Quanto custas? Ouvimos tantas vezes nos filmes; o dinheiro compra tudo e todos; ninguém resiste ao vil metal. As pessoas que chegam ao ponto de venderem a sua honra, a verdade e a sua dignidade fazem-no na certeza de que o dinheiro lhes vai comprar tudo, que é essencial para a auto-realização e para a felicidade.
A verdade é que o dinheiro, longe de comprar tudo, não compra sequer as coisas mais importantes, as de que realmente precisamos na vida. É por isso que não é difícil encontrar pessoas deprimidas e infelizes entre os ricos, e pessoas felizes e auto realizados entre os pobres.
O dinheiro pode comprar uma cama, mas não pode comprar o sono; pode comprar comida, mas não o apetite; pode comprar livros, mas não a inteligência; pode comprar luxo, mas não beleza; pode comprar uma casa, mas não um lar; medicamentos, mas não a saúde; reuniões sociais, mas não amor; brincadeira ou diversão, mas não felicidade; um crucifixo, mas não a fé; um lugar luxuoso no cemitério, mas não no céu. Não há nada mais valioso do que a vida e a vida é um dom de Deus; o amor, que é o princípio da vida, é livre e não pode ser vendido nem comprado. Em essência, só se compram os meios materiais, essenciais para estarmos vivos; a vida, nem se compra, nem se vende, nem se possui.
A Princesa Diana, de Gales, tinha tudo que uma jovem poderia pedir na vida: juventude, beleza, poder, dinheiro, fama, "sangue azul" e dois filhos preciosos, e mesmo assim não estava feliz porque lhe faltava, o principal, o que o dinheiro não pode comprar, amor. À procura deste, abandonou tudo e foi nessa busca que perdeu a vida. Outros há, que tendo o essencial, o amor, fazem o oposto da princesa, buscando afanosamente tudo aquilo que ela desprezou, gastando nisso as suas vidas, muitas vezes acabando por perder o que de antemão tinham, o amor.
Tal como Diana de Gales, São Bento de Nursia, São Bernardo de Claraval, São Francisco de Assis, Sto. Inácio de Loyola, São Francisco Xavier, Sto António de Lisboa, Sta. Isabel de Portugal, São Nuno Alvares Pereira, Sta Beatriz da Silva etc., os santos da Igreja católica, na sua grande maioria, eram de classe media alta, cultos, jovens, belos, ricos alguns de sangue azul, e todos abandonaram tudo por Cristo, tal como São Paulo outrora fizera, por causa dele, tudo perdi e considero esterco, a fim de ganhar a Cristo, Fl, 3, 8.
O valor e não valor da pobreza
A pobreza, exaltada na Bíblia, não é a que impede os seres humanos de sustentar as suas vidas e viver com dignidade. Desde o princípio, a Biblia apresenta-nos um Deus que, longe de ser neutral ou imparcial, luta contra este tipo de pobreza.
Com efeito, Deus está do lado dos pobres contra os ricos, como vemos no cântico de Maria (Lucas 1:53). Alegra-se com a queda dos ricos, como tal, não como seres humanos. Enquanto seres humanos, Deus quer a conversão do pecador não a sua morte. Deus é provavelmente o único que diferencia entre o pecador e os seus pecados, condenando o pecado, salvando o pecador.
Como religiosos, o nosso voto de pobreza brota da segunda bem-aventurança, que São Mateus cita no seu Evangelho: a opção pela pobreza (Mateus 5:3). A escolha da pobreza, portanto, é motivada pela liberdade em relação ao dinheiro, que pode dominar o coração, e também pelo desejo de testemunhar o amor de Deus pelos últimos, os discriminados, os rejeitados, partilhando a sua condição. Procuramos partilhar da condição dos pobres tanto, ou da mesma forma, como o fez Jesus: que sendo rico se tornou pobre... 2 Coríntios 8,9.
O voto de pobreza
Como os votos religiosos de castidade, pobreza e obediência fazem referência a valores eternos, aqueles que os encarnam transformam-se em sacramentos, embaixadores, signo e símbolo de eternidade para o resto dos cristãos. Ao viverem, já no aqui e no agora, os valores que todos estamos chamados a viver no céu, relativizam realidades como o dinheiro, o poder, o prazer.
Quanto ao voto de castidade, como no céu não há morte, não há nenhuma necessidade de haver casamentos como sugere Mateus 22,30. Viver em castidade, ou amizade universal, é o que a todos nos espera.
Quanto ao voto de obediência o que o religioso quer relativizar é o amor pelo poder, que tantos têm; a mania de querer chegar ao topo, pensando que uma vez lá não se tem que obedecer a ninguém. Obedecendo o religioso quer mostrar que é fazendo a vontade de Deus que melhor nos auto realizamos.
A necessidade de bens materiais está relacionada com o facto de ter, de sustentar a vida nas suas implicações biológicas. No céu, teremos um corpo glorioso (1 Coríntios 15, 44) ou espiritual, feito à imagem e semelhança do nosso corpo físico mas não é o corpo físico. Como é um corpo imaterial, não há necessidade de possuir e armazenar bens materiais.
Muitas pessoas vivem na ilusão de que, por possuir mais meios de vida, têm mais vida, ou podem alongá-la mais. Em si mesma a vivência do voto apregoa a verdade de que não se pode amar a Deus e ao dinheiro; o possuir, para além do necessário para nos mantermos em vida, impede de “armazenar tesouros no céu”, (Mateus 6,19-20), ou seja gastar a vida cultivando valores humanos. São estes valores que dão sentido e relevância à nossa vida, tanto do ponto de vista individual como social, e a sustêm na eternidade fazendo parte do nosso corpo espiritual, com o qual viveremos com Deus.
Vivendo o voto de pobreza, no contexto de uma comunidade religiosa, destacamos o valor da partilha de bens comuns, assim como o valor de os usar e administrar com responsabilidade, sem possuí-los. Nós acreditamos, na verdade, que só Deus é o verdadeiro dono de tudo o que as pessoas pensam, que possuem. Não somos proprietários de coisa nenhuma, nem de nós mesmos, nem da nossa vida; apenas somos administradores de tempo, de talentos, de recursos e dessa administração prestaremos um dia contas.
Pe. Jorge Amaro, IMC