Vendo isto, os discípulos Tiago e João disseram: «Senhor, queres que digamos que desça fogo do céu e os consuma?» Mas Ele, voltando-se, repreendeu-os. E foram para outra povoação. Lucas 9, 54-56
(…) Há de chegar mesmo a hora em que quem vos matar julgará que presta um serviço a Deus! E farão isto por não terem conhecido o Pai nem a mim. João 16, 2-3
Vamos misturar essência com existência, ou seja, o que são em si mesmas estas duas religiões, com a História que ambas têm escrito ao longo dos séculos desde que nasceram. É claro que escrevo a partir da minha fé em Cristo, único Salvador, Caminho, Verdade e Vida para todo o ser humano, incluindo os muçulmanos; mas não uso a fé como argumento; espero argumentar exclusivamente a partir da razão.
Fanatismo e violência
Há dois conceitos que foram talvez mal interpretados, ou interpretados de forma a satisfazer, justificar e abençoar a sede de poder de alguns. O certo é que foi esta “má interpretação” dos conceitos que escreveu História e fez correr muito sangue. Refiro-me ao conceito de JIHAD, que significa esforço, luta, guerra santa, e o conceito de ISLÃO que significa submeter-se à vontade de Deus.
Como dizem os estudiosos, a JIHAD refere-se à luta que todo o ser humano deve travar dentro de si mesmo contra o mal. O caso é que, historicamente, a luta interior que devia permanecer interior, tornou-se numa luta exterior; na prática, essa luta traduziu-se, e ainda atualmente se traduz, na luta contra aqueles que o Islão considera infiéis, declarando-lhes uma guerra que se justifica a si mesma por ser santa, por ser por uma boa causa. Nesta época, não tinham ainda entendido que “Os fins não justificam os meios”.
O Cristianismo tem também a sua versão de guerra santa, as cruzadas. A primeira cruzada nasceu como resposta ao pedido do Imperador cristão do Oriente, Aléxis I para que o ajudassem a reconquistar a cidade santa de Jerusalém e a libertar os cristãos orientais do domínio muçulmano. No entanto, rapidamente se transformou numa forma de travar o avanço dos muçulmanos que ameaçavam acabar com o mundo cristão. Começou por ser um direito à autodefesa que rapidamente se transformou em agressão, conquista e massacre em nome de Cristo.
Islão significa submeter-se a Deus; a base da religião muçulmana reside nesta submissão simbolicamente representada pela postura física que os muçulmanos adotam quando rezam. Era este o propósito da Jihad, o esforço, a luta para submeter toda a personalidade de cada um a Deus; aliás, é mesmo isso que significa adorar a Deus: submeter-se à sua vontade.
Enquanto este princípio não passou da esfera pessoal, enquanto se manteve reflexivo e intransitivo, foi bom e não causou problemas; mas não é desta submissão que reza a História. Submeter-se a Deus rapidamente se transformou em submeter os outros a Deus. Por isso, tal como o judaísmo chama gentio a todo o que não é judeu, o Islão chama infiel a todo aquele que não é muçulmano.
Ao contrário do Cristianismo que nasceu num mundo adverso dominado pelos romanos e durante 5 séculos foi uma religião clandestina que se propagava pelo exemplo de vida e pela pregação, o Islão nasceu numa conquista bélica de Meca e na submissão à nova fé de cristãos e politeístas que lá viviam.
Rapidamente se confundiu com poder e continuou a propagar-se não pela pregação como o cristianismo, mas sim pela conquista bélica e pelo comércio. Os muçulmanos submeteram de facto à sua fé o mundo antes cristão: a zona sul e norte do Mar Mediterrâneo, invadindo a Europa pelo Ocidente até França e pelo Oriente até à Áustria. Durante toda a Idade Média, assolaram a Europa que se fechou sobre si mesma num regime feudal.
Depois do Imperador romano Constantino, o Cristianismo transformou-se na religião do Estado e, como tal, também usou a técnica de submissão não só pela via da tortura da Inquisição, mas também como forma de evangelização.
De facto, os latino-americanos ainda hoje nos acusam de termos evangelizado a América Latina mais pela espada que pelo crucifixo; como a espada no Ocidente sempre foi em forma de cruz, talvez venha daí a confusão. O Cristianismo abandonou há muito estas práticas de violência que ficaram na Idade Média; o Islão ainda as usa hoje. Porquê?
Ressentimento contra o mundo ocidental cristão
Com a vitória na batalha de Lepanto em 1571, entre cristãos e muçulmanos, a cultura e civilização cristã acabou de uma vez por todas com a constante ameaça do Islão e cresceu até ser hoje o que é, ao passo que a civilização muçulmana, cujo auge tinha sido atingido com Averróis e Avicena, estagnou numa mentalidade medieval.
O mundo muçulmano ainda não se recuperou do ressentimento e ódio que essa derrota causou. Este ódio motiva as ações da Al Qaeda, em especial contra os Estados Unidos que representam o mundo ocidental.
Atualmente não há nenhum país tradicionalmente cristão que persiga muçulmanos só pelo facto de o serem, enquanto nos países tradicionalmente muçulmanos os cristãos são sistematicamente perseguidos: Egipto, Paquistão, Irão, Iraque, etc.
Os muçulmanos no Ocidente estão amparados pela democracia e pelo direito à liberdade religiosa; os cristãos no mundo árabe não têm direitos, estão à mercê do fanatismo. Os muçulmanos no Ocidente podem construir as suas mesquitas; os cristãos no mundo árabe não têm direito a construir igrejas nem a reparar as que estão construídas e, na Arábia Saudita, nem podem usar um crucifixo ao pescoço.
Quem não deve não teme
Nunca somos tão violentos como quando lutamos pela nossa sobrevivência. Enquanto a religião cristã, posta em causa pela Revolução Francesa, pela idade da razão, pelo iluminismo e ultimamente pelas filosofias ateias, sobreviveu, a religião muçulmana opõe-se a todo o pensamento crítico vindo de dentro e de fora e ameaça quem o faça.
Quem não deve não teme: esta agressividade mais não é que uma forma de esconder as graves deficiências do ponto de vista filosófico, histórico e teológico. Alimentada pelo petróleo e pelo ódio contra o Ocidente, a expansão muçulmana é como um gigante com pés de barro – um dia que as deficiências venham à luz da razão, talvez não fique pedra sobre pedra.
Segundo Carl Jung, o fanatismo é uma forma de sufocar uma dúvida interior. Assim explicava Jung o fanatismo de S. Paulo contra os cristãos, antes da sua conversão. A dúvida de S. Paulo era entre a segurança que dá a lei, uma falsa segurança, e a liberdade da graça que Santo Estêvão oferecia.
S. Paulo encontrava-se dividido entre estas duas formas de viver a vida. Por um lado, atraído pela liberdade, ao dar-se conta de que nunca conseguia satisfazer as exigências da lei e que, mesmo que o fizesse, não tinha nenhuma segurança ou garantia de salvação que tornasse a vinda de Cristo prescindível se o homem pudesse salvar-se a si mesmo.
É evidente, até pela forma como tratam as mulheres, como seres humanos de segunda categoria, que a religião muçulmana estava bem para a Idade Média, mas não para o mundo de hoje. Como a forma de pensar de hoje se infiltra de muitas formas, mesmo nos países muçulmanos, pela TV, pela Internet, eles sentem-se intimidados e temem perder fiéis, temem que a sua religião não aguente o embate da razão, como o cristianismo teve que aguentar, reformulando-se.
Então tornam-se agressivos contra o Ocidente, que se governa pela razão e se infiltra por todo o lado porque a razão ~e a única via para o desenvolvimento e progresso. Como o Ocidente é de raiz cristã, voltam-se contra os cristãos nos seus países, chamando-os traidores e americanos, quando estes existiam antes da religião muçulmana. Chamam o Cristianismo de religião estrangeira, quando ele esteve implantado muitos séculos antes de a religião muçulmana chegar ao seu país.
Os animais mostram o seu máximo de agressividade quando sentem ameaçada a sua existência. Sob este ponto de vista, os humanos não são diferentes. Os gatos são animais pacíficos e nunca se voltam contra os seus donos a menos que estes os ameacem e não tenham forma de fugir. Assim se sente a religião muçulmana encurralada face ao mundo ocidental de tradição cristã.
Não há razões para matar
Como acima se citou, a tentação de impor a nossa crença ou idiossincrasia aos outros já era visível nos apóstolos. Jesus rejeita a violência como meio para chegar a algum fim. Rejeita também matar em nome de Deus, dizendo que quem o faz nunca o conheceu a Ele nem a Deus. Deus é Amor e Vida, não ódio e morte. Para Jesus não há razões para matar, só há razões para morrer.
A diferença entre o Islão e o cristianismo é simples: os cristãos seguem o seu Mestre que os ensinou a morrer por uma causa e que morreu Ele mesmo pela causa da justiça; os muçulmanos seguem o seu profeta que os exortou a matar por uma causa e que matou ele mesmo por uma causa.
Numa reunião de indianos contra o Império Britânico, antes da independência da Índia um Muçulmano incitava à violência, incitando os presentes à matança dos britânicos. Ao que Mahatma Gandhi respondeu “Por esta causa [independência da Índia], eu estou disposto a morrer; não há nenhuma causa, porém, pela qual eu esteja disposto a matar.”
Conclusão: Ao longo da sua História, o Cristianismo já conheceu momentos de violência, fanatismo e intolerância; o Islão, porém, ainda não descobriu a tolerância, o diálogo e a coexistência pacífica com a sociedade civil e as outras religiões.
Pe. Jorge Amaro, IMC
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