Uma chamada à autotranscendência
Os antigos olhavam à noite para as estrelas e isso elevava o seu pensamento para além dos afazeres e preocupações do dia-a-dia; um olhar mais além de si mesmos e do mundo para a transcendência levava naturalmente a uma maior auto-transcendência. Nestes tempos modernos, os homens já não olham para as estrelas, mas sim para a televisão.
A televisão em geral, nos horários de maior audiência ou no chamado horário nobre, apresenta os programas menos nobres. Longe de ser um chamamento à autotranscendência, a TV leva o homem a imiscuir-se mais do que está no mais imediato e urgente, nos assuntos do dia-a-dia. Alguém dizia que os homens contemporâneos andam em círculos, às turras uns com os outros, porque deixaram de olhar para o céu.
Numa aldeia havia um moço que atirava pedras à lua; é claro que nunca a atingiu a sua diana a Lua, mas era, de todos os moços, o que atirava pedras mais longe. Por isso o que aparentemente parece algo sem sentido como atirar pedras à lua levou o moço à autossuperação e fez dele o melhor atirador de pedras. O mesmo acontece com a religião que aparentemente não serve para nada, mas a longo prazo os seus efeitos notam-se e são indiscutíveis.
Busca de sentido
A religião deixou de estar presente no dia-a-dia das pessoas, pois já não explica nada nem tem aplicações práticas que tornem a vida melhor e mais aprazível. Ao contrário, a ciência explica cada vez mais coisas e tem aplicações práticas para o dia-a-dia que tornam a nossa vida mais confortável.
A ciência de facto explica muitas coisas, mas não explica o mais importante: diz-nos que o mundo começou com um “Big Bang,” mas não nos diz quem provocou essa grande explosão ou o que havia antes dela, e para que foi prvocada; diz-nos que, desde essa grande explosão, o mundo continua em expansão e vai expandir-se até gastar toda a sua energia e acabar, mas não nos diz o que há para além do fim do mundo. Por fim, o que é mais importante, entre o “Big Bang” e o fim do mundo não nos diz que sentido tem a vida, para que existimos ou por que existimos.
É certo que podemos muito bem viver sem estas questões, como aliás fazem os agnósticos que metem a cabeça debaixo da areia; acham que ignorar as questões é a melhor maneira de responder a elas. Com esta atitude não passaríamos da cepa torta em todos os ramos do saber. A ciência nasce do questionar e buscar razões.
O espírito do ser humano é como a criança que acaba de chegar à idade da razão. Pelos 7 anos de idade, a criança ganha autoconsciência e descobre que existe. Então questiona tudo e todos, buscando razões para satisfazerem o seu espírito inquieto. Normalmente, agarra-se aos pais ou a algum adulto em quem confia e bombardeia-o como uma sucessão de porquês, à procura da razão última ou primigénia da causa não causada.
Frequentemente leva os adultos, que não querem admitir a Deus como causa não causada e razão primordial de tudo e de todos, a um beco sem saída. Neste momento, mandam-na calar e chamam-lhe chata. Assim, a criança pára de questionar-se e de questionar e, como os adultos seus mentores, põe fim a este exercício de buscar o porquê de cada coisa e contenta-se com viver na pura mundanidade, como aliás fazem o resto dos seres vivos que também não se questionam.
A ciência e o resto dos saberes e instâncias da sociedade desentendem-se quanto ao problema da morte. Só a religião apresenta uma solução coerente. Os mais intelectuais, como Karl Marx, dizem que não deve preocupar-nos, pois enquanto nós formos, ela não é; quando ela for, nós não seremos…. Os mais materialistas dizem “Morra Marta morra farta” porque “Enquanto dura é doçura”.
O confronto entre a ciência e a religião é como o confronto entre o amor e o dinheiro. Ninguém nega que ter dinheiro sempre foi e é cada vez mais importante, pois com ele tem-se acesso a uma infinidade cada vez maior de confortos e prazeres. Apesar da inegável importância do dinheiro para a vida, todos concordam que o amor é ainda mais importante. O dinheiro não compra amor, mas o amor pode comprar dinheiro; sem dinheiro a vida ainda tem sentido, mas sem amor não o tem.
Técnica, espiritualidade e ética
Se a ciência, teoria geral das coisas, se traduz pela técnica em aplicações práticas que nos facilitam a vida, a religião, teoria mais geral ainda e mais englobante que a ciência, traduz-se no dia-a-dia em espiritualidade e em ética.
A ciência pela técnica não nos diz como viver a vida e leva a uma forma de materialismo e consumismo, ou seja, a encher a casa de tralhas.
A religião não só dá sentido à vida como, pela espiritualidade e pela ética, nos mostra o caminho que leva à vida em plenitude, à auto-realização, ou seja, à felicidade que todos desejamos. O que a técnica é para a ciência, a espiritualidade e a ética são para a religião.
Se a técnica contribui para o bem-estar material do corpo, a espiritualidade contribui para o bem-estar da alma. Enquanto a ciência e a técnica só se preocupam com o bem-estar material do homem, a espiritualidade visa o bem-estar da pessoa como ser individual, a ética visa o bem-estar do indivíduo como ser social e parte integrante de uma comunidade
Os que vivem na pura mundanidade dirão que tanto a espiritualidade como a ética podem existir e subsistir sem a religião. De facto é essa a tendência do homem pós-moderno.
Isto leva-nos de volta à criança inquisitiva que acima comparámos com o verdeiro espírito do ser humano. Perante uma ética sem religião, somos obrigados a concluir que se o que verdadeiramente conta é o que se passa aqui em baixo, não há uma razão última para as coisas e, se não a há, por que devo ser bom se, sendo mau, obtenho mais coisas, mais dinheiro e mais prazeres?
A espiritualidade sem religião é algo assim como o budismo, o caminho para a iluminação, um aperfeiçoamento pessoal individualista e egoísta que definitivamente leva à sociedade de elites e castas que ainda vigoram na terra natal do budismo. A religião chama a espiritualidade ao altruísmo, a dizer que devemos amar os outros como nos amamos a nós mesmos; ou seja, tudo o que de bom buscamos para nós mesmos, devemos buscá-lo em igual medida para os outros.
Conclusão: Como o ser humano é naturalmente religioso, a vida na pura mundanidade é uma religião politeísta que consta do amor pelo poder, pela fama e pelo prazer e que tem o dinheiro como Zeus, o pai dos deuses.
A religião faz-nos livres do apego aos bens materiais, quando amamos a Deus sobre todas as coisas; dá-nos a alegria de viver quando nos amamos a nós mesmos como Deus nos ama, constrói uma sociedade justa e pacífica quando amamos o próximo como a nós mesmos.
Pe. Jorge Amaro, IMC
Sem religião a vida para mim não tem sentido.A religião fáz com que eu me sinta feliz e ajudame a vencer as batalhas que se apresentam na minha vida com mais alegria por amor a Deus, e dáme ânimo para
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