15 de dezembro de 2017

Fátima: Teologia da mensagem

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Feliz Natal e próspero ano novo!
O centro da mensagem de Fátima, é o mistério da Santíssima Trindade; por ser objeto de uma oração ensinada pelo Anjo e outra por Nossa Senhora, podemos dizer que as aparições de Fátima, abrem e fecham com este mistério.

Lúcia, porém, disse, ao então cardeal Ratzinger, que o objetivo “prático” de todas as aparições era fazer crescer o povo de Deus nas virtudes teologais da Fé, Esperança e Caridade, que estão presentes na mensagem desde a primeira oração ensinada pelo Anjo: Meu Deus eu creio, Adoro, Espero e Amo-vos…

No meu entender, ao contrário de alguns teólogos, Guadalupe, Lourdes e Fátima são teofanias e não marianofanias. Quando os pastorinhos inquiriram de onde era a Senhora ela respondeu que era do Céu; portanto foi o Céu que se manifestou por intermédio dela e a mensagem que veio comunicar não era dela, mas sim do Céu, ou seja, de Deus.

As revelações de Deus acontecem em diferentes tempos, em diferentes lugares, e por intermédio de diferentes pessoas. A teofania de Fátima, é um pouco mais complexa que outras teofanias, pois acontece em diferentes lugares, por diferentes pessoas, e em tempos diferentes.  Assim podemos distinguir três ciclos diferentes nas aparições de Fátima:

Ciclo angélico nas Aparições do anjo em 1916
deixando de fora as experiências da Lúcia e suas amigas no ano 1915 por serem muito difusas e inconsequentes. Mesmo assim, puseram a Lúcia de sobreaviso para as aparições do anjo no ano seguinte, não já com estas amigas, mas sim com os seus primos. Em linha com o papel dos anjos na bíblia, este anjo é um mensageiro, e tal como o Arcanjo Gabriel anunciou a Maria que ela tinha sido escolhida por Deus para ser a mãe do Verbo encarnado, o anjo também anuncia às crianças que foram escolhidas:

“Os corações de Jesus e de Maria, estão atentos à voz das vossas súplicas (…) têm sobre vós desígnios de misericórdia. No caso de Fátima, o anjo extrapola o papel de só mensageiro e prepara as crianças para as verdadeiras aparições, as de Nossa Senhora. Algo assim como João Batista, percursor do Messias, o anjo prepara as crianças para o encontro com o sobrenatural.

Talvez seja por isso que os encontros com o anjo tenham sido de diferente natureza; as crianças referem que os três encontros com o anjo foram extenuantes; sentiam-se sugados das suas energias e ficavam quase fora de si; ao contrário os encontros com a Senhora deixavam-nos radiantes, confortados e cheios de energia.

Há um outro pormenor que pode suscitar dúvidas em alguém. Nas representações de anjos que vemos nas esculturas, nas pinturas, nos teatros e filmes, e é claro no imaginário dos pastorinhos, os anjos sempre aparecem com asas; O anjo de Fátima, porém, tal como os pastorinhos o descrevem, não tinha asas. A razão está com os pastorinhos e até podíamos ver aqui mais uma prova da veracidade destas aparições, ou manifestações do divino; os anjos de facto, na Bíblia, não têm asas, os que têm asas são os Querubins e os Serafins de guarda à Arca da Aliança.

Ciclo Mariano as aparições de Nossa Senhora em 1917
O centro da mensagem de Fátima são as aparições marianas, ocorridas de maio a outubro de 1917; as do anjo, como dissemos, foram uma preparação para estas, e as seguintes uma ajuda e interpretação destas.

Nas aparições da virgem se revela o núcleo doutrinal que é vasto, completo e a razão pela qual Fátima é a aparição mais doutrinal, mais profética e se quisermos também a mais social e política, pois, inspirou e influenciou medidas sociais e políticas concretas no século XX.

Ciclo do Coração de Maria aparições em Pontevedra 1925-1926 e Tuy 1929
Nestas aparições já anos depois, e quando a Lúcia ainda talvez não estava habituada à solidão a que fora votada depois da morte dos seus primos, a Senhora favoreceu-a com estas aparições, como aliás já o tinha feito com a sua prima Jacinta no leito de morte, para cumprir o que lhe prometera, de nunca a abandonar, dar força e a ajudar na interpretação da mensagem.

Estas visões tiveram para Lúcia o efeito que a transfiguração do Senhor teve para Ele e os apóstolos, o de confirmar a Lúcia no rumo que tinha tomado, tanto em relação à interpretação da mensagem como ao percurso da sua vida na terra, e a razão pela qual tinha sido deixada cá. Estas aparições também serviram para a Lúcia tirar dúvidas e clarificar alguns aspetos da mensagem sobretudo no que respeita à devoção dos cinco primeiros sábados.

As dimensões da mensagem de Fátima
Como aparição de maior amplitude doutrinal, no entender de muitos teólogos, Fátima é toda uma “Suma Teológica” pois toca todos os temas que são essências à nossa fé e dá pistas para os viver, tanto no campo da espiritualidade individual como litúrgica, de uma forma bem prática e pedagógica.

Dimensão sacrificial – Entendida como sacrifício eucarístico, e oferta de si mesmo no contexto da eucaristia e da vida, ou seja, fazer da vida uma eucaristia. Quereis oferecer-vos… Logo na primeira aparição mariana, parafraseando Tiago e João que pediram sentar-se um à direita e o outro à esquerda do Senhor no seu Reino, mas primeiro teriam de beber do mesmo cálice do Senhor (Marcos 10,35-45); assim os pastorinhos pediram para ir para o Céu, mas primeiro a Senhora perguntou-lhe se se queriam oferecer…

Cristo foi o que deu a sua vida, o cristão, ou seguidor de Cristo, é o que ama os outros não como a si mesmo, mas sim como Jesus nos amou, mais que a si mesmo, ou seja, dando a vida. (João 13,34-35)

Dimensão escatológica – Traduz a advertência evangélica, “se não vos converteis perecereis do mesmo modo” (Lucas 13, 3). Trata das desgraças que pendem sobre o mundo por causa do pecado. Trata também da conversão dos pecadores, e como nos podemos implicar nela e a visão profética e pedagógica do inferno, assim como a forma de o evitar.

Dimensão missionária - A Missão é transversal a toda a mensagem de Fátima; todas as práticas que Nossa Senhora pede de oração, sacrifícios, o Rosário, a consagração, os primeiros Sábados, têm como objetivo os outros, ou seja, a conversão e salvação dos pecadores e não a santificação pessoal. O seguidor e devoto da mensagem de Fátima converte-se rezando pela conversão dos outros. Tudo é orientado para os outros é, portanto, uma espiritualidade “altruísta” e não “egocentrista”.

Ao contrário da maioria dos Católicos que, naquele e também neste tempo, vivem obcecados com ganhar o Céu e o bem que fazem tem como finalidade a sua salvação individual, os pastorinhos nada fizeram para salvar as suas almas, pois a Senhora já tinha dito que os levaria para o Céu.

É como se praticassem a teologia da reforma protestante, e agora também católica, segundo a qual o Céu é gratuito para todos pois Cristo pagou o bilhete de entrada por inteiro. Com o Céu garantido os pastorinhos dedicaram a sua vida a garanti-lo também para os outros.

Assim sendo, os pastorinhos tudo o que faziam era Missão, em forma de “Apostolado da Oração”, na qual se distinguiu Francisco, buscando tempo e lugares para estar a sós com Deus consolando-o, e em forma de “Apostolado do Sacrifício”, no qual se distinguiu Jacinta que era incansável em encontrar ocasiões para fazer mais e mais sacríficos, pois ela queria que toda a gente também fosse para o Céu.

Dimensão mariana – Devoção ao imaculado coração de Maria, o Rosário como contemplação com Maria do mistério de Cristo. A manifestação da Senhora identificando-se como senhora do Rosário.

Dimensão eclesial – Comunhão solidária de toda a igreja, na oração pela paz no mundo e pela conversão dos pecadores.

Dimensão Petrina – Fátima começou com um apelo do papa e sempre envolveu os papas; o que não queria deixar-se envolver por ela foi precisamente o maior protagonista da sua mensagem, João Paulo II.

Dimensão profética – Fátima representou para milhares de cristãos, o opor o exército azul de Maria - o ativismo evangélico, contra o exército vermelho da Rússia - o ateísmo militante. O ateísmo militante continua a existir mesmo sem a tutela da Rússia, nos maçons e certos grupos de agnósticos que sempre tentam influenciar políticas contra a Igreja.

Neste tempo como em todo o tempo, Fátima é uma chamada perene a ser ativistas do evangelho dando razões da nossa esperança (1 Pedro 3:15). Ou como alguém dizia, depois do Concílio Vaticano II, um apelo a ser cristãos como membros de um partido político e militantes como membros da Igreja.

Dimensão pedagógico-religioso – Aprendizagem de orações, devoções práticas de piedade. Reparar consolar e desagravar o Sagrado Coração de Jesus e o Imaculado Coração de Maria.

Encarnar a mensagem de Fátima
É pôr em prática aquilo que Maria pediu aos pastorinhos e que eles generosamente satisfizeram, encarnando todos os aspetos desta mensagem. Toca a nós fazer o mesmo se somos amantes de Maria nossa mãe e se, tal como os pastorinhos, queremos colaborar na redenção do mundo.

Parar de ofender a Jesus – Foi o primeiro que os pastorinhos fizeram; primeiro deixaram de ser pecadores, ganhando uma consciência mais desperta que lhes permitia julgar cada um dos seus atos e expor o pecado nas suas vidas por pequeno que fosse.

Rezar o rosário todos os dias – Pelo rosário somos levados das mãos de Maria nossa mãe, a contemplar os mistérios da Nossa Redenção, ou seja, a vida do Seu filho; como ela o conhece mais que ninguém, ela, mais que ninguém nos pode introduzir ao seu filho, à sua vida e doutrina.

Oferecer sacrifícios – Ao oferecer sacrifícios estamos a pôr em prática a razão pela qual participamos na eucaristia. Ao fim da Missa em Latim, o sacerdote despede as pessoas dizendo, “Ite missa est” o qual significa não só que a missa termina, mas que estais em Missão; ou seja, termina a Missa começa a Missão.

Parte dessa missão é trazer para a vida a dimensão eucarística; comemos o corpo entregado e bebemos o sangue derramado, para sermos nós mesmos nas nossas vidas, corpo entregado e sangue derramado. Participamos na eucaristia para sermos eucarísticos e fazermos da nossa vida uma doação pela redenção dos outros. Isto fazemos, quando, como os pastorinhos, nos oferecemos ao negarmo-nos a nós mesmos, abraçando a cruz de Cristo todos os dias, negando-nos a nós mesmos, para afirmar o outro nas nossas vidas.

Devoção ao Imaculado Coração de Maria – A oração assídua coloca-nos diante de Deus que atua como um espelho que nos faz ver quem realmente somos; uma falsa imagem de nós mesmo leva a uma falsa imagem de Deus. A oração purifica as duas imagens de Deus e de nós próprios; por outro lado a oração ao Imaculado Coração de Maria purifica o nosso coração e trona-o semelhante ao dela. É do nosso interesse esta devoção pois segundo a Bem-aventurança, só os puros de coração a que vêm a Deus.

Observância dos 5 primeiros Sábados – São uma bela campanha para revigorar a nossa fé e a nossa prática cristã. São como os exercícios espirituais de Santo Inácio ou como os cursilhos de cristandade; é um começar de novo, o despertar de uma fé adormecida que perdeu o sal que dava sentido e sabor à vida que deixou, por isso, de ser luz do mundo.

Usar o escapulário – Esta prática que chegou a ser muito popular, ainda não perdeu o seu valor. Não é que o escapulário seja um talismã que nos protege de por si sem a nossa colaboração; isso seria idolatria. O uso do escapulário serve para nos recordar, hora a hora, minuto a minuto, que estamos chamados a revestir-nos de Cristo como diz São Paulo. (Efésios 4, 22-24)

Conclusão
Temos, porém, esse tesouro em vasos de barro, para demonstrar que este poder que a tudo excede provém de Deus e não de nós mesmos. (2 Coríntios 4:7)

Ao fim desta longa digressão e estudo do acontecimento Fátima, o seu significado e mensagem, apercebo-me da riqueza, da profundidade doutrinal, profética, social e politica da mensagem. Quase nem posso acreditar como possa ter sido depositada em três crianças de tão tenra idade completamente incultas, e como apesar destas limitações, como dizemos em bom português, elas deram bem conta do recado no viver, anunciar e custodiar a mensagem de Fátima, apesar da incredulidade das suas próprias famílias a da Igreja e os obstáculos e ameaças do poder político e administrativo.

Quero terminar esta reflexão da mesma forma que a comecei: O mistério escondido aos sábios, orgulhosos da sua sabedoria, foi revelado aos simples e aceite por aquele tipo de sábios que são os verdadeiros, os que mantém a mente aberta, sem preconceitos, os que reconhecem que só sabem que nada sabem. (Mateus 11, 25)
Pe. Jorge Amaro, IMC

1 de dezembro de 2017

Fátima: "Rezai o Rosário todos os dias"

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Em Portugal chama-se terço, o que nos demais países se chama Rosário. O que nós rezávamos, de facto, era um terço do Rosário que completo seriam três terços, somando o total de 150 Ave Marias. 150 são também o número de Salmos, do livro com o mesmo nome, que faz parte da literatura sapiencial do Antigo Testamento.

De aí alguém dizer que o rosário completo era o breviário do povo ou dos leigos que não podiam como os clérigos e os religiosos rezar a salmodia.

O rosário completo eram, portanto, três terços que se rezavam meditando no primeiro os Mistérios Gozosos, que correspondiam ao nascimento e infância de Jesus: no segundo os mistérios Dolorosos, que correspondiam à Sua Paixão e Morte: no terceiro os mistérios Gloriosos que correspondiam à sua Ressurreição e Ascensão aos Céus.

A Igreja tardou em descobrir que o Rosário estava incompleto com tão só a meditação dos mistérios da encarnação nascimento, paixão e morte e Ressurreição do Senhor. Faltava a vida pública na qual Jesus de Nazaré, pela sua pregação, as suas atitudes e forma de viver e atuar, modela para nós o homem novo, aquele que é caminho verdade e vida para todo o ser humano.

Com a criação e integração dos Mistérios Luminosos pelo Papa João Paulo II numa carta apostólica intitulada Rosarium Virginis Mariae, escrita em 2002, a lógica dos três terços serem um Rosário completo desfez-se. O Rosário completo são agora quatro “terços” de 50 Avé Marias cada um fazendo o total de 200 e não de 150 como era antes.

Em concordância com esta nova realidade, ao que antes chamávamos “Terço”, deveríamos agora chamar Quarto, pois ao incluir a vida pública de Jesus nos Mistérios Luminosos, são agora quatro os mistérios a contemplar. Como não vamos rebatizar o “Terço de “Quarto”, o melhor seria abandonarmos esta palavra, e, no seu lugar, como o resto da cristandade sempre fez, usar a palavra Rosário.

A Composição do Rosário
Chama-se “Rosário”, porque as 150, agora 200, ave-marias, entrelaçadas em grupos de 10, com a oração do Pai Nosso, do Glória e as meditações dos mistérios da vida de Jesus, e da nossa redenção, formam uma “Coroa de Rosas”, que se oferece a Maria, Mãe do Senhor e nossa Mãe.

Os vinte mistérios da vida do Senhor repartem-se em quatro series de 5 mistérios cada uma. Em cada Rosário, rezamos apenas os cinco mistérios de uma destas series:

Nos Mistérios Gozosos, meditamos o começo da redenção da humanidade, desde a anunciação a Maria, e a encarnação do filho de Deus no seu seio, até à adolescência de Jesus.

Nos Mistérios Luminosos, meditamos os momentos mais importantes da vida pública de Jesus, desde a sua investidura no Batismo até à instituição da Eucaristia como memorial da sua paixão. É nos anos da Sua vida pública que Jesus verdadeiramente, se revela como sendo a Luz do Mundo (Jo 8, 12), pelas suas atitudes ante as mais diversas situações da vida em que se foi encontrando, pela doutrina que ensinou, e pelos seus atos.

Nos Mistérios Dolorosos, meditamos o processo a paixão e morte de Jesus, desde a sua agonia no jardim das Oliveiras até ao ultimo suspiro no alto da cruz. Quando dizemos que Jesus morreu pelos nossos pecados, quer dizer que saldou a dívida que nós eramos incapazes de pagar; mas também quer dizer que os pecados dos que intervieram na sua morte ainda hoje se cometem, pelo que podemos concluir que foi o pecado de toda a humanidade que o matou.

Nos Mistérios Gloriosos, meditamos o triunfo de Jesus sobre a morte com a Sua Ressurreição. A morte foi vencida assim como o pecado que a causa. Depois da Ressurreição de Jesus, a morte já não é o destino final da humanidade, mas sim uma passagem para a vida eterna. A vida de Jesus que começa com o Sim de Maria ao plano de Deus termina agora com a glorificação daquela que é para todos, modelo de vida cristã.

O Pai Nosso – O Pai Nosso, que intercala cada mistério, é muito mais do que uma simples oração que o Senhor nos ensinou para recitar ocasionalmente. Ela contém o mais importante do Evangelho de uma forma resumida; é neste sentido todo um Evangelho de bolso pois contem o que devemos conhecer e praticar.

Como é composto por vários enunciados, sem relação uns com os outros, pode ser olhada como uma lista, como as listas de compras que fazemos para não nos esquecermos de nada. Esta lista diz respeito ao protocolo da nossa relação com Deus, ou seja, como deve estar estruturada a nossa oração; como nos devemos dirigir a Deus, como louvá-Lo, o que devemos pedir, em que ordem, quando e como. Portanto, mais que uma oração, é fundamentalmente um guia pratico de oração e vida.

A Ave Maria – Divide-se em duas partes; a primeira é bíblica e é composta pelas saudações do Anjo Gabriel e da Sua prima Isabel; a segunda tem origem na fé da Igreja, não se sabe como nem quando nem onde começou a ser usada. Por isso a Ave-maria representa a perfeita união entre a Bíblia como Palavra de Deus e a Igreja como comunidade dos crentes.

Num movimento ascendente, a primeira parte, decalcada da Bíblia, é constituída por 5 escadas que sobem até Jesus. Num movimento descendente a segunda parte é constituída também por 5 escadas que descem até a realidade humana, a nossa morte.

Não pode ser entendida pelos advogados de “sola fide sola scriptura solus christus” pois nela se unem de uma forma harmoniosa a Escritura, a Palavra de Deus, descrita na primeira parte, com a Tradição, ou seja, a história da fé da comunidade cristã ao longo dos tempos plasmada na segunda parte. “Jesus” alfa e Omega, principio e fim e centro da história é a cerneira que une as duas partes.

Gloria ao Pai – É a invocação de Deus como Uno e Trino. Uma só divindade em três pessoas diferentes unidas num triângulo de amor. É a solução à dialética da filosofia grega entre o uno e o múltiplo. Esta oração também nos recorda que feito à imagem e semelhança de Deus, o ser humano também é uno e trino: não existe nem subsiste fora da família.

Origem e história do Rosário
Como instrumento de oração as contas do rosário, têm a sua origem na India, no terceiro século antes de Cristo. No cristianismo foram os padres do deserto do terceiro e quarto século que começaram a usar instrumento de contagem de orações, sobretudo do Pai-Nosso.

Por outro lado, na antiguidade os gregos e os romanos costumavam coroar, com uma coroa de Rosas, as estátuas dos seus deuses como prova de amor e gratidão. Talvez baseada nesta tradição as mulheres cristãs que eram levadas ao martírio iam vestidas a rigor levando nas suas cabeças uma coroa de rosas, como símbolo de alegria e entrega caminhando ao encontro do esposo, Cristo. Depois do seu martírio os cristãos recolhiam estas coroas e rezavam, uma oração por cada rosa, pela alma dos mártires.

A Lúcia e a Jacinta de Fátima gostavam de usar flores no cabelo. No dia das aparições os três vestiam as melhores roupas que tinham como se fossem à missa ao Domingo; as duas meninas colocavam flores no cabelo em especial a Jacinta que foi fotografada usando uma coroa de rosas na cabeça por ocasião das aparições.

A oração do rosário surge no ano 800 à sombra dos mosteiros como saltério dos leigos. Foi só no ano 1214, no entanto que a Igreja recebeu o rosário na sua forma presente. A tradição diz que foi dado à Igreja por Santo Domingos de Gusmão que por sua vez o recebeu da Virgem Maria como arma poderosa contra os inimigos da fé.

O rosário ganhou grande pujança depois da batalha naval de Lepanto, na qual os cristãos venceram os turcos eliminando para sempre o perigo dos muçulmanos subjugarem o cristianismo. Antes da batalha, o Papa Pio V pediu aos cristãos que rezassem o rosário para apoiarem a frota cristã, pelo que depois da vitória, foi instituída a festa da Senhora das Vitórias no dia da batalha a 7 de outubro de 1571, mais tarde mudada para Senhora do Rosário.

As aparições marianas, em especial a de Fátima no seu insistente apelo a rezar o Rosário todos os dias, fizeram desta prática um distintivo dos católicos em contraposição com o resto da cristandade, os ortodoxos e os protestantes.

Modo de rezar o Rosário
Em cada dia da semana meditamos uns mistérios diferentes; assim Segunda Feira e Sábado meditamos os mistérios Gozosos; terça feira e sexta-feira meditamos os mistérios dolorosos, Quarta Feira e Domingo os mistérios Gloriosos, reservando a Quinta Feira para os mistérios Luminosos.

Há vários modos de rezar o terço, mas a maior parte das pessoas inicia com o sinal da cruz, seguido do Credo, de um Pai-Nosso uma Ave-Maria e um Gloria. Terminadas estas orações introdutórias, anuncia-se o primeiro mistério seguido ou não de uma pequena meditação e secundado por uma dezena de ave-marias precedidas de um Pai-Nosso.

Depois da decima Ave-Maria de cada dezena, reza-se o Gloria seguido de várias jaculatórias, dependendo do lugar e de quem reza e termina-se com a oração que a Nossa Senhora em Fátima recomendou aos pastorinhos que rezassem depois de cada mistério: "Ó meu Jesus, perdoai-nos, livrai-nos do fogo do inferno, levai as alminhas todas para o Céu, principalmente aquelas que mais precisarem"… (da vossa misericórdia). Por fim rezam-se três Ave-Marias pelas intenções do Santo Padre para assim estarmos unidos a toda a cristandade, nele representada, e termina-se com a Salve Rainha precedida ou não, segundo o tempo que se dispõe, pela Ladainha da Nossa Senhora.

A importância do Rosário
O Rosário é ao mesmo tempo uma oração mariana e Cristo-Centrica porque repetidamente invocamos Maria como Mãe de Deus e nossa Mãe, e lhe pedimos que se junte a nós na nossa oração ao Pai, ao recitarmos o Pai Nosso e à Santíssima Trindade ao recitarmos o Glória, e nos ajude a meditar e contemplar os mistérios da vida do Seu filho, nosso irmão mais velho e nosso salvador, dos quais ela também faz parte.

Em Fátima, como nas demais aparições marianas, Maria não atrai nenhuma atenção para si mesma, mas sim e exclusivamente para o Seu filho. O seu contentamento não lhe vem de a louvarmos, mas sim de louvarmos o seu filho. Como diz o provérbio, “Quem o meu filho beija, minha boca adoça”.

Não se ama o filho sem se amar a mãe, por isso todo o amor dirigido ao filho indiretamente é dirigido à mãe. Assim como todo louvor dado à mãe se dirige ao filho como foi o caso daquela mulher que no meio da multidão, levantou a voz para dizer a Jesus, Bem-aventurada aquela que te deu à luz, e os seios que te amamentaram!” (Lucas 11, 27)

O Rosário não é uma oração de Ação de Graças, nem uma oração de petição, nem sequer uma oração de lamentação como alguns salmos da bíblia. O Rosário, é fundamentalmente uma oração de meditação e contemplação. De facto, anunciamos e enunciamos cada mistério dizendo neste mistério contemplamos….

Conta-se que um dia alguém confessou ao Papa João XXIII a dificuldade de rezar o terço pois frequentemente se distraía no rezo maquinal e rotineiro das Ave-Marias, ao que o papa respondeu, para que serve o Rosário se não para nos distrairmos?

Ao ser uma oração contemplativa, a recitação repetitiva de Ave-marias no Rosário tem a mesma função que os mantras na espiritualidade Budista; ocupam a mente impedindo que esta salte de um pensamento para outro, permitindo e facilitando a contemplação dos mistérios da vida do senhor.

A finalidade, portanto, não é colocar a nossa atenção em cada Ave-Maria e Pai-Nosso que rezamos, mas sim ocupar a mente com estas orações como se tratassem de mantras e saltar assim para a contemplação do divino.

O Rosário e Fátima
Nas aparições de Fátima, Nossa Senhora pediu aos pastorinhos que rezassem o Rosário todos os dias, não numa ou duas aparições, mas em todas as ocorridas em de 1917, assim como nas que ocorreram em Tuy e Pontevedra à irmã Lúcia. Porquê o Rosário, pergunta-se esta, por ser uma oração acessível a todos, pequenos e grandes sábios e ignorantes.

Naquela região, e um pouco por todo o Portugal, a recitação do Rosário era parte integrante dos serões da província, antes ou depois da Ceia ao calor da lareira, o pai ou a mãe lideravam a reza e ninguém pedia a bênção do pai e da mãe e se ia deitar antes de terminar mesmo que o sono já fizesse cair as cabeças.

Família que reza unida mantêm-se unida; a Televisão qual cavalo de Troia veio perturbar a candura e harmonia do lar e o terço foi substituído pelas telenovelas. Talvez esta seja uma das razões pela qual, somos um dos países com uma das mais altas taxas de divorcio, 70%.

Os pastorinhos que já rezavam o Rosário, mas apressadamente, passaram a reza-lo como a Senhora queria. Em especial o Francisco a quem a Senhora disse que tinha de rezar muitos terços para ir para o Céu.

Com efeito o terço identificou Francisco na sua vida pois havia dias que rezava dez terços, e também identificou as suas ossadas quando o seu corpo foi exumado. Entre tantas ossadas enterradas na mesma sepultura comum, o Ti Marto, pai de Francisco, identifico os ossos do seu filho pois agarrado a eles estava o Rosário ainda intacto que o Francisco usava.

Penitência e oração pedia Maria em Fátima tanto por nós como pelos outros. O Rosário catapulta-nos para a contemplação do Mistério de Deus, sobretudo do Verbo incarnado. Por isso, meditando ou não meditando, distraídos ou não, os que amam profundamente o Rosário e não podem deixar passar um dia sem o recitar, são, “ipso facto”, verdadeiramente pessoas de oração.
Pe. Jorge Amaro, IMC
r.