. A felicidade, o conforto, o sentir-se bem são objetivos e motivações do nosso cérebro mamífero ou límbico emotivo e não do neocórtex.

De mamífero a primata e ser humano
Se observarmos a figura que ilustra este texto, verificamos que a maior parte do nosso cérebro é constituído pelo neocórtex, ou seja, pelo cérebro humano. Há um grande salto qualitativo e quantitativo entre os mamíferos, mesmo entre os primatas e os seres humanos.

Nos últimos 2 milhões de anos, o cérebro humano triplicou de peso e tamanho: “os homens não se medem aos palmos”. A dimensão do cérebro no mundo animal, incluindo o ser humano, não é proporcional à dimensão do corpo, mas à sua inteligência. O elefante é bem maior que o ser humano e, no entanto, não é tanto inteligente como este.

Os chimpanzés, que são os animais mais próximos de nós na evolução das espécies, nunca abandonaram o seu meio ambiente, a savana. O homo sapiens emigrou para todos os tipos de clima e topografias diversas. Este esforço de adaptação ao meio, assim como as relações entre congéneres no sentido de ajuda mútua e luta pela sobrevivência em ambientes hostis, levou à linguagem, ao pensamento abstrato e científico. O cérebro constituído apenas por emoções não era suficiente e foi forçado a evoluir e a ultrapassá-las.

A evolução do homo sapiens e a evolução cultural e civilizacional do homo sapiens segue a sua inteligência a par e passo. A descoberta da linguagem parece ser a grande revolução que fez com que o cérebro humano aumentasse consideravelmente de tamanho e de inteligência. Se avaliarmos a inteligência pelo maior número de sinapses ou conexões entre neuromas em rede, a linguagem reflete do mesmo modo uma maior conexão de conceitos entre si.

A isto juntamos a curiosidade própria dos humanos, que os leva a querer conhecer mais, a sua criatividade, a complexidade das estruturas sociais, o pensamento abstrato e a autoconsciência. Tudo isto distingue o cérebro humano do seu congénere ancestral, o cérebro límbico.

Bebé – criança – adulto
Embora um bebé já possua, desde o seio materno, os três cérebros e na fase adulta nunca deixe de possuir as fases anteriores de desenvolvimento, podendo até regressar a elas, maior ênfase é colocada num cérebro em detrimento dos outros dois, consoante a idade.

Nos primeiros tempos da sua vida, o bebé coloca toda a sua atenção no cérebro reptílico - a sua única preocupação é comer, dormir e procurar que todas as suas necessidades básicas sejam satisfeitas. Vive para si mesmo, os laços não são ainda importantes. É neste tempo tão parecido com os répteis, que até se desloca como eles, arrastando-se.

Na infância, a criança desenvolve uma fé cega nos seus pais e, por isso, deixa de se preocupar com a própria sobrevivência e segurança, toma-as como garantidas e passa a dedicar toda a sua atenção aos laços que desenvolve com os pais, professores, irmãos, colegas e amigos. Antes dos sete anos de idade, não tem consciência de si mesma e por isso vive plenamente no seu cérebro mamífero ou límbico. É o tempo idílico das emoções, durante o qual amar e ser amada, ser aceite ou rejeitada afetivamente é mais importante que a sobrevivência.

Na adolescência, juventude e idade adulta, não esquecendo as idades anteriores, o foco desvia-se dos laços e concentra-se mais na procura da própria identidade. É tão forte e tão importante a busca da sua identidade que o indivíduo pode até antagonizar-se com quem mais ama: - os seus pais - e até romper com eles. Foi o que aconteceu com S. Francisco de Assis, quando o pai lhe disse em público que até as roupas que vestia eram dele; Francisco despojou-se das suas roupas e foi-se embora nu. Neste tempo, a busca do sentido da vida, da sua vocação ou do seu lugar no mundo são mais importantes que os sentimentos e emoções; estas últimas são frequentemente sacrificadas quando o indivíduo persegue o sentido e a vocação da sua vida.

Três em um, um em três
Como na evolução das espécies animais, o animal superior não elimina o inferior; ou seja, quando certos répteis evoluíram para aves e mamíferos, continuaram a existir répteis. Da mesma forma, certos anfíbios transformaram-se em animais exclusivamente terrestres, sem que os anfíbios desaparecessem. Quando certos primatas se transformaram em homo sapiens, continuaram a existir - primatas, chimpanzés e gorilas.

Assim acontece com os três cérebros - cada um deles representa uma etapa na evolução das espécies, sucessivamente mais próxima do ser humano; de réptil a mamífero e a primata. Os cérebros posteriores assimilaram o anterior, construíram sobre o anterior sem o eliminarem, ou seja, foram-se agregando funções e capacidades às já existentes, sem as eliminar. O ser humano por ser humano não deixa de ser animal e ter com estes muito em comum.

Estes três cérebros funcionam de um modo não integrado ou com pouca integração, uma vez que cada um tem um grau de autonomia em relação aos outros dois.  Este funcionamento autónomo é necessário e positivo porque nos livra de grandes dificuldades e pode salvar-nos a vida em caso de emergência. Mas também pode causar-nos grandes transtornos sociais porque o cérebro visceral ou reptílico influencia o cérebro límbico ou emocional e os dois, em conjunto ou de forma independente, influenciam o cérebro racional. No entanto, segundo nos diz a ciência (e isto é um pouco assustador), o contrário não acontece: em sentido contrário, o cérebro racional não tem capacidade de influenciar/alterar/ transformar o cérebro límbico nem o visceral. A experiência do dia a dia comprova isto: por muito que eu saiba que a barata é inofensiva, sempre terei medo de lhe tocar ou mesmo de a ver.

 Embora o neocórtex, mais volumoso, seja responsável por mais funções e comande os outros dois, estes últimos não desaparecem e mantêm as mesmas funções de sempre, já que o neocórtex não se ocupa delas: são soberanos no seu campo. O neocórtex é a sede da razão, o cérebro límbico é a sede da emoção e o reptílico é a sede do instinto. Por isso, perante uma situação nova, o reptílico tem medo e pergunta-se se é seguro, o mamífero pergunta-se se vai resultar em prazer ou dor, se vai ser amado ou odiado, e o neocórtex interroga-se quanto ao sentido, ao que pode aprender, em que medida pode ser-lhe útil.

O neocórtex pode ficar confuso, em stress, ansioso e não saber o que fazer; o mamífero pode ficar deprimido, desmotivado e não ter vontade de fazer nada; o reptílico está sempre ativo, sempre alerta e sabe sempre o que fazer: “em tempo de guerra não se limpam armas”. O cérebro reptílico nunca se confunde, não se deprime e está sempre preparado para a ação em defesa da vida, para a proteger e defender. No entanto, se o neocórtex decide suicidar-se, o cérebro reptílico nada pode fazer. O neocórtex que está assente sobre os outros dois, literalmente por cima deles, é o tribunal supremo sem possibilidade de recurso.

O cérebro reptílico
É comum a todos os seres vertebrados, ou seja, a todos os animais que têm esqueleto e coluna espinal. Situa-se precisamente no topo da coluna. Ocupa 5% da nossa massa cerebral e a sua tarefa é reagir perante os estímulos do meio ambiente. A cobra, por exemplo, resume-se a uma coluna espinal que se movimenta arrastando-se por terra, com um pequeno cérebro no topo desta coluna que se formou há 500 milhões de anos. O cérebro reptílico é constituído por quatro partes distintas:

Gânglios basais – que se encontram na parte mais profunda do córtex cerebral e processam a informação sobre o nosso movimento corporal, ajustando-o a diferentes situações.

Sistema reticular – localizado no encéfalo, próximo da medula espinhal, e que regula o estado de sono e vigília. Filtra a informação que chega dos cinco sentidos, separando o que interessa do que não interessa, que não chega sequer à consciência. 

Cerebelo – órgão sumamente compacto e antigo situa-se na parte posterior do crânio e a sua função é manter o equilíbrio e a coordenação muscular.

Tronco cerebral – situa-se entre o encéfalo e a medula espinhal, formado por 4 áreas distintas ligadas ao diencéfalo; serve de via de circulação de todas os mecanismos sensoriais, à exceção do olfato e da visão.

No seu conjunto, este cérebro é pequeno e simples, mas altamente funcional e eficiente. Os outros dois podem ser disfuncionais e até adoecer - o mamífero ou límbico pode deprimir, o humano ou neocórtex pode ficar confuso, neurótico, esquizofrénico, psicótico. Mas o reptílico nunca deixa de funcionar, nunca fica doente, está sempre alerta, vela quando dormimos, só a morte consegue desativá-lo.

Só existe o aqui e agora
O cérebro reptílico não tem memória do passado nem se projeta no futuro. Existe apenas no aqui e agora. Não aprende com as experiências nem precisa, pois é 100% regulado pelo instinto que, em si mesmo, segue as leis da natureza, imutáveis e deterministas, não sujeitas a mudanças no tempo.

Em constante luta pela sobrevivência
Internamente - nunca descansa, nunca dorme, nunca se desliga; regula as funções automáticas, rotineiras, habituais e inconscientes do nosso organismo, como o batimento cardíaco, a respiração, a tensão arterial, a temperatura constante, cura as feridas.

Externamente – também se mantém alerta, à exceção de quando dorme ou está em letargia ou hibernação. Em estado de alerta, possui reflexos que atuam através de um mecanismo simples e imediato chamado estímulo reação. Em caso de emergência, é este cérebro que nos salva.

Se acidentalmente colocarmos a nossa mão numa superfície muito quente, este mecanismo provoca a reação de retirar a mão de forma rápida e inconsciente que não provém de uma decisão consciente do neocórtex, uma vez que este é demasiado lento. A decisão instantânea provém do cérebro reptílico que vela pela defesa da vida em toda e qualquer circunstância.

“Palavra fora da boca é pedra fora da mão” – quando falamos sem pensar, estamos a ter um comportamento reativo; todo o nosso comportamento reativo provém deste cérebro. O comportamento proativo provém do cérebro emocional ou cerebral, pois requer tempo. Mas quando respondemos ou atuamos sem pensar, fazemo-lo a partir do nosso cérebro reptílico que, de forma acertada ou errada, julga a situação como perigosa.

Procura a satisfação das necessidades básicas
A sua única ocupação é a satisfação das necessidades básicas de sobrevivência e preservação do indivíduo. Para tal, ocupa-se com respirar, beber, comer, dormir e também com a sobrevivência e preservação da sua espécie. Por este motivo, procura copular com indivíduos do sexo oposto para assim se reproduzir.

O chamado “amor à primeira vista”, precisamente por ser tão rápido, é instintivo, desprovido de qualquer emoção; é pura atração sexual que provém do cérebro reptílico que motiva o instinto e a conduta sexual com a finalidade de preservar a espécie.

Instinto territorial
O cérebro reptílico simplista tem apenas três tipos de ações ou reações ao meio em que habita: ataca/ foge/ imobiliza-se/esconde-se. Para o réptil, todos os seres vivos se dividem em duas únicas categorias - caçadores ou presas. Perante um outro ser vivo, o réptil decide num milionésimo de segundo se é presa ou caçador. Se é presa, vai ser comida e atacada pelo seu caçador e, portanto, foge ou esconde-se; se é caçador, vai comer a presa e, portanto, ataca.

É frequente vermos no campo a tabuleta que indica uma reserva de caça privada: os seres humanos também possuem um instinto territorial. Poderíamos considerar as fronteiras entre países como uma das manifestações desse instinto.

Este mecanismo de sobrevivência justifica-se muito mais nos animais a partir dos répteis, por entenderem que para se sustentarem, crescerem e reproduzirem-se precisam de um determinado espaço de terra. Uma vez demarcado pela própria urina, como fazem os mamíferos, defendem-no com unhas e dentes e passam o dia patrulhando-o, de norte a sul, de este a oeste. 

Quando é provocado, sente medo, e reage agressivamente
Sabemos pela psicologia que a raiva ou a ira são emoções secundárias, são reações ou respostas a uma situação que inspira uma emoção primária: quase sempre o medo. É certo que no contexto do cérebro reptílico, o medo não pode ser uma emoção, mas sim uma perceção de perigo que desencadeia no cérebro reptílico uma das três respostas – atacar, fugir ou esconder-se.

O cérebro reptílico não é agressivo por natureza, não odeia, não se vinga, não guarda ressentimentos porque não tem memória histórica, não guarda em si experiências passadas para poder comparar com as atuais e responder adequadamente, como faz o cérebro mamífero; não ataca ninguém se não for ameaçado; ao contrário do cérebro límbico, o cérebro reptílico não tem à priori amigos nem inimigos.

Caráter visceral ou instintivo
Como adiante veremos noutro texto, do ponto de vista psicológico as pessoas dividem-se em viscerais ou instintivas, emocionais ou cerebrais.

A pessoa com caráter visceral ou instintivo, tal como os répteis, é solitária, não precisa de relações sociais e não é dada a relações sociais e a estabelecer laços afetivos. Está mais orientada para a ação, para realizar tarefas e fazer coisas. Provavelmente, só procura os da sua espécie para copular; tudo o resto é antagónico.

Perdoa facilmente, porque tende a não guardar memória das ofensas passadas. Tem aliás uma memória muito seletiva e só memoriza o que lhe interessa; as ofensas passadas não fazem parte desse interesse; pode ser vingativo no momento, mas se deixa passar tempo, perde o interesse pela vingança, pois facilmente vira a página, não gastando energias a guardar ressentimentos.

É pacifica, está bem consigo mesma no seu cantinho, é territorial, não incomoda nem quer ser incomodada, e só responde agressivamente se for ameaçada ou provocada.

Diante do perigo, tem mais probabilidades de salvar-se a pessoa instintiva porque mantém a calma, não se deixa influenciar pelas emoções negativas do cérebro emotivo nem pela ansiedade,  preocupação e stress do cerebral, não entra em pânico e conserva a calma e a frieza do instinto que raramente se engana. Muitos dos que se afogam no mar são bons nadadores mas, como são emocionais ou cerebrais, entram em pânico e morrem de ataque cardíaco antes de se afogarem; se fossem viscerais não se afogariam.

“Vale mais o mal conhecido que o bom por conhecer” – o cérebro reptílico não é muito dado à mudança, é amigo das rotinas e perde-se quando há mudanças muito rápidas. Por isso tende a ser conservador e a rejeitar todo o tipo de inovação, já que receia a mudança por não estar capacitado para enfrentar situações novas e adaptar-se a elas.

O cérebro mamífero (límbico)
Presente nos mamíferos inferiores e incipiente nas aves. Do tamanho de um limão, formou-se há 150 milhões de anos. É constituído pelas seguintes estruturas:

Hipotálamo – significa que está por baixo do tálamo; é tão pequeno que representa apenas 1% de todo o cérebro, tendo o tamanho de uma ervilha. Apesar de pequeno, regula muitas coisas no nosso organismo. Em relação às emoções, espoleta a segregação de hormonas como a adrenalina.

Amígdala – temos duas, uma de cada lado do cérebro; a amígdala é o centro da agressividade, do medo como emoção e da ansiedade. A amígdala associa emoções às memórias, pelo que as memórias mais emotivas são mais recordadas.

Tálamo – temos dois, um de cada lado do cérebro, responsáveis pelos quatro sentidos, à exceção do olfato; também são responsáveis pela sensação de dor, quente ou frio, pressão de um ambiente nos ouvidos. A sua importância para as emoções é clara, uma vez que sem os cinco sentidos não há informação para que as emoções aconteçam.

Hipocampo – tem importância na formação de novas memórias; converte as memórias de curto prazo em memórias de longo prazo. Estas memórias podem invocar emoções.

Cria laços
Uma das características mais expressivas dos mamíferos em relação aos répteis, é a sua tendência para viver em sociedade. Por uma questão de sobrevivência, estes animais tendem evolutivamente a manter-se juntos, para mais facilmente poderem sustentar-se, afastar predadores e garantir a continuidade da espécie.

Por exemplo, os mamíferos herbívoros mantêm-se juntos e muitas vezes conseguem afastar os predadores, pois a união faz a força; por outro lado, muitos mamíferos carnívoros não caçam sozinhos, mas em conjunto, como as leoas, pois assim têm mais possibilidades de conseguir uma presa.

O cérebro mamífero reflete esta evolução, criando mecanismos de aceitação, rejeição e expulsão do grupo com as suas emoções específicas. A figura da mãe e a relação que estabelece com as crias é importante para a sobrevivência destas; de facto, às vezes as mães rejeitam as crias e estas morrem. Eu mesmo verifiquei, num rebanho de ovelhas, uma cria rejeitada que era amamentada artificialmente com um biberão pelo pastor. A cria queria chegar-se à mãe, mas a mãe rejeitava-a e, já adulta, pastava sempre sozinha, fora do rebanho, pois se a mãe a rejeitava as outras ovelhas também a rejeitavam.

Sede das emoções
É a sede das emoções sobre as quais não temos controlo. Não decidimos ter raiva nem decidimos sentir amor ou ódio. As emoções não surgiram do nada, de alguma forma já estavam latentes nos instintos do réptil; a emoção é mais duradoura que o instinto, é como se fosse um instinto prolongado no tempo com memória histórica.

O amor provém do instinto sexual, que primeiramente faz com que dois seres se unam, usando-se um ao outro como objeto de prazer e desenvolvendo só mais tarde o sentimento de afeto um pelo outro. Isto acontece ainda hoje entre pessoas que se uniram sexualmente, pensando que seria por uma noite e depois permaneceram unidos o resto da vida. Depois do ato sexual, surge o amor incondicional pela cria, tão típico dos mamíferos.

O medo com perceção de perigo provoca a fuga; como emoção, acompanha e nasce do ato de fuga, do ato de esconder-se, imobilizar-se ou camuflar-se. A ira nasce e acompanha o ato de ataque da presa. A emoção é um estado mental que surge autonomamente no sistema nervoso e é positiva ou negativa, pois está ligada à satisfação ou não satisfação de uma necessidade. Portanto, é negativa se a necessidade não está satisfeita e positiva se está. O instinto é uma disposição inata e inerente a um organismo vivo, é uma reação a um determinado estímulo.

Aprende e guarda memória
Os mamíferos são também um dos grupos mais adaptáveis no que diz respeito ao habitat. Os répteis estão confinados aos climas quentes e moderados, onde hibernam durante o inverno, enquanto que os mamíferos existem em todos os climas porque são capazes de modificar o seu comportamento de acordo com o local onde se encontram. Possuem capacidade de aprendizagem devido ao seu cérebro com centro de memória a curto e a longo prazo. Os répteis não aprendem, por isso necessitam de um meio que não se altere, já que não têm capacidade para se adaptar.

Foge do sofrimento, procura o prazer
Se compararmos um gato com uma cobra, vemos que o gato possui um conjunto de emoções e respostas emotivas, o que não acontece com a cobra. O gato tem um cérebro que lhe permite procurar o prazer e evitar a dor, tendo mais liberdade que a cobra porque aprendeu, e aprendeu porque tem memória, pode guardar experiências que lhe provocaram dor ou prazer e saber no futuro  o que repetir para ter prazer e o que não fazer para evitar a dor.

O carácter emocional
Como vimos, o réptil é geralmente solitário, não convive; o mamífero, pelo contrário, estabelece laços com os indivíduos da sua espécie que são importantes para a sua sobrevivência desde que nasce. Por isso, grande ênfase é atribuída ao estado de humor e aos sentimentos dos outros a fim de conservar a sua sensação de estar ligado a eles.

Mais do que os outros tipos, depende da aprovação e reconhecimento dos outros indivíduos para conservar a sua própria autoestima e a sensação de ser amado. Para garantir esse reconhecimento e essa aprovação, a pessoa emocional chega a criar uma imagem de si mesma que fará com que os outros a aceitem e a vejam como uma pessoa amável.

O cérebro humano (neocórtex)
É a camada mais externa, enrolada em torno do cérebro dos mamíferos. É a fase final do desenvolvimento do nosso cérebro. Formou-se há 3 milhões de anos, representa 76% de toda a massa cinzenta e está presente em todos os primatas, como gorilas e chimpanzés, bem como nos mamíferos superiores, como baleias e golfinhos. No entanto, os humanos possuem a versão mais desenvolvida e única. O ser humano é de facto o único mamífero que apresenta uma concentração tão elevada de neuromas em tão pouco espaço.

O cérebro humano está dividido em dois hemisférios: o hemisfério esquerdo que está associado ao raciocínio lógico, análise e decomposição de um todo em partes e à linguagem, e o hemisfério direito que está associado à criatividade, imaginação, aos processos associativos globais, ao processamento das emoções e das relações espaciais.

Lobo parietal – existe um em cada hemisfério do cérebro e a sua função é receber estímulos sensoriais exteriores ao corpo e interpretá-los cognitivamente com a ajuda da memória de perceções passadas. É importante para a atenção e o desenvolvimento de mapas mentais.

Lobo occipital – também existe um em cada hemisfério. Processa estímulos visuais de forma permanente, analisando distâncias, formas, cores, movimentos.

Lobo frontal - também existe um em cada hemisfério. É a área motora do cérebro, controla todas as funções do movimento. É também neste lobo que se encontra a área de Broca, responsável pela linguagem em todas as suas formas, falada ou escrita.

Lobo pré-frontal – é uma das áreas mais interessantes e decisivas para entender o nosso pensamento abstrato e até mesmo a nossa autoconsciência. Está também encarregado dos processos executivos, da tomada de decisões e de diferentes aspetos relacionados com a regulação das emoções.

Lobo temporal - também existe um em cada hemisfério. Tem várias funções, sem se especializar em nenhuma em concreto; é por isso “poli sensorial”, pois integra vias neurais auditivas, sensoriais, visuais e límbicas.

Linguagem e capacidade lógica
Este cérebro é muito mais volumoso que os outros dois e bem mais complexo. Trabalha no âmbito da lógica e do raciocínio: processa informação, possui uma linguagem e expressa-se por intermédio da fala e da linguagem corporal e escrita; vive no presente, mas tem acesso a memórias do passado que usa como base de dados, e chama a si o futuro, projetando-o através de conjeturas, antecipando-o e preparando-se para ele, fixando objetivos e metas.

Raciocínio abstrato
Tem a ver com a criação de ideias inovadoras, partindo da ligação entre diferentes conceitos aparentemente diferentes e sem nenhuma ligação lógica. É um pensamento desligado da realidade, dos factos e também do aqui e agora. Trabalha com conceitos gerais e não com coisas particulares. É o pensamento do filósofo e de alguns cientistas.

Curiosidade e criatividade
Usa o passado como base de dados para o presente e para se projetar no futuro, mas não é dependente desta base; pode também ignorá-la e ser 100% criador e inovador; pode enfrentar novos desafios de forma criativa, sem necessidade de se reportar a experiências passadas. “A necessidade aguça o engenho” - quando precisa verdadeiramente de algo, a criatividade é motivada. Em geral, o homem é curioso, tem uma sede insaciável de saber.

Autoconsciência e poder de decisão
A autoconsciência é o grande salto qualitativo entre o homem e os restantes animais. O ser humano tem consciência do ambiente que o rodeia, de si mesmo e dos seus processos e tem poder sobre a própria vida, até para acabar com ela, se quiser. Tem poder de decisão e de orientar a vida para um objetivo ou ideal, de acordo com a sua vocação ou talento.

Em relação aos animais, o homem vive enquanto os animais apenas estão vivos, uma vez que não são senhores do seu destino, estão ligados à natureza de uma forma simbiótica, obedecendo-lhe sem possibilidade de se rebelar. O homem não depende da natureza de uma forma simbiótica e acrítica e até tem poder para a adaptar aos seus desígnios e necessidades.

Projeção para o futuro
Tem capacidade para identificar um problema e encontrar uma solução para o mesmo; é muitíssimo mais criativo que o mamífero, por isso possui uma capacidade muito maior de se adaptar ao meio. Mais que adaptar-se, o homo sapiens adapta o meio a si mesmo, coisa que nenhum animal consegue fazer.

Como, ao contrário dos animais, tem poder sobre a própria vida, pode programar, projetar, fazer planos para o futuro. E em grande medida acerta, valendo-se da análise de experiências passadas e do conhecimento cada vez maior da natureza, das coisas e da sua própria natureza.

O caráter cerebral
Tende a perceber o mundo através do filtro cognitivo das faculdades mentais. Os objetivos desta estratégia são os de minimizar a ansiedade, lidar com situações potencialmente dolorosas e adquirir uma sensação de certeza por meio dos processos mentais de análise, conceção, imaginação e planeamento.

Abstrai-se da realidade onde pode perder-se e refugia-se no mundo das ideias, onde tudo obedece a parâmetros e paradigmas, onde tudo é previsível, contabilizável e qualificável. É ainda menos sociável que o instintivo. Face a experiências emocionais, usa os subterfúgios de mecanismos de defesa, como a racionalização e a negação

Presos no cérebro reptílico e límbico
O cérebro mamífero/límbico não possui nenhum conceito de tempo, presente, passado ou futuro; vive num eterno presente; um cão pode saudar-nos da mesma forma daqui a 3 minutos como daqui a três meses, três anos ou 30 anos. Para ele, o tempo não passou.

Este fenómeno também ajuda a explicar como funciona o mecanismo do trauma. O trauma é sempre uma experiência emocionalmente negativa que, portanto, pertence fundamentalmente ao cérebro límbico; o cérebro reptílico não tem traumas, pois carece de memória.

Pode parecer que as pessoas traumatizadas ficaram presas no passado. Para elas, algo que aconteceu há 50 anos é sentido como se estivesse a acontecer agora. Quando algo semelhante à experiência traumática, ou com a mesma natureza acontece no presente, espoleta a mesma reação que a pessoa teve no passado. Não é fácil convencer o nosso cérebro de que, como diz Heráclito, “não podemos banhar-nos duas vezes nas águas do mesmo rio”

Um bom exemplo, seria o jovem que cada vez que enfia uma camisola de gola alta na cabeça entra em pânico. Eventualmente, descobre que no momento do parto, a vagina da mãe não dilatou o suficiente e ele ficou por algum tempo preso. Agora, de cada vez que passa por uma situação semelhante, sente o que sentiu na altura.

Neuro marketing
Diz-se que 95% das nossas decisões de compra ou de voto neste ou naquele partido, não são decisões racionais. Por isso os que vendem produtos ou fazem campanhas políticas não apelam ao cérebro racional ou neocórtex; apelam aos outros dois, sobre os quais, como já referimos, exercemos menos controlo.

Propaganda comercial
Do ponto de vista lógico, faz mais sentido que se faça a publicidade a um carro usando um famoso piloto de Fórmula 1 do que uma mulher bonita, sexy e atraente; porém, é esta que mais aparece nas campanhas publicitárias de carros, mesmo quando o vulgo pensa que as mulheres não são grandes condutoras e não havendo, de facto, nenhuma competição de automóveis feminina.

Propaganda política
A Europa está invadida por partidos populistas que usam tanto o medo como o otimismo desmesurado e irrealista. Pessimistas e realistas não ganham eleições. O povo não quer ouvir a verdade, mas uma mentira conveniente, uma mentira que, pela repetição, soa a verdade, não a realidade verdadeira, mas uma realidade alternativa. Soluções fáceis para problemas complexos.

A propaganda política dos nossos dias tem muito de maquiavélico, pouco racional, apelando mais aos cérebros reptílico e límbico. A democracia está pervertida porque somos dominados sem nos darmos conta.

Conclusão: Os três hóspedes da nossa alma - a razão, o instinto e a emoção - não só têm diferente natureza, como também provêm de cérebros distintos; entre eles, a convivência nem sempre é fraterna, as decisões nem sempre se tomam por consenso, e a razão nem sempre é o fator determinante do nosso comportamento. Como dizia Pascal, o coração tem razões que a razão desconhece.
Pe. Jorge Amaro, IMC