15 de setembro de 2020

3 Fatores do sucesso: Intelligência - Força de Vontade - Motivação

(…) em mim, isto é, na minha carne, não habita coisa boa; pois o querer está ao meu alcance, mas realizar o bem, isso não. É que não é o bem que eu quero que faço, mas o mal que eu não quero, isso é que pratico. Ora, se o que eu não quero é que faço, então já não sou eu que o realizo, mas o pecado que habita em mim. Deparo, pois, com esta lei: em mim, que quero fazer o bem, só o mal está ao meu alcance. Sim, eu sinto gosto pela lei de Deus, enquanto homem interior.

Mas noto que há outra lei nos meus membros a lutar contra a lei da minha razão e a reter-me prisioneiro na lei do pecado que está nos meus membros. Que homem miserável sou eu! Quem me há-de libertar deste corpo que pertence à morte? Graças a Deus, por Jesus Cristo, Senhor nosso
! Romanos 7, 18-25

A natureza humana não muda nem no tempo nem no lugar de cultura para cultura. S. Paulo afirma, com uma linguagem teológica própria do seu tempo, a mesma realidade que qualquer pessoa humana experimenta. Ano novo, vida nova ou, como os americanos gostam de dizer, uma nova resolução para o novo ano não passa de boa intenção; e, de boas intenções, como dizemos em Portugal, está o inferno cheio. Do pensar, desejar ao fazer há uma longa distância a percorrer.

Como seria diferente a nossa vida se conseguíssemos fazer tudo o que nos propomos fazer: não teríamos vícios, nem de tabaco, nem de álcool, nem de drogas; evitaríamos muitas doenças pois não teríamos peso a mais, comeríamos não o que nos sabe bem, mas o que nos faz bem, faríamos desporto regularmente, meditaríamos mais, rezaríamos mais, gastaríamos menos, pouparíamos mais para a reforma, venceríamos a preguiça e não adiaríamos para amanhã o que verdadeiramente podemos fazer hoje.

Também nos daríamos melhor com os outros, pois teríamos um comportamento mais proativo e menos reativo. Não diríamos tudo o que pensamos, mas pensaríamos em tudo o que dizemos. Dominaríamos a ira e os outros instintos que estariam ao serviço do bem e não do mal, da comunidade e não contra ela. Seríamos menos egoístas, pois dar-nos-íamos conta de que, tanto a curto como a longo prazo, não convém ser egoísta ou egocêntrico.

Não é preciso ser muito inteligente para ver que tudo isto melhoraria a nossa vida, individual e socialmente e seríamos mais felizes, se conseguíssemos concretizar todas estas ideias que não são uma utopia, mas uma realidade bem ao nosso alcance. Onde está então o problema que nos impede de pôr em prática todos os nossos bons programas, objetivos, sonhos e desejos?

INTELIGÊNCIA
No âmbito deste texto, entendemos inteligência como a capacidade de pensar racionalmente de procurar informação sobre determinado problema e de chegar a uma decisão ou solução para o mesmo.

Neste sentido, também entendemos por inteligência a inteligência emocional, o conhecimento que temos sobre nós mesmos, sobre os nossos talentos, virtudes e defeitos, e o uso que fazemos das nossas emoções ou a gestão equilibrada das mesmas.

Onde a força de vontade pode ser dispensada

Conta-se que Rossini, o famoso compositor de ópera, era tão indolente, tão preguiçoso que, encontrando-se na cama a compor a introdução de uma das suas óperas, o papel caiu ao chão. Rossini, em vez de se levantar e ir buscar o papel para continuar o seu trabalho, cedeu à preguiça e continuou na cama; em vez de continuar o trabalho já feito, fez um totalmente novo e diferente do anterior.

Esta história ilustra que muitas vezes uma boa inspiração consegue o que o trabalho árduo e uma grande força de vontade não conseguem. A criatividade não obedece à força de vontade, por isso, pelo menos no que se refere ao trabalho criativo onde entra a intuição, a força de vontade ou a motivação pouco ajudam. A força de vontade e a motivação são mais capazes de ajudar num trabalho lógico e dedutivo, mas não num trabalho onde se requer intuição. Esta última vem quando vem, não depende da nossa vontade nem da nossa motivação.

Decisões inconscientes
O objetivo do nosso estudo não é esta área, mas aquela descrita acima e que se debruça mais sobre a vida em geral do que sobre uma profissão em particular. Profissionalmente, os três fatores são precisos e interagem entre si. Custa-nos reconhecer que apesar de nos considerarmos pessoas inteligentes, a maioria das nossas escolhas são feitas em piloto automático, sem qualquer consciência real do que as motiva e, certamente, sem prévia reflexão séria sobre as suas consequências. Para cúmulo, na maioria das vezes, nem nos damos conta de que optamos por isto ou por aquilo.

O nosso livre arbítrio é um pouco limitado, muito mais limitado do que pensamos. Na verdade, a maior parte da motivação para as nossas decisões vem de sentimentos dos quais estamos apenas parcialmente conscientes, de emoções reprimidas, de programação de início de vida, da forma como fomos educados, de dogmas e ideias irracionais das quais não temos consciência.

Decisões conscientes
As nossas decisões conscientes são tomadas com a nossa mente desperta e consciente. Portanto, toda a cura e todas as melhorias nas nossas condições de vida começam neste nível. É aqui que temos de dar o primeiro passo com uma decisão consciente de que queremos melhorar a nossa condição, seguindo um programa adequado. Se virmos a progressão das nossas vidas como um processo criativo, então podemos ver a mente como o arquiteto deste mesmo projeto.

A lâmpada do corpo são os olhos; se os teus olhos estiverem sãos, todo o teu corpo andará iluminado. Se, porém, os teus olhos estiverem doentes, todo o teu corpo andará em trevas. Portanto, se a luz que há em ti são trevas, quão grandes serão essas trevas!
Mateus, 6, 22-23

É certo que Jesus se refere aos olhos da mente, à nossa capacidade para pensar logicamente, de forma razoável, plausível, à nossa sensatez e abertura mental. Parte dos nossos problemas pode vir da nossa mente e das crenças às quais esta se encontra adicta, dos preconceitos e crenças irracionais. No ser humano, a ação começa na mente. O fanático, o ditador, por exemplo, tem uma forma de pensar e umas crenças que são diferentes do resto das pessoas; e é claro que age para colocar essas crenças em prática.

Metanóia, a palavra grega que o Novo Testamento utiliza para designar conversão, alude a uma mudança de mente para mudar o comportamento; este é, aliás, o postulado da terapia cognitiva. Quando mudamos de ideias, mudamos de atitudes e mudamos de ação. Precisamos, portanto, de identificar as ideias que surgem nos nossos diálogos interiores e confrontá-las com a razão, substituindo eventualmente estas ideias ou crenças falsas por outras verdadeiras.

O poder da mente
A nossa mente é muito mais poderosa do que pensamos. No livro Remarkable Recovery’ de Caryle Hirshberg e outros, conta-se um caso sobre a teoria do efeito placebo. Um senhor idoso tinha um cancro que cresceu desmesuradamente, pelo que o médico lhe deu três meses de vida. Entretanto, apareceu um novo medicamento, mas ele não era um bom candidato a recebê-lo devido ao estado avançado da sua doença. No entanto, o doente insistiu tanto, que o médico acabou por o prescrever fora das experiências que estavam em curso e que envolviam o novo fármaco.

Em pouco tempo, o cancro diminuiu de tamanho e desapareceu por completo.  Mais tarde, este doente veio a saber que a final o fármaco não era adequado e que nenhum dos doentes que o tinham tomado oficialmente se tinha curado. Em pouco tempo o cancro regressou e o seu estado voltou a ser grave como no início.

Completamente maravilhado pela experiência, o médico decidiu continuá-la e disse ao seu doente que o cancro tinha voltado porque lhe tinham dado um medicamento antigo, que agora iria receber um fármaco novo que certamente iria resultar. Na verdade, o médico administrou-lhe desta vez uma injeção de água destilada e os resultados não se fizeram esperar tal como acontecera com a recaída quando soube que o medicamento ere inócuo.

Convocar a intuição para resolver um problema

Dissemos anteriormente que a intuição surge sem aviso. Mas também há formas de a estimularmos ou invocarmos. Suponhamos que queremos encontrar a resposta para um problema. Este pode ser um problema de saúde, a invenção de um aparelho ou uma questão espiritual. Começamos por descobrir quaisquer factos relevantes ou informações acerca do problema, algo como uma chuva de ideias. Em seguida, analisamos e examinamos as diferentes perspetivas e maneiras de ver o mesmo problema com a nossa mente racional.

Desta forma, podemos identificar a questão central, o verdadeiro âmago do problema que requer uma solução. Esta questão chave, uma vez encontrada, deve ser mantida em mente, mas em segundo plano, sem pensarmos nela diretamente. Com esta atitude, devemos entrar em meditação, sem pensar em nada, ou deixar passar uma noite de sono. De um momento para o outro, a intuição pode fazer aflorar à nossa consciência a solução para o problema.

Atirar pedras à lua
Conta-se que numa aldeia havia um rapaz que todas as noites em que via a lua, lhe atirava pedras, enquanto que os seus companheiros tinham alvos bem mais próximos. É certo que nunca atingiu a lua com uma pedrada, mas era o moço que atirava uma pedra mais longe.

Esta história sugere-nos que a mente é elástica, que podemos exercitá-la, que em vez de fixarmos para nós mesmos objetivos fáceis e próximos, podemos fixar objetivos mais a longo prazo e bem mais difíceis. Podemos não chegar lá, tal como o moço que nunca atingiu a lua com uma pedra, mas certamente chegaremos muito mais longe do que se fixarmos objetivos próximos, correndo inclusive o risco de nem estes atingirmos.

FORÇA DE VONTADE
A força não vem da capacidade física. Vem de uma vontade indomável.) - Mahatma Gandhi

A força de vontade é a chave do sucesso. As pessoas bem-sucedidas esforçam-se independentemente do que sentem, aplicando a sua vontade para ultrapassar a apatia, a dúvida ou o medo.) Dan Millman

Força de vontade, autodisciplina, autocontrolo, determinação são, de alguma forma, sinónimos. O que caracteriza a força de vontade é a capacidade de implementar os planos, projetos e decisões que a mente tomou, sem nos deixarmos influenciar ou tentar pelas resistências naturais, pela preguiça, gratificações imediatas, racionalizações, adiamentos e outros aliciantes da mente e da “lei do mínimo esforço”.

A força de vontade é a capacidade de autorregulação de si mesmo por si mesmo; é o exercício da liberdade e da autodeterminação perante pensamentos, sentimentos e impulsos indesejáveis porque nos tirariam do caminho que a mente traçou. A força de vontade é manter-se fiel ao que se decidiu, aconteça o que acontecer.

Alguns psicólogos chegam a afirmar que é precisamente a força de vontade e não a inteligência que faz de nós verdadeiros seres humanos, por comparação com os outros seres vivos. Para além dos humanos, nenhum outro ser vivo tem a capacidade de controlar os próprios impulsos, instintos e desejos.

Desde sempre que a sobrevivência tem sido um esforço social, um trabalho de equipa entre os seres humanos. A vida em grupo, em comunidade, exige que cada indivíduo seja capaz de controlar os seus impulsos para colaborar com os outros. Ser expulso do grupo significa morte; por isso, ao longo dos séculos, por intermédio da cultura, a sociedade exerceu uma pressão sobre o cérebro individual com o propósito de desenvolver uma capacidade autorreflexiva, autocrítica e de autocontrolo.

Uma vez que a sociedade e a cultura atuais exercem menos poder sobre a pessoa, esta é mais individualista e paradoxalmente menos livre. Teoricamente, deveria ser mais livre para poder fazer o que quisesse, mas a falta de autodisciplina tirou-lhe a liberdade de agir e, sem esta, não há liberdade para agir efetivamente. Nunca como hoje houve tantos adictos a substâncias e tanta falta de controlo sobre a ira com os consequentes crimes de violência doméstica, promiscuidade no sexo, fazendo aumentar exponencialmente o divórcio que em Portugal se situa em 70%.

“Morra Marta, morra farta” - Nunca a sociedade teve tanta gente parasita, preguiçosa, sem valores nem princípios, para quem viver é sinónimo de estar vivo. Vivem superficialmente, ou seja, sobrevivem, estão vivos sem projeto nem plano, vão de prazer em prazer até o corpo aguentar.

Na sociedade tradicional, a pressão social treinava a força de vontade, era como um ginásio desta e as pessoas aprendiam autocontrolo e autodisciplina. A falta desta pressão deixa as crianças e os jovens órfãos de uma boa pedagogia. Um falso conceito de liberdade deixa os jovens entregues a si mesmos, perante decisões para as quais não estão ainda preparados e perante uma liberdade para a qual não têm formação suficiente que lhes permita tirar bom partido dela, tantos em benefício próprio como da sociedade.

Kelly McGonigal, leciona na Universidade de Stanford uma cadeira chamada “A ciência da força de vontade”. Segundo ela, há três tipos de força de vontade e cada um destes tipos está localizado num lugar diferente do lobo pré-frontal do nosso cérebro:

•    Poder “I won’t” (não vou) – a capacidade para resistir às tentações; – situa-se na região direita do lobo pré-frontal do córtex.
•    Poder “I will” (vou) – a capacidade para fazer o que a inteligência decidiu fazer; - situa-se na região esquerda do lobo pré-frontal do córtex.
•    Poder “I want” (quero) – reconhecimento da existência de um projeto de longo alcance; – situa-se na parte baixa, a meio do lobo pré-frontal do córtex.
Como prova da veracidade de que a força de vontade tem no nosso cérebro um lugar preciso, todos os autores citam o caso de Phineas Cage (1848) um calmo e respeitável cavalheiro, disciplinado, autocontido, grande trabalhador que, devido a um acidente em que lesionou o lobo pré-frontal do cérebro, se transformou numa pessoa indisciplinada, impulsiva, impaciente, o exato oposto do que era antes.

Crescer em força de vontade
Não é claro que seja possível crescer em inteligência, mas há a certeza de que é possível crescer em força de vontade. Crescer em força de vontade traz benefícios a todas as áreas e aspetos da nossa vida. Controlar-se a si mesmo é o maior dos impérios, diz uma expressão popular. A pessoa que possui autocontrolo é mais saudável, mais feliz, as relações que estabelece com os outros são mais seguras e verdadeiras, é bem-sucedida na vida profissional e na vida emocional e familiar e mais fiel aos compromissos e palavra dada.

A força de vontade pode ser treinada, podemos crescer em força de vontade. Tal como se aprende a tocar piano tocando piano, a prática frequente de pequenos atos que requerem força de vontade aumenta-a. A força de vontade é como um músculo que pode ser exercitado e, quanto mais se exercita, mais forte se torna. Vejamos algumas dessas práticas de reforço:

Adiar gratificações

“Guarda que comer não guardes que fazer” provérbio português

A capacidade psíquica para adiar a gratificação ou prazer que se sente pela satisfação das nossas necessidades é um exercício que pode aumentar a força de vontade, como o prova o famoso “Teste da Guloseima”.

A várias crianças entre os 4 e os 5 anos foi dada individualmente a possibilidade de comerem uma guloseima no momento ou duas se aguardassem 15 minutos pela segunda sem comer a primeira. Com o decorrer dos anos, seguido o percurso destas crianças, ficou provado que aquelas que conseguiram adiar a gratificação, não comendo a guloseima durante os 15 minutos estabelecidos, foram mais bem-sucedidas que aquelas que não conseguiram adiar a gratificação.


Já não somos crianças, mas podemos praticar exercícios semelhantes no nosso dia a dia, e usar até a gratificação como prémio por ter conseguido fazer o que nos propusemos fazer. Por exemplo, tenho vontade de comer um chocolate, mas não vou fazer isso enquanto não terminar este texto. Muitos exercícios deste estilo acabam certamente por fortalecer a nossa força de vontade: esta aumenta o nosso autocontrolo e autodisciplina e, por fim, a nossa autoestima.

Meditação
Para crescer em força de vontade, temos que fortalecer o nosso mundo interior, fortalecer o nosso Eu. A meditação ou a oração escava um vazio dentro de nós, como dizia o Papa Bento XVI. Este vazio é ocupado por Deus, evidentemente, mas também por nós mesmos, pois Deus é no entender de Santo Agostinho, Intimior intimo meo, ou seja, está para além de mim mesmo. A meditação leva-me a conhecer-me melhor, a conhecer os meus talentos e as minhas fraquezas.

A neurociência comprova que a meditação fortalece a zona dorso-lateral do córtex pré-frontal, região do cérebro onde se encontra localizada a força de vontade. Por intermédio da meditação, damo-nos mais conta dos nossos diálogos interiores e podemos assim diferenciar a voz da preguiça e do mínimo esforço da gratificação imediata, divorciarmo-nos dela para passar a identificarmo-nos com vozes positivas e ideais.

Por que razão a meditação nos faz crescer em força de vontade? Porque a prática desta aumenta o fluxo sanguíneo no lobo pré-frontal do cérebro. Ou seja, o cérebro adapta-se à meditação da mesma forma que o músculo se adapta ao exercício físico. Se este nos faz ganhar mais músculo nas pernas, nos braços e no peito, a meditação faz com que o cérebro ganhe mais conexões neuronais.  

Cada vez que vencemos a tentação e triunfamos sobre as vozes da fraca força de vontade, estamos a fortalecê-la. O contrário também é verdade: cada vez que sucumbimos a uma daquelas vozes, ficamos mais fracos. O córtex pré-frontal é a zona do nosso cérebro que mais tem crescido em tamanho e volume com a evolução. Robert Sapolsky, neurobiólogo da universidade de Stanford acredita que a função desta zona do cérebro é encorajar-nos a fazer o que mais custa e o que mais benefícios nos traz a longo prazo.

A forma de meditar é simples: sentar-se confortavelmente numa cadeira com a coluna direita, fechar os olhos ou deixá-los semicerrados para evitar o sono. Concentrar-se na respiração, sentir o ar entrando e saindo pelas fossas nasais, brônquios e pulmões. Varrer a mente de todos os pensamentos, sempre que um pensamento aflora à nossa mente, convidá-lo a sair, parar o pensamento no momento em que nos damos conta de que a nossa atenção se desviou da respiração, estando presa a um pensamento. Parece difícil, mas com o tempo chega-se lá; basta começar com 5 minutos por dia, incrementando o tempo na medida em que começam a notar-se os resultados.

Jejuar
Os cristãos jejuavam duas vezes por semana, hoje jejua-se duas vezes por ano. Esta era uma prática muito importante de autocontrolo. Na Etiópia ainda se observa e, de facto, as pessoas têm muito mais autocontrolo sobre si mesmas. Sabemos pela Bíblia que Esaú vendeu ao seu irmão Jacob o direito de sucessão por um prato de lentilhas, pois não resistiu à fome. Quando consegues dizer que não à comida necessária para sobreviver, consegues dizer que não a qualquer substância que possa tirar-te a liberdade.

Nos meus anos de Etiópia, de facto, maravilhava-me a capacidade de autocontrolo daquelas gentes, autocontrolo sobre todos os impulsos, principalmente sobre a ira. Eles pressupunham que também nós, por sermos sacerdotes, exercíamos sobre nós mesmos o mesmo autocontrolo e não entendiam como um sacerdote não conseguia jejuar e ainda entendiam menos que um sacerdote fosse adicto a uma substância como o álcool e o tabaco.

Exercício
Sobretudo correr aumenta a força de vontade, reduz o stress, aumenta o autocontrolo e faz com que a mente fique mais desperta. Tenho notado, ao longo dos anos, que a maior parte das minhas ideias surge no decurso de uma corrida. Quando estou num impasse e não sei como continuar um texto, vou correr e, no decurso da corrida, as ideias afluem à minha mente como um manancial de água. O problema reside em recordá-las depois, ao regressar da corrida.

A própria corrida é um exercício de força de vontade porque, quando se começa a correr, enquanto o corpo e o sistema cardiovascular e respiratório ainda não se habituaram ao novo ritmo, experimentamos o que eu chamo de falso cansaço com a correspondente tentação de desistir.

Se a pessoa para, já não consegue voltar a correr depois; mas se resistir à tentação de parar, acaba por chegar a um patamar em que o corpo se habitua e corre sem se cansar; nesse ponto, a pessoa sente que poderia correr até ao fim do mundo. É claro que depois de uns quilómetros, aparece o verdadeiro cansaço que não se nota na respiração, mas na falta de energia em geral. A sensação de bem-estar depois da corrida vale bem o esforço despendido nela.

MOTIVAÇÃO
“Dai-me um ponto de apoio e levantarei o mundo.” Arquimedes

Arquimedes usou de uma força de expressão para enaltecer o princípio da alavanca e não para se vangloriar da sua força física. Todos temos essa experiência e certamente já vimos por exemplo um pedreiro levantar uma pedra com a ajuda de uma alavanca. Quanto maior for a alavanca, ou seja, quanto mais longe da pedra aplicarmos a nossa força, mais fácil será levantar essa pedra.

A motivação funciona de facto no nosso psiquismo como uma alavanca, pois transforma o difícil em fácil, o impossível em possível. Inspira a nossa inteligência, reúne as nossas forças, motiva a nossa ação, tira força da fraqueza. A motivação dá constância à força de vontade quando esta está prestes a sucumbir perante as adversidades.

Dos três fatores – inteligência, – força de vontade e motivação - este último é o mais difícil de definir. Tem a ver com a inteligência, pois se refere a um objetivo que a inteligência definiu, programou e decidiu, embora não tenha a mesma natureza que a inteligência.

Por outro lado, também tem a ver com a força de vontade, já que é a motivação que agarra a força de vontade e lhe dá um sentido, uma direção, que a comanda de alguma forma. No entanto, em si mesma, a motivação não é a força de vontade, nem a força de vontade é a motivação.

Estudámos que a combustão tem três componentes: o combustível, o comburente e a ignição. Podemos utilizar estes três componentes como comparação ou metáfora do que são os componentes do sucesso. Utilizando os componentes da combustão como metáfora que explica a mecânica da nossa ação, o combustível representa a inteligência, o comburente a força de vontade, a ignição a motivação.

A inteligência - é o combustível, pois é ela que nos fornece a matéria prima, a razão da nossa luta, o móbil da nossa batalha, é ela que decide onde aplicar a força de vontade, o projeto a seguir, é ela que traça o plano de ação, é a arquiteta.

A força de vontade - é o comburente, o oxigénio de que toda a combustão necessita para acontecer: se faltar o comburente, mesmo que ainda exista combustível, o fogo apaga-se. A força de vontade é o engenheiro que, em constante contacto com a arquiteta, aciona os planos desta última.

A motivação
- é a ignição, é o que coloca tudo em movimento, é a chispa, o fogo e, tal como este, aparece e desaparece misteriosamente. É convocada e desconvocada; de alguma forma, a motivação comanda tanto a inteligência como a força de vontade e é provavelmente o fator mais determinante do processo, pois é ela que combina inteligência e força de vontade, coloca-se no meio das duas e orienta e manobra as duas.

Tomemos como exemplo o pai que não gosta do turno da noite, mas que vai trabalhar pois ganha mais dinheiro e assim os seus filhos podem tirar um curso superior e terem uma vida diferente. A inteligência decidiu, com base no salário que vai ganhar e no que pode fazer com mais dinheiro; a força de vontade é o que faz com que se levante todos os dias, o que o move e faz aguentar todo o tipo de sacrifício; mas o motivo principal é o amor pelos filhos, essa é a motivação que espevita a inteligência, encontra soluções e agarra na força de vontade para executar uma tarefa.

Temos também os filmes de Hollywood que começam com um crime horrendo a ser cometido contra alguém - um polícia que fica sem mulher e sem filhos, mortos por um gang. O resto do filme mostra a vingança deste senhor que mata cada um dos que participaram naquele crime.

São muitas as privações, os sacrifícios que requerem uma grande força de vontade; também é necessário muito trabalho mental para planear até ao menor detalhe a caça a cada um dos criminosos, as ratoeiras a colocar; mas tudo isto não é nada sem a motivação, a sede de vingança pela morte da mulher e dos filhos: esta sede de vingança é a chispa que o mantém focado no plano, custe o que custar.

Detesto os inconstantes, mas amo a tua lei Salmo 119, 113 – Na vida, quem triunfa mais não é o que tem mais força de vontade, nem o que tem mais inteligência, mas o que tem uma maior motivação. Esta última funciona na nossa vida como a alavanca de Arquimedes, faz do círculo um quadrado, do quadrado um círculo, do impossível possível, transforma as dificuldades em facilidades, torna os ideais exequíveis, os sonhos realidade, as utopias plausíveis.  

Quem deita a mão ao arado e olha para traz não é digno de mim Lucas 9, 62. - A pessoa motivada permanece focada no seu objetivo, como o burro na cenoura que está à sua frente e, quase como um robô obsessivo não olha para a direita nem para a esquerda, está agarrado ao objetivo que não larga por nada; o fracasso para estas pessoas não é uma opção, não é possível.

Podem cair mil à tua esquerda e dez mil à tua direita, mas tu não serás atingido
. Salmo 91, 7 – A pessoa motivada possui grande coragem, não teme o risco, não pensa duas vezes, não se deixa influenciar nem tentar pelo meio ambiente, por mais adverso que este seja. A sua motivação vem de dentro, só ele a possui, só ele a conhece, é essa que o faz andar, que o faz caminhar sem sentir as agruras do caminho.

Querer é poder, quien algo quiere algo le cuesta – Querer é a motivação, o poder é a inteligência que divisa o plano, a força de vontade é o preço, é o que vai custar esse plano, são os custos da operação. Usando o paradigma humano noutro texto descrito, a inteligência faz-nos conscientes de que vivemos no Egito e divisa um plano de saída; o deserto é a força de vontade, a terra prometida é a motivação.  

Triunfa mais na vida quem está mais motivado que quem tem mais força de vontade ou inteligência. Quanto mais forte é a motivação, maior é a probabilidade de sucesso. O mesmo não pode ser dito da inteligência e da força de vontade. A pessoa desmotivada é como um corpo morto, sem o espírito que dá a vida.

Como a própria palavra indica, a motivação é o que faz mover, é o móbil, é a razão, o fator que aglutina os outros dois. Por isso, alguns autores entendem que o motor da ação não é a inteligência nem a força de vontade, mas a motivação que dá o pontapé de saída para todo o tipo de ação.
Pe. Jorge Amaro, IMC





Sem comentários:

Enviar um comentário