15 de abril de 2023

II Mistério: Anunciação do anjo à Virgem Maria

"No sexto mês, o anjo Gabriel foi enviado por Deus a uma cidade da Galileia, chamada Nazaré, a uma virgem desposada com um homem que se chamava José, da casa de David e o nome da virgem era Maria. Entrando, o anjo disse-lhe: “Ave, cheia de graça, o Senhor é contigo”. Perturbou-se ela com essas palavras e pôs-se a pensar no que significaria semelhante saudação.

O anjo disse-lhe: “Não temas, Maria, pois encontraste graça diante de Deus. Eis que conceberás e darás à luz um filho, e lhe porás o nome de Jesus. Ele será grande e será chamado Filho do Altíssimo, e o Senhor Deus lhe dará o trono de seu pai David; e reinará eternamente na casa de Jacob, e o seu reino não terá fim”.

Maria perguntou ao anjo: “Como se fará isso, pois não conheço homem?” Respondeu-lhe o anjo: “O Espírito Santo descerá sobre ti, e a força do Altíssimo te envolverá com a sua sombra. Por isso, o ente santo que nascer de ti será chamado Filho de Deus. Também Isabel, tua parenta, até ela concebeu um filho na sua velhice; e já está no sexto mês aquela que é tida por estéril, porque a Deus nenhuma coisa é impossível”.  Então disse Maria: “Eis aqui a serva do Senhor. Faça-se em mim segundo a tua palavra”. E o anjo afastou-se dela.
" Lucas 1,26-38

Este segundo mistério é conhecido como o primeiro mistério gozoso. Porém, estamos no contexto da pré-história de Jesus de Nazaré, pelo que é um mistério profundamente mariano. O Anjo Gabriel é o arauto da Nova Era que está para começar. Deus vai visitar outra vez o seu povo como o fez no Egito, mas desta vez a libertação é mais espiritual que física e mais abrangente, ou seja, não só para o seu povo, mas para todos os povos. Faz-se realidade o sonho e a profecia de Isaías (25, 6), do banquete para todos os povos em Jerusalém.

Gabriel e a natureza dos anjos
No princípio, Hashem criou três tipos de criaturas, os anjos, as bestas e os seres humanos. Os anjos, criou-os a partir da Sua palavra pura. Os anjos não têm qualquer vontade de fazer o mal. Não podem desviar-se por um só momento dos Seus desígnios. As bestas apenas têm os seus instintos a guiá-las. Também elas seguem o comando do seu criador. A Torah declara que Hashem gastou quase seis dias completos de criação a dar forma a estas criaturas.

Em seguida, imediatamente antes do ocaso, tomou uma pequena quantidade de terra e com ela moldou o homem e a mulher. Uma ideia tardia? Ou o coroar da Sua obra? Então, o que é esta coisa? Homem? Mulher? É um ser com o poder de desobedecer. Só nós entre todas as criaturas temos livre arbítrio. Estamos suspensos entre a clarividência dos anjos e os desejos das bestas. Hashem deu-nos a escolha, que é simultaneamente um privilégio e um fardo. Temos então de nos resignar à vida enredada que vivemos. Anton Lesser: Rav Krushka no filme: Desobediência (2017)

As palavras acima citadas são colocadas na boca de um velho rabino. A teologia hebraica não concede aos anjos liberdade, livre arbítrio, não são livres de escolher o bem nem o mal. Vivem como os animais, para além do bem e do mal. A diferença destes é que não têm desejos porque não têm corpo físico como os animais. Sendo seres puramente espirituais, apenas possuem uma forma de pensamento ao qual foi retirado o livre arbítrio, a diferença do bem e do mal. São uma pura extensão do pensamento de Deus e não podem desviar-se destes pensamentos.

Possuem alguns atributos de Deus, são a companhia de Deus no Céu, relacionam-se com Deus e Deus com eles como o amo com o seu estimado cão ou gato, ou qualquer outro animal de estimação, não sendo, como já dissemos, seres de corpo físico, mas seres de corpo espiritual.

Ao não terem livre arbítrio, os anjos, a história extra-bíblica da génese do demónio ou diabo não faz qualquer sentido. Nunca houve um anjo que desobedecesse aos planos de Deus, porque os anjos, extensão do pensamento de Deus, vivem subjugados de forma feliz ao seu criador, como um animal de estimação ao seu dono, sem capacidade para divergir, discernir, escolher ou dizer que não. Portanto, Gabriel, mensageiro de Deus, apresenta-se com uma mensagem que ele não pode mudar dirigida a Maria, ser humano, que tem poder para de dizer que sim ou não aos planos de Deus.

Uma virgem dará à Luz…
“Pede ao Senhor, teu Deus, um sinal, seja do fundo da habitação dos mortos, seja lá do alto”. Acaz respondeu: “De maneira alguma! Não quero pôr o Senhor à prova”. Isaías respondeu: “Ouvi, casa de David: Não vos basta fatigar a paciência dos homens? Pretendeis cansar também o meu Deus?" O próprio Senhor vos dará um sinal: uma virgem conceberá e dará à luz um filho, e o chamará ‘Deus Emanuel Deus connosco. Isaías 7, 11-14

Contexto original da profecia
No século VIII A.C, o Reino de Judá estava prestes a ser invadido pelo reino do Norte (Israel) e pela Síria, para forçarem Acaz, rei de Judá, a entrar em aliança com estes dois reinos contra a poderosa Assíria.  

Em Isaías 7:10-12, Deus, por intermédio do profeta, exorta o rei Acaz a pedir a Deus um sinal. Este, temendo que a vontade de Deus fosse diferente da sua, pois já tinha pensado forjar uma aliança com a poderosa Assíria, recusa pedir um sinal a Deus, citando Deuteronómio 6:16 como desculpa.

Deus, por sua livre iniciativa, dá o sinal na mesma, mas o destinatário já não é a pessoa individual do rei Acaz, mas a dinastia à qual ele pertence, a casa de David. Prova disso é que esta dinastia é mencionada no versículo 13, o que significa que o “vos” do versículo seguinte, o 14, não se refere ao rei como pessoa, mas à dinastia à qual ele pertence, a casa de David. O termo hebraico, "lakem", traduzido "para ti" está na forma plural e designa, portanto, sinal que é "dado a ti, mas não se refere a ti, ou seja, não será cumprido no teu reinado, mas muito mais tarde".

Tentando interpretar “Vos” como referindo-se à pessoa do rei Acaz, alguns rabinos afirmaram que este personagem, o Emanuel, era Ezequias, filho do próprio rei Acaz. Porém, feitas bem as contas usando os reinados dos reinos vizinhos contemporâneos, quando a profecia foi anunciada já Ezequias tinha entre 12 a 14 anos de idade.

As profecias não têm data de realização e também não têm um rótulo onde esteja estipulada a data de caducidade. Trata-se da Palavra de Deus que é eterna e que pode ser anunciada muito longe da sua realização. Isto mesmo se subentende no carácter enigmático e insólito da profecia, assim como na ambiguidade do termo “virgem”.

O termo “Virgem”
A língua grega traduziu “almah” que em hebreu significa donzela (uma moça jovem) por “párthenos” que significa “Virgem”. Na cultura hebraica, a virgindade não é um valor e, se o é, está ao serviço da maternidade. Porém, é correto usar o termo “virgem” como sendo o que melhor se adequa à mensagem que o profeta quer transmitir.

Ou seja, se é um sinal divino, deve ser necessariamente extraordinário; ora que uma donzela dê à luz, não tem nada de extraordinário; é, sempre foi e será normal e rotineiro. Por outro lado, o que vai nascer não é uma pessoa humana qualquer, mas sim o Emanuel, ou seja, uma pessoa por intermédio da qual Deus está connosco. Por fim, o texto fala e só menciona a mãe do Emanuel, não o Pai, pelo que se assume que seja o próprio Deus.

Conclusão: O anjo do Senhor anunciou a Maria que ela era a depositária e o cumprimento da promessa que Deus fez a Acaz oito séculos antes, pela boca do profeta Isaías (7:14) Uma virgem conceberá e dará à luz um filho que terá por nome Emmanuel, Deus connosco.

Pe. Jorge Amaro, IMC






















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