Quem realmente come a minha carne e bebe o meu sangue fica a morar em mim e eu nele. Assim como o Pai que me enviou vive e eu vivo pelo Pai, também quem de verdade me come viverá por mim. (…) Depois de o ouvirem, muitos dos seus discípulos disseram: «Que palavras insuportáveis! Quem pode entender isto?» (…) A partir daí, muitos dos seus discípulos voltaram para trás e já não andavam com Ele. João 6, 56-57, 60, 66
Não aceitar a eucaristia, comer o corpo e o sangue do Senhor, foi o que fez com que alguns deixassem de andar com Jesus, de ser seus amigos e seus discípulos.
Lamentavelmente, ainda hoje é assim; a participação ou não na eucaristia dominical, distingue um católico praticante de um não praticante. Destes católicos, uns pensam que podem pertencer à Igreja sem participar na Eucaristia; outros pensam que podem rejeitar a Igreja sem rejeitar a Cristo. Algo assim como muitos protestantes que pensam que dão mais valor a Jesus retirando importância a Maria, sua mãe.
Não é possível amar a Cristo odiando a Igreja que ele fundou. Se Jesus de Nazaré é o Cristo histórico, a Igreja é a presença de Cristo na história. Jesus disse-lhe: «Há tanto tempo que estou convosco, e não me ficaste a conhecer, Filipe? Quem me vê, vê o Pai. Como é que me dizes, então, 'mostra-nos o Pai'? (João 14, 9). Se Cristo representa a Deus Pai, a Igreja representa bem ou mal, mas sempre representa a Cristo, porque é o seu corpo místico. Esta representação pode em tempos ser boa ou má, mas é sempre uma representação.
A Igreja corpo místico de Cristo – pluribus unum
Tal como o nosso corpo é constituído por 300 triliões de células e todas elas são diferentes, pois formam tecidos diferentes como o tecido do estômago, do cérebro, dos ossos, da pele, do fígado, do coração, etc., todas elas estão unidas num único corpo porque, apesar de serem muitas e muito diferentes, têm algo em comum: o ADN, o código genético.
Da mesma forma, nós os cristãos que somos mais de mil milhões e muito diferentes uns dos outros, vivemos em diferentes latitudes e longitudes, falamos diferentes línguas, somos de diferentes grupos humanos, culturas, nacionalidades, temos idiossincrasias e personalidades diferentes, mas com algo em comum: a fé em Nosso Senhor Jesus Cristo. Isto faz de nós uma comunidade, um só corpo, uma só família.
Cristo, em forma física e humana, só podia viver e morrer uma vez. No entanto, a ação salvífica patente no conjunto da sua vida terrestre não era só para os homens do seu tempo e do lugar em que viveu, mas sim para os homens de qualquer tempo e lugar. A Igreja foi por Ele fundada para estender a todo tempo e lugar a Sua ação salvífica. Igreja é Cristo no tempo e no espaço; a Igreja é Cristo aqui e agora. Em Israel, há dois mil anos, Cristo existiu sem a sua Igreja; depois da sua vida terrena, nem a Igreja existe sem Cristo nem Cristo existe no tempo e no espaço sem a sua Igreja.
A Igreja, como corpo místico de Cristo, inspirada pelo Espírito Santo, é a voz, o coração, a mente, as mãos e os pés do Senhor atuando aqui e agora, em todo o tempo e lugar a mesma ação salvífica que Jesus realizou do ano zero ao 33 em Israel.
"Em verdade, em verdade vos digo: aquele que crê em mim fará também as obras que eu faço, e fará ainda maiores do que estas, porque vou para junto do Pai." João, 14, 12
A Eucaristia, corpo sacramental de Cristo
Um clube, uma empresa, uma instituição, um povo que não se reúne, não existe como tal. A Eucaristia, corpo sacramental de Cristo, é a razão pela qual o corpo místico de Cristo se reúne. No mesmo lugar, instituiu o mesmo Cristo a Eucaristia e a Igreja, pelo que uma não existe sem a outra.
O dia que acabasse uma, acabaria também a outra. Como outrora, nos tempos de Jesus, foi a rejeição da Eucaristia a razão pela qual deixaram de andar com Jesus; nos nossos tempos, continua a ser esta a razão. Quem abandona a Eucaristia abandona a Igreja e vice-versa. Quem abandona a Igreja abandona a Cristo e vice-versa.
Muitos grãos de trigo fazem um só pão; muitos bagos de uva fazem um só vinho; muitos cristãos fazem um só corpo. Cristo escolheu o Pão e o Vinho para simbolizar e significar o seu sacrifício por nós; a Eucaristia é o memorial da vida, paixão, morte e ressurreição do Senhor.
É a Igreja que celebra a Eucaristia; a Eucaristia é a razão de ser da Igreja, porque é ela que congrega os cristãos em resposta ao mandato do Senhor, “fazei isto em minha memória” Lucas 22,19. A Eucaristia faz memória do Senhor e faz presente a ação salvífica de Cristo. Ao participar na Eucaristia nós recolhemos os frutos da redenção.
Cristo é o corpo entregue e o sangue derramado por toda a Humanidade; Cristo é o cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo. A redenção está disponível para todos, é para todos, salvam-se os que tomam parte nela. Deus alimenta as aves do céu, mas não lhes deita a comida nos seus ninhos, as aves, têm que sair e procura-la na natureza. O mesmo acontece com a Eucaristia que oferece salvação a todos, mas tu tens de a ir buscar participando nela.
Em verdade, em verdade vos digo: se não comerdes mesmo a carne do Filho do Homem e não beberdes o seu sangue, não tereis a vida em vós. Quem realmente come a minha carne e bebe o meu sangue tem a vida eterna e eu hei de ressuscitá-lo no último dia, porque a minha carne é uma verdadeira comida e o meu sangue, uma verdadeira bebida. João 6, 53-55
A Eucaristia é o coração da Igreja. No corpo humano, a função do coração é a de ser o motor que move o sangue das células ao coração e do coração às células. Do mesmo modo, a vida do cristão é um vaivém entre a Eucaristia e o mundo. Quando a missa era em latim, no final o sacerdote dizia “Ite missa est” que queria dizer “podeis ir, a missa terminou”, mas também significava “terminou a missa, começa a missão”.
A Eucaristia está para a Igreja, a Igreja está para a eucaristia como a galinha está para o ovo, e o ovo está para a galinha. De facto, tanto a Eucaristia, nascida em quinta-feira Santa, como a Igreja nascida em Pentecostes tiveram lugar na mesma sala de cima. A Eucaristia foi o momento de conceção da Igreja e o Pentecostes o momento do seu nascimento. O corpo místico de Cristo encontra-se para celebrar o corpo sacramental de Cristo e para comunitariamente se alimentar do seu corpo, do seu sangue e da sua Palavra.
Ao desaparecer uma desaparece a outra. Por isso, aquele que, de ânimo leve, fazendo parte do corpo místico de Cristo, que é a Igreja, deixa de frequentar a Eucaristia, abandonou a Igreja e, quando já não houver gente que celebre a eucaristia, já não haverá Igreja. O dia em que a eucaristia deixar de ser celebrada, esse mesmo dia desaparece a Igreja.
Se isto algum dia acontecer, Cristo terá morrido na história da humanidade sem nunca mais ressuscitar, pois é a Igreja que conserva a sua memória e celebra a Eucaristia em sua memória como Ele mandou (Lucas 22, 19). Quando no mundo já não houver ninguém que faça memória de Cristo, celebrando a eucaristia, Cristo deixa de ter na terra, um corpo físico que o represente (pés, mãos, coração e boca) e continue a sua obra de redenção de geração em geração.
Creio na Igreja una, santa, católica e apostólica
Os protestantes não entendem como os católicos podem incluir no Credo, a fé na Igreja, depois de professar a fé em Deus Pai, Deus Filho, Deus Espírito Santo. Nós acreditamos na Igreja porque ela foi fundada por Cristo e representa a Cristo e, através dela, Cristo faz com que ainda hoje a sua salvação esteja presente no mundo. Por tudo isto, na sua essência e pelo seu fundador, ela é santa. Ao dizer “creio na Igreja”, afirmo acreditar em tudo o que acabo de dizer.
Santa e meretriz, disse um teólogo católico. Sim, a Igreja tem tanto de santa como de pecadora. Santa na sua essência porque foi fundada por Cristo, pecadora na sua existência porque é constituída, desde o seu início, por homens e mulheres pecadores. Se o homem como o define Sto. Agostinho é simul justus ed peccator, ao mesmo tempo justo e pecador, assim é a Igreja. Mas não a rejeito porque é a minha mãe, ninguém rejeita a sua mãe por esta ter defeitos.
Solus Christus, sola fede, sola scritura
O grave erro de Lutero foi deixar fora a Igreja. Como dissemos anteriormente, hoje sem a Igreja não existe Cristo.
Solus Christus
Foi Cristo que a fundou, por isso Lutero rejeita o que Cristo fundou. Foi Cristo que deu vida à Igreja e ainda dá vida à Igreja, mas também é a Igreja que dá vida a Cristo pois ela O representa aqui e agora, porque ela concretiza aqui e agora o mesmo que Cristo concretizou no seu tempo – foi para isso que Cristo fundou a Igreja. Portanto Cristo dá vida à Igreja, a Igreja dá vida a Cristo.
Sola fede
Quando o Filho do Homem voltar, encontrará a fé sobre a terra? Lucas 18, 8
Da Igreja depende que Cristo encontre ainda fé na terra quando Ele voltar para julgar a vivos e a mortos. Dela depende porque é ela que passa a fé em Cristo de geração em geração, como numa corrida de estafetas se passa o testemunho.
Isto porque é a Igreja que é a depositária da fé em Cristo. Isto porque a nossa fé é apostólica, ou seja, a fé em que Cristo ressuscitou dos mortos é apostólica porque nós acreditamos no testemunho dos apóstolos: eles viram, ouviram e tocaram o corpo espiritual ou glorioso de Cristo. Depois deles, ninguém mais O viu, tocou ou ouviu como eles O viram tocaram e ouviram (1 João 1, 3). Tal como hoje não existe Cristo sem a Igreja, nem a Igreja sem Cristo, também não existe fé sem Igreja, nem Igreja sem fé.
Sola scritura
O Cristo que temos é o Cristo da Igreja. Foi ela que deu à luz o Cristo para o mundo depois da sua morte e ressurreição – se pensarmos que o Novo Testamento foi escrito pelas comunidades cristãs, é Cristo que detém os direitos de autor. O grupo dos apóstolos era já Igreja, a sua pregação deu origem a novos fiéis e, alguns destes fiéis reunidos em pequenas comunidades cristãs, escreveram os evangelhos.
As cartas dos apóstolos, sobretudo as de Paulo, eram autênticas cartas porque tinham um remetente, S. Paulo que as endereçou às pequenas comunidades de Corinto, de Éfeso, de Tessalónica, etc. Por isso, no que respeita ao Novo Testamento, não existe escritura sem Igreja.
Unus christianus nulus christianus - Dizia Sto. Agostinho, fundador da ordem religiosa da qual Lutero era membro, “um único cristão, é um cristão nulo”. O cristianismo nasceu em comunidade e só pode viver-se em comunidade. Sem comunidade, não há cristianismo. Como todos os animais têm um habitat onde vivem e prosperam, assim o cristão só pode viver e prosperar no seio da comunidade cristã.
Conclusão – Quem deixa de frequentar a Eucaristia, abandona a Igreja e quem rejeita a Igreja rejeita Aquele que a fundou como sendo o Seu corpo místico, pois representa a Cristo no aqui e agora da história, de geração em geração. Como Ele disse, “as portas do inferno nada poderão contra ela” (Mateus 16, 17) porque “Eu estarei sempre convosco até ao fim dos tempos”. (Mateus 28, 20)
Pe. Jorge Amaro, IMC
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