15 de setembro de 2023

VI Mistério: A Sagrada Família, triângulo de amor e harmonia 2ª Parte

Três dias depois acharam-no no templo, sentado no meio dos doutores, ouvindo-os e interrogando-os. Todos os que o ouviam estavam maravilhados com a sabedoria das suas respostas. Quando eles o viram, ficaram admirados. E sua mãe disse-lhe: “Meu filho, que nos fizeste?! Eis que teu pai e eu andávamos à tua procura, cheios de aflição.Lucas 2, 46-48

Observam sem julgar
Parece que os pais de Jesus conheciam já as normas da comunicação não violenta, pois não julgam, não criticam nem castigam o comportamento de Jesus. Apenas se limitam a observar o comportamento do seu filho e a comunicar-lhe essa observação. Ao passarem para Jesus a sua observação, fazem-no assertivamente, não agressivamente, tendo o cuidado de se responsabilizarem pelo sentimento de aflição, sem acusar Jesus de ser o causador dessa aflição.

Não pretendem ter a última palavra
Respondeu-lhes ele: “Por que me procuráveis? Não sabíeis que devo ocupar-me das coisas de meu Pai?”. Eles, porém, não compreenderam o que ele lhes dissera. Lucas 2, 49-50

Nas nossas famílias, durante a nossa infância, eram sempre os nossos pais que tinham a última palavra. O mesmo não acontece com a Sagrada Família de Nazaré. Neste episódio, é Jesus que tem a última palavra; a ignorância e a falta de compreensão dos pais de Jesus sobre a sua vida e ministério não os faz violentos nem quererem ter sempre razão.

Como diz S. Paulo, não usou os seus pergaminhos, rebaixando-se até à morte e morte de cruz
Em seguida, desceu com eles a Nazaré e era-lhes submisso. Sua mãe guardava todas estas coisas no seu coração. E Jesus crescia em estatura, em sabedoria e graça, diante de Deus e dos homens. Lucas 2, 51-52

Jesus deve ter sido um menino prodigioso, como tantos no nosso mundo. Precoce em muitas coisas que decerto causavam admiração nos seus pais e vizinhos. No entanto, além de todos os talentos que Jesus possuía, era inerente à sua pessoa uma atitude de humildade que o fazia acatar com obediência as ordens dos seus pais.

José, o sonhador
Um anjo do Senhor apareceu em sonhos a José e disse: “Levanta-te, toma o menino e sua mãe e foge para o Egito; fica lá até que eu te avise, porque Herodes vai procurar o menino para o matar”. José levantou-se durante a noite, tomou o menino e sua mãe e partiu para o Egito. Ali permaneceu até à morte de Herodes, para que se cumprisse o que o Senhor dissera pelo profeta: do Egito chamei meu filho (Os 11,1). Mateus 2, 13- 15

José transcendeu o seu próprio ego e ouviu a palavra de Deus à qual obedeceu prontamente, tendo partido para o Egito para salvar a vida do seu filho. A Sagrada Família sabe o que é ser perseguida politicamente, e sabe o que é ser refugiada política e emigrante num país que não é o seu. Fugiam de um genocídio que é coisa que sempre aconteceu e ainda acontece no nosso mundo. E o pior genocídio do nosso tempo é o aborto. O ser humano é o único animal que mata as suas próprias crias.

Herodes, o grande, pensou que era justificado aos olhos dos seus súbditos matar tantos inocentes pelo medo de que um destes pequenos inocentes lhe roubasse o trono. Líderes como este sempre encheram e enchem o mundo: pessoas que se apaixonam pelo poder conquistado e não mais o largam, sendo capazes de tudo para o ter e manter.

Quando cada membro da família põe de lado os seus projetos pessoais, como José, para obedecer ao projeto comum que é sempre aquele que Deus inspira nas nossas almas e corações, então todos os membros da família encontram a felicidade e a autorrealização. Herodes amava Herodes e as suas próprias ambições; e isso levou-o até a assassinar os seus próprios filhos.

José está sempre ao serviço da família, por isso a família está em primeiro lugar. Herodes coloca os seus projetos em primeiro lugar e a família fica em último; temos exemplos de grandes políticos que têm filhos problemáticos porque as suas famílias são disfuncionais por causa dos pais que, à semelhança de Herodes, colocam os seus projetos em primeiro lugar. Os filhos dos famosos raramente são famosos como os pais…

Muitos pais, nos seus trabalhos, fazem horas extraordinárias porque o patrão os faz pensar que são imprescindíveis: os pais aceitam de bom grado, pois assim têm mais meios financeiros para a sua família. Dizem que não querem que lhes falte nada mas, na realidade, falta-lhes o mais importante: a presença e o amor que não se concretiza sem esta. A falácia é que se o trabalhador morrer ou ficar doente, o patrão depressa o substitui. É na família, como pai ou mãe, que um trabalhador ou trabalhadora é verdadeiramente insubstituível.

O que pensam os familiares de Jesus
Quando os seus o souberam, saíram para o reter; pois diziam: “Ele está fora de si.Marcos 3, 21

Uma mãe que toda a sua vida guarda silêncio e guarda no seu coração com respeito todas as coisas que não entende da vida e do ministério do seu filho, não vai ter uma atitude como a que nos descreve o evangelista S. Marcos. São os outros familiares, os primos de Jesus, um deles provavelmente Tiago que depois foi o líder da primeira comunidade cristã de Jerusalém, foram estes familiares de Jesus, não a sua mãe, que se antagonizaram com o seu ministério. E que mais tarde se antagonizariam com os discípulos de Jesus.

Numa monarquia, quem sucede ao rei é um familiar do rei, se este não deixar descendência. O líder da comunidade cristã não era Pedro, como poderíamos pensar que fosse por ordem do Mestre, mas sim o primo de Jesus, Tiago. Vê-se claramente isto no concílio de Jerusalém, quando se debate sobre obrigar ou não os cristãos que anteriormente tinham sido judeus a respeitar as leis judaicas ou não. Pedro inspira a decisão, mas quem decide é Tiago, pois é este que tem a última palavra.

A divisão entre familiares de Jesus e discípulos de Jesus poderia ter acontecido na Igreja como aconteceu entre os muçulmanos: os xiitas descendentes do profeta por via de Fátima, a sua filha preferida, e os sunitas descendentes dos primeiros discípulos do profeta.

Jesu deixou bem claro que o verdadeiro discípulo, ou seja, o que ouve a sua palavra e a põe em prática é que é a sua mãe, irmão e irmã. (Lucas 8, 21)

E para que não ficassem dúvidas, chamou a João filho da sua própria mãe e a esta mãe do seu discípulo   preferido. (João 19, 26)

A Mãe de Jesus e nossa mãe
Quando Jesus viu sua mãe e, perto dela, o discípulo que amava, disse à sua mãe: “Mulher, eis aí o teu filho.” Depois disse ao discípulo: “Eis aí a tua mãe”. E dessa hora em diante o discípulo a recebeu como sua mãe. João 19, 26-27

Os evangelhos apresentam um Jesus às vezes distante e com pouca consideração pela sua mãe. Porém, a prova de que isto não é verdade está aqui. Mesmo no auge do seu sofrimento na cruz, Jesus não esquece a sua mãe, não esquece que, tal como a viúva de Naim a quem ele tinha devolvido a vida do filho, a sua mãe era viúva, estava a assistir à morte do seu único filho e se preparava para ficar sozinha no mundo.

A avó, com as suas mãos trémulas, deixou um dia cair um prato de fina louça chinesa de sua filha, em casa de quem vivia. A filha ficou furiosa com a própria mãe e mandou o seu filho comprar um prato de plástico no qual ela deveria comer doravante. O rapaz olhou para a sua mãe com ar de desaprovação e recusou-se a ir comprar o prato de plástico. No entanto, acabou por ter de obedecer e lá foi. Ao voltar a casa, apresentou dois pratos de plástico sobre a mesa. A mãe irritada perguntou por que havia comprado dois quando lhe tinha dito que comprasse só um. “O outro,” disse o moço, “é para ti quando fores idosa como a avó.”

Os pais amparam os filhos na sua infância e estes devem amparar os pais na sua velhice. Mas nem sempre assim acontece neste mundo onde o que conta é ser consumidor e produtor. Quando não se pode ser nem uma coisa nem outra, deixamos de ter lugar na sociedade.

Conclusão – Tal como Jesus é para nós, enquanto indivíduos, Caminho, Verdade e Vida, a sua família, a Sagrada Família é também para nós, membros de uma família, modelo de vida familiar a imitar.

Pe. Jorge amaro, IMC



1 comentário:

  1. A Família de Nazaré, portanto, é a nossa escola do Evangelho.

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