15 de outubro de 2017

Fátima: As orações da Nossa Senhora

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Foram três as orações que os três pastorinhos aprenderam de Maria; simples e fáceis de memorizar, elas encerram em si toda a mensagem de Fátima. Por isso, ao repeti-las pessoalmente no nosso íntimo, ou liturgicamente em comunidade, transformam-se no sacramento da mensagem de Fátima, porque a evocam e representam. Portanto, como estas três orações contêm em si a mensagem, a sua recitação não só nos faz recordar a mensagem como também nos exorta a vivê-la

A primeira oração mais uma vez, depois da aparição do anjo, refere-se ao mistério da Santíssima Trindade. As aparições de Fátima começam com a Trindade e encerram com a Trindade. Maria revela aos pastorinhos a identidade de Deus uno e trino, um só Deus em três pessoas distintas. Ao contrário das outras duas orações, esta. não foi ensinada diretamente pela Nossa Senhora;
Mas sim inspirada pelo Espirito Santo, e recitada pelas crianças de uma forma quase autómata pelas crianças diante de Senhora.

A segunda oração é uma oração sacrificial, ou seja, a aplicação prática de uma parte da mensagem de Fátima - a penitência, que no contexto da mensagem de Fátima significa oferecimento de nós mesmos pelos outros, pela conversão dos pecadores.

A terceira oração é a mais conhecida universalmente pois é repetida por todos os católicos que rezam o terço entre mistério e mistério. Pede pela salvação universal em especial por aqueles que estão mais longe dela.

1ª Oração comunicada aos videntes num impulso íntimo
… Abriu pela primeira vez as mãos, comunicando-nos uma luz tão intensa, como que reflexo que delas expedia, que penetrando-nos no peito e no mais íntimo da alma, fazendo-nos ver a nós mesmos em Deus, que era essa luz, mais claramente que nos vemos no melhor dos espelhos. Então por um impulso íntimo também comunicado, caímos de joelhos e repetíamos intimamente:

Ó Santíssima Trindade, eu vos adoro. Meu Deus, meu Deus, eu Vos amo no Santíssimo Sacramento.

E, porque sois filhos, Deus enviou aos nossos corações o Espírito do seu Filho, que clama: «Abbá! - Pai!» Gálatas, 4, 6 – As crianças viram-se em Deus e em Deus viram, ao mesmo tempo, a Sua identidade como sendo Uno e Trino assim como a identidade deles mesmos, dos pastorinhos como sendo filhos queridos de Deus. Inundados pela luz de Deus, são guiados e inspirados pelo Espírito que, como diz São Paulo aos Gálatas, dentro do íntimo das três crianças grita “Abbá Pai! – Ó Santíssima Trindade!…”. Como diz ainda o apostolo aos Romanos (8,16) Esse mesmo Espírito dá testemunho ao nosso espírito de que somos filhos de Deus.

Neste momento, e logo na primeira aparição os pastorinhos tiveram a visão beatifica de Deus como Uno e Trino e eles mesmos, dentro dessa luz, como filhos adotivos de Deus Pai. No alto do monte, a serra de Aire, naquele momento de transfiguração, não podemos esquecer que eram três as crianças e que ao analisarmos o carácter e personalidade de cada uma delas nos damos conta que cada uma pertence a um centro diferente; Lúcia é cerebral, Jacinta é emocional e Francisco visceral ou instintivo; pelo que podemos concluir que, naquele encontro, encontra-se a trindade humana com a Trindade divina; ou seja a natureza humana nas três personalidades básicas em que se revela, com a natureza divina nas três pessoas em que é constituída.

Esta oração é ao mesmo tempo trinitária e eucarística; é impressionante como da visão beatifica que os pastorinhos sentiram imersos na luz de Deus, imediatamente passam para a adoração, para o amor do Santíssimo sacramento da Eucaristia, ou seja, da revelação celestial, passam para a encarnação histórica de Deus, há dois mil anos, em Jesus de Nazaré e a Sua presença sacramental na hóstia consagrada, no aqui e agora das nossas vidas.

Disse-lhe Filipe: «Senhor, mostra-nos o Pai, e isso nos basta!» Jesus disse-lhe: «Há tanto tempo que estou convosco, e não me ficaste a conhecer, Filipe? Quem me vê, vê o Pai. Como é que me dizes, então, 'mostra-nos o Pai'? João 14, 8-10

A oração implica que na adoração do Santíssimo sacramento adoramos também a Santíssima Trindade. Quem vê a Jesus vê o Pai, e quem ama o Filho ama o Pai. A oração do cristão é portanto sempre uma oração Trinitária. O Santíssimo Sacramento é não só a representação do sacrifício do Filho, mas também o do Pai que no-lo enviou e entregou, como parece sugerir uma imagem muito popular de Deus Pai e o Espirito Santo, representado pela pomba, por detrás da cruz onde está crucificado Cristo.

2ª Ó Jesus, é por Vosso amor,
– Sacrificai-vos pelos pecadores e dizei muitas vezes e em especial quando fizerdes alguns sacrifícios: "Ó Jesus, é por Vosso amor, pela conversão dos pecadores e em reparação pelos pecados cometidos contra o Imaculado Coração de Maria". Ao dizer estas últimas palavras, abriu de novo as mãos, como nos dois meses passados. O reflexo pareceu penetrar a terra e vimos como que um grande mar de fogo.

Penitência e oração é o resumo da mensagem de Fátima; já falamos do tema da oração concentrado na oração Trinitária e Eucarística, falamos agora da segunda parte da mensagem a penitência que, tal como a oração, é mencionado em todas as aparições. Como Jesus deu a vida pelos seus amigos, como Jesus se ofereceu, pela salvação do mundo, quereis também vós, pergunta a Nossa Senhora aos pastorinhos, oferecer-vos, associar-vos ao sacrifício do meu filho, fazer-vos eco, neste ano de 1917, do sacrifício ocorrido há quase dois mil anos? As crianças disseram logo que sim.

É uma oração insólita porque é subtilmente inteligente; não é uma oração contemplativa como a que já comentamos, mas uma oração que vem da prática, supõe a prática aliás, é uma oração para recitar exclusivamente depois dessa praxis; neste sentido, não é uma oração para todos recitarem e em qualquer situação, mas só para alguns e após uma prática muito concreta.

Como diz a Senhora esta oração é para ser recitada antes, durante e depois de cada sacrifício oferecido. Esta oração é a varinha de condão que transforma uma contrariedade normal da vida num sacrifício oferecido a Deus. Esta oração acrescenta uma mais valia, um valor acrescentado, um juro às vicissitudes do dia a dia, dá-lhes um sentido, uma motivação. Transforma cada uma das nossas dores no ato de abraçar a cruz de Cristo pelo bem da humanidade.

«Se alguém quer vir após mim, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz, dia após dia, e siga-me. Lucas 9,23
Por isso esta oração não é para ser usada no culto nem na liturgia; não é para ser recitada na Igreja ou no contexto de união íntima com o Senhor; é, ao contrário, uma oração recitada na vida e para a vida. É uma exortação a abraçar cada contrariedade da vida, transformando-o com e, por intermédio desta oração, num “Sacrifício agradável a Deus”; é também, por outro lado uma aplicação prática do evangelho de Lucas.

Sofrer com razão e motivação, custa bastante menos que sofrer sem sentido. Por isso ao oferecermos a Deus os sacrifícios com os quais a vida nos depara, acabamos por sofrer menos. Encontramos conforto no mesmo sacrifício ao sabermos que vai fazer bem a alguém.

Depois de comprometidos com Maria, de se oferecerem a Deus suportando todos os sofrimentos e contrariedades inerentes à vida, e em especial aqueles como consequência de serem testemunhas do eco do Evangelho em Fátima, os pastorinhos não perdiam nenhuma ocasião de se sacrificarem pela conversão dos pecadores.

Se um se esquecia o outro lembrava; estando na prisão de Ourém, terminado o Terço, a Jacinta voltou para junto da janela a chorar.
 – Jacinta, então tu não queres oferecer este sacrifício a Nosso Senhor? – Ihe perguntei.
– Quero; mas lembro-me de minha mãe e choro sem querer.

Ora, se somos filhos de Deus, somos também herdeiros: herdeiros de Deus e co-herdeiros com Cristo, pressupondo que com Ele sofremos, para também com Ele sermos glorificados. Romanos 8,17

Como diz São Paulo, se somos filhos, somos irmãos do Senhor e co-herdeiros, da herança eterna. Se partilhamos da glória do Senhor também devemos partilhar dos meios que levaram a Cristo à sua glória, o sofrimento. Como toda relação de amizade é preciso estar às duras e às maduras, na saúde e na doença, na alegria e na tristeza. “Quem se obriga a amar obriga-se a padecer” diz o proverbio.

 3ª Ó meu Jesus, perdoai-nos…
Quando rezais o Terço, dizei depois de cada mistério: "Ó meu Jesus, perdoai-nos, livrai-nos do fogo do inferno, levai as alminhas todas para o Céu, principalmente aquelas que mais precisarem"… (da vossa misericórdia)

Por fim a oração que a Virgem Maria nos disse que incluíssemos entre mistério e mistério. A oração foi precedida da visão do inferno, que deve permanecer na nossa consciência como possibilidade de condenação.

... perdoai-nos… – a Bíblia diz-nos que o homem justo peca sete vezes por dia, que é o mesmo que dizer que ninguém é justo diante de Deus. Somos todos pecadores, e quem afirma não ter nenhum pecado é um mentiroso, como diz a Bíblia. Assim sendo, sempre que nos colocamos diante de Deus sem qualquer pecado que precise de ser perdoado, não significa que não pecámos, significa simplesmente que a nossa consciência moral não está fazendo seu dever de nos acusar e apontar os nossos defeitos.
... livrai-nos do fogo do inferno – só Deus tem o poder de nos salvar da condenação eterna isto mesmo fez Ele gratuitamente pela da morte de seu filho. Na representação do inferno como um mar de fogo, a Nossa Senhora tem em conta o conceito e a imagem que as crianças tinham dele, seguindo o princípio tomista: Quidquid recipitur ad modum recipientis recipitur - tudo o que é recebido, é recebido de acordo com a capacidade do receptor.

A forma como entendemos o inferno, no entanto, não é como uma tortura eterna, como parece sugerir o mar de fogo, mas como uma morte eterna e um retorno ao nada para aqueles que nada fizeram, cujas vidas se resumem a nada e nada é o que eles acreditavam que existe para além da morte.

... levai todas as almas para o céu – como sempre na mensagem de Fátima, não nos podemos ocupar e preocupar unicamente com a nossa própria salvação, mas também com a dos outros. A Espiritualidade de Fátima não é sobre perfeição pessoal mas com carinho para aqueles que levam uma vida que está errada que não leva a nenhuma parte. Sendo assim, a espiritualidade de Fátima é então uma espiritualidade missionária; oramos pelos outros e pela sua salvação.

O mesmo princípio tomista também se aplica aqui pois acreditamos na ressurreição do corpo, não só da alma. Apesar da antropologia bíblica não ser dualista, a maioria, se não todos, orações litúrgicas da Igreja retratam a natureza humana como corpo e alma, seguindo assim a antropologia grega.

... especialmente aqueles que mais precisarem da vossa misericórdia - especialmente aqueles que mais longe estão da salvação; esta sempre foi a grande preocupação de Jesus: eu não vim chamar os justos, mas, sim, os pecadores, ao arrependimento. (Lucas 5,32)
Pe. Jorge Amaro, IMC


1 de outubro de 2017

Fátima: As orações do Anjo

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Além da insistente exortação da Nossa Senhora a rezar o terço, e à pratica dos primeiros Sábados, no decorrer das aparições as crianças aprenderam orações que resumem e ilustram todos os aspetos da mensagem de Fátima. Mediante estas orações, a mensagem, de doutrina, passa a prática espiritual, quando rezadas em privado, e até a liturgia, quando rezadas em comunidade.

Aprendidas do Anjo e da Senhora do Rosário por Lúcia, Francisco e Jacinta, estas orações atualmente parte de uma tradição orante que salienta a adoração a Deus, particularmente na sua presença eucarística, e a disponibilidade do crente para o compromisso com a missão redentora de Cristo.

Tanto as ensinadas pelo anjo, como as ensinadas pela Nossa Senhora, o conteúdo das orações não versa sobre Maria, mas sim sobre o mistério de Deus e à redenção da humanidade. A Nossa Senhora em Fátima, revela desta forma, qual é o seu verdadeiro papel e lugar na história da salvação: aquele de apontar aos homens os caminhos de Deus e o de referir a Deus as necessidades dos homens. São cinco as orações de Fátima, e, como dissemos, nenhuma é dirigida a Nossa Senhora.

Doutrinalmente Fátima é a mais completa das aparições pois toca os pontos principais da teologia católica; o mistério da Santíssima Trindade que aparece já nas aparições do anjo; a Eucaristia, a oração, a penitência, a reparação, a escatologia, o ministério pontifício, a comunhão dos Santos etc..

Meu Deus, eu creio
Meu Deus, eu creio, adoro, espero e amo-Vos. / Peço-Vos perdão para os que não creem, / não adoram, não esperam e não Vos amam.

Uma oração simples e singela, mas completa; um convite ao cristão a viver as três dimensões do tempo humano, Passado - Presente - Futuro inspirando-se nas três virtudes teologais, Fé – Esperança – Caridade.  A vida humana decorre exclusivamente no presente; um presente que quando está cheio de Caridade, inspirada no passado da dos nossos pais, torna-se em razão da Esperança que nos projeta para o futuro sem medo nem ansiedade.

A virtude da Fé: “Eu Creio” – A fé é a pedra filosofal que nos faz ver a vida e a realidade com outros olhos. A fé é um passo que damos para além do que é racional e razoável; é um risco, uma decisão, uma opção fundamental. É a chave que abre a porta da Salvação; salvação que significa Céu para o futuro, mas que no presente, no aqui e agora, se traduz em paz, felicidade, e sentir-se bem, fisicamente, espiritualmente, psicologicamente e moralmente.

A virtude da Esperança: “Espero” – A virtude teologal da Esperança é a fé projetada no futuro que confere um sentimento de segurança no momento presente. O cristão não precisa de ansiolíticos porque não tem ansiedade; perfeitamente ancorado na fé que se traduz, no presente, no aqui e agora, em caridade para com Deus e o próximo. “Quem não deve não teme” diz o proverbio; o cristão não teme porque não está em dívida com ninguém, nem com Deus, nem com os homens..

A fé também assegura os cristãos que por pior, ou melhor que seja o momento presente, tudo é passageiro e a sua é uma história com um fim feliz. O fim feliz da sua história já está assegurado na morte e Ressurreição do Senhor. Se temos a fé que nos permite acreditar que até os cabelos da nossa cabeça estão contados, como diz o evangelho, vivemos na certeza de que ainda que o momento presente possa ser de sofrimento e angustia, o melhor está para vir e a nossa história terá um fim feliz. Assim sendo, o medo e a ansiedade desaparecem e os altos e baixos da nossa vida são vividos na esperança e na fé na providencia divina e não no temor.

“Por fim o meu coração Imaculado triunfará” – Nesta fé e nesta esperança viveram os pastorinhos; em especial a Lúcia que em breve ia perder a companhia dos seus primos. Ao aperceber-se que ia ficar sozinha no mundo, a Lúcia deve ter sentido uma enorme tristeza, o que levou a Senhor a perguntar-lhe,: “E tu sofres muito por isso”? De seguida, a modo de consolo e conforto disse, “O meu Imaculado Coração será o teu refúgio, e o caminho que te conduzirá a Deus”; Ou ao Céu que já lhe tinha sido prometido a ela a Jacinta e ao Francisco logo na primeira aparição.

A virtude da Caridade: Adoro… e Amo-Vos – Só vivemos no presente, inspirados no passado e confiantes no futuro. O presente da nossa vida deve ser cheio de caridade; a caridade, o amor só pode ser vivido no momento presente. “Não guardes para amanhã o que podes e deves fazer hoje”. As boas intenções não salvam ninguém, nem a nós mesmos. A caridade não pode ser projeto, mas ação no momento presente. A caridade não pode ser adiada.

Adoro - O momento presente deve ser cheio de amor a Deus. Encontrar tempo e buscar um lugar para estar com Ele, como Jesus fazia e como Francisco de Fátima também fazia isolando-se das suas companheiras, detrás de algum cabeço ou matorral, ou passando o tempo da escola na Igreja de Fátima consolando o Deus escondido.

Amo-vos – Quando amamos a Deus de todo coração como Pai, olhamos para o outro com outros olhos; já não é o nosso inimigo, o nosso rival a quem tememos ou invejamos, mas sim o nosso irmão a quem desejamos todo o bem do mundo. Neste sentido o amor a Deus não existe sem o amor ao próximo e vice-versa, por isso, para Jesus, os dois fazem parte de um único mandamento do amor.

Fátima Missionária – “Peço-Vos perdão” … Para além de exortar a vida dos cristãos nas virtudes da Fé, Esperança e Caridade, esta oração deixa bem claro que o cristão não vive para si mesmo nem sequer para a perfeição pessoal; o cristão vive para os outros, os outros são sempre parte integrante da sua vida pessoal. Daí preocupar-se com eles como se preocupava Jesus que veio para os enfermos e não para os sãos, que não criticava os maus, os pecadores, mas acolhia-os com misericórdia. Como a Jacinta quando dizia,” Coitadinhos dos pecadores” …

Peço-vos perdão - porque não evangelizei, porque não saí fora de mim mesmo, porque vivi de portas para dentro fazendo da fé um segredo a levar para a sepultura. Como dizia Karl Rahner Deus na sua infinita misericórdia salvará aqueles que sem culpa pessoal, não ouviram falar Dele, não O conheceram e, por isso, não tiveram oportunidade de encontrar-se pessoalmente com Cristo; mas salvará aqueles que tinham por dever de ir e falar-lhes Dele e de O dar a conhecer?

Neste sentido, Fátima é verdadeiramente missionária, não só por ser um apelo à evangelização, mas por obrigar os cristãos a considerarem-se pecadores por não serem missionários, e, portanto, pedirem perdão porque a sua inatividade, leva os outros a não crerem, esperarem e amarem. Este sentimento de culpa deveria levar os cristãos a ecoar na sua consciência as palavras de São Paulo, o maior evangelizador de todos os tempos: “Ai de mi se não evangelizar”.

 Peço-vos perdão –não só porque não evangelizei, mas ainda escandalizei; não só não fui um degrau para os outros se sentirem edificados e subir em direção a Ti, mas fui um escândalo, uma pedra de tropeço, um empecilho.

Na história da minha vocação como em todas as histórias de vocações, foi o conhecimento de uma pessoa que encarnava essa vocação específica que me levou a desejar ser como ele ou como ela. O mesmo se passa com a evangelização de hoje e de sempre; em primeira instância, o encontro com Cristo, nunca é um encontro com a sua doutrina, ou mesmo a sua palavra, mas sim o encontro com um dos seus seguidores, com um daqueles que encarna a sua palavra e a sua doutrina.

O encontro com aquele que se afirma cristão, nunca é neutro; se as suas atitudes, palavras e obras correspondem ao que se diz ser, ele mesmo sem querer já está a evangelizar. Ao contrario se não existe concomitância entre o que se diz ser e a sua vivência, não só não evangeliza como até escandaliza, traumatiza. E, se esta for uma primeira experiência, ou seja se este é o primeiro encontro com um cristão, já dificilmente se converterá ao cristianismo.

Em todos os sentidos e em todas as áreas as primeiras experiências são extremamente importantes. A nossa forma de viver, o nosso comportamento ou é atraente e edificante, ou é repelente e escandalizante.

Santíssima Trindade
Santíssima Trindade, Pai, Filho e Espírito Santo, / adoro-Vos profundamente / e ofereço-Vos o preciosíssimo Corpo, / Sangue, Alma e Divindade de Jesus Cristo, / presente em todos os sacrários da terra, / em reparação dos ultrajes, sacrilégios e indiferenças / com que Ele mesmo é ofendido.
E pelos méritos infinitos do Seu Santíssimo Coração / e do Coração Imaculado de Maria, / peço-Vos a conversão dos pobres pecadores.

O evangelho de São João tem um prólogo no qual resume, concentra, e interpreta de antemão toda a doutrina de Jesus de quem vai falar a seguir. Esta oração de alguma forma é uma “overture”, um introito à mensagem que a Virgem vai transmitir às crianças. Tudo o que ela vai comunicar, esmiuçadamente, já se encontra aqui concentrado nesta oração que o anjo ensinou e convidando as crianças a rezar com ele.

Santíssima Trindade, Pai, Filho e Espírito Santo - Com a construção da Basílica da Santíssima Trindade, Fátima ficou completa arquitetonicamente. Possui agora uma arquitetura que é a expressão topográfica da mensagem de Fátima concentrada nesta oração de invocação da Santíssima trindade.

A Basílica da Santíssima Trindade, edificada em forma redonda simbolizando a eternidade de Deus, agora a porta entrada do Recinto correspondendo assim ao primeiro anúncio do Anjo, um ano antes da Nossa Senhora aparecer. Do lado direito temos o sacrifício de Cristo, que abriu a porta da salvação para a humanidade; popularmente chamada a Cruz alta.

No centro do recinto, como no centro da história humana, está Cristo dourado, nossa vida e nossa esperança, vivo e ressuscitado a abençoar o mundo tal como o viram as crianças na última aparição. Ao lado esquerdo está o lugar da aparição da Nossa Senhora, sempre ao lado de Jesus seu filho como esteve aos pés do seu berço e da sua cruz.

A Capelinha e o Cristo dourado são o lugar mais baixo do recinto, depois voltamos a subir para a basílica da Senhora do Rosário uma subida pronunciada. Basílica que é o uma torre apontada para o céu em forma de Senhora de Fátima como ela coroada com uma coroa dourada de glória, a mesma que espera a todos e cada um dos seus filhos se acolhemos o seu conselho nas bodas de Caná: “Fazei tudo o que Ele vos disser”.

Em conclusão, um ano antes de a Senhora aparecer, o anjo que se apresentou como anjo da Paz e Anjo de Portugal, ensinou aos pastorinhos, uma oração evocativa da identidade Daquele que se iria revelar mais tarde por intermédio da Sua mãe, a rainha do Céu, da Terra e de Portugal.

adoro-Vos profundamente – Adorar significa submeter-se; ao adorar a Deus, todo o meu ser se submete a Ele pelo que nada há em mim que se oponha à sua vontade e aos desígnios.  É uma adoração profunda, porque brota desde as raízes do meu ser onde reconheço a minha origem em Deus, como diz o salmo 87 “todas as minhas fontes estão em ti”

e ofereço-Vos o preciosíssimo Corpo, / Sangue, Alma e Divindade de Jesus Cristo, / presente em todos os sacrários da terra – Não se trata de recordar a Deus o ato salvífico de Cristo, ou seja, dar a vida pelos seus amigos. É o reavivar a nossa memória, pois, tal como o povo Judeu no deserto, a nossa tendência é esquecer rapidamente os prodígios e as maravilhas que o Senhor fez por nós. O sacrário é o sacramento, o recordatório das graças recebidas assim como o reservatório de graças a receber se a Ele aderimos. É, portanto, esta oração uma exortação à comunhão do corpo e Sangue do Senhor assim como à adoração eucarística

em reparação dos ultrajes, sacrilégios e indiferenças / com que Ele mesmo é ofendido. – Esta adoração eucarística faz ecoar em nós e no mundo inteiro aquele supremo ato de amor de Deus pela humanidade há dois mil anos. Que o nosso amor e firme adesão ao mistério salvífico de Cristo contrabalance os ultrajes e os sacrilégios que são manifestações de ódio, dos inimigos de Cristo.

Mas pior que isto é a indiferença, a falta de amor o ignorar. Dizem que a indiferença é bem pior que o ódio. Esta indiferença é manifestada nos tempos pós-modernos pela nova forma de ateísmo chamada agnosticismo: o não querer saber, o não se importar, o “tanto se me dá como se me dê”, o viver como se Deus não existisse, o ser, o estar e viver alheio ao Seu amor por nós, o votar-lhe as costas. Quem odeia já amou e pode voltar a amar, mas o indiferente nunca amou e pode nunca vir a amar,

E pelos méritos infinitos do Seu Santíssimo Coração / e do Coração Imaculado de Maria, / peço-Vos a conversão dos pobres pecadores. – Ao recordar os méritos de Cristo e de Maria sua mãe recordamos a nossa falta de mérito pela qual, como já na primeira oração ensinada pelo anjo, pedimos a conversão dos pecadores e o perdão pela falta do nosso compromisso para com esta conversão.
Pe. Jorge Amaro, IMC