Entre os inimigos de Fátima, há quem pense que tudo é invenção da Igreja daquele tempo; há quem se agarre às contradições das crianças submetidas a demasiados e extenuantes interrogatórios; e também há quem, desde dentro da Igreja, se alavanque nas incongruências teológicas da mensagem de Fátima para a refutar na sua totalidade.
Há ouro na areia do rio, mas nem toda a areia é ouro
Esta é a metáfora que uso quando quero explicar como a Bíblia contém a Palavra de Deus, sem ser Palavra de Deus, tudo o que nela está escrito. Assim como precisamos de peneirar a areia do rio para encontrar o ouro nela escondido, também precisamos de peneirar a Bíblia para encontrar nela a Palavra de Deus.
Quando fazemos passar a Bíblia: pela crítica literária, pela crítica histórica, pela exegese e muitas outras ciências como a arqueologia, a psicologia, a filosofia, podemos distinguir e colocar de lado o que são mitos, crenças, usos e costumes, história daquele tempo, a personalidade e carácter do autor, os seus preconceitos e, quando tudo isto é exposto e separado, encontramos o que é pura inspiração de Deus, ou seja, a ipssissima Dei verbum.
O critério que usamos para a Bíblia, como revelação pública de Deus, pode ser usado também para revelação privada de Fátima, sobretudo para as incongruências teológicas que a mensagem de Fátima possa conter, como por exemplo:
…levai as almas todas para o céu, especialmente as que mais precisarem – É claro que, em português, esta terminação da oração não faz sentido, pois todos precisamos da salvação de Deus. Fora de Portugal, os católicos de outras línguas acrescentam: "especialmente as que mais precisarem da vossa misericórdia". Ou seja, os que mais afastados estão de Deus, os que mais na miséria estão, mais da divina misericórdia precisam, que outros que não estão assim tão longe de Deus
Penitência e oração pela conversão dos pobres pecadores – Dá a entender que, quem faz penitência e reza pela conversão dos pecadores, não se inclui ele mesmo na categoria de pecador, ou seja, já não é pecador. Isto seria contrário à Palavra de Deus, que diz: Se dizemos que não temos pecado, enganamo-nos a nós mesmos e a verdade não está em nós. 1ª João 1, 8
Mas, na verdade, os videntes reconheciam-se pecadores, e tiveram também o seu processo de conversão; por exemplo, depois das visões diziam “Já não podemos rezar o terço como rezávamos”: dizendo só Ave Maria Santa Maria, para terminar depressa; mais que isso, depois das visões, tudo faziam para não pecar, pois amavam tanto a Deus que temiam agravá-lo, ainda mais do que já estava agravado, por causa de outros pecadores.
“Houve algo, não nada”
Voltando aos tempos de estudante de teologia positivista, depois de ler todas as teorias sobre a ressurreição de Jesus, desde as mais ousadas às mais ilógicas e literais, como conta o Evangelho, agarrei-me a esta fórmula do então teólogo “best seller” Hans Kung. Para Kung, a ressurreição apanhou os apóstolos de surpresa, como as aparições os três pastorinhos.
É difícil, para quem quer que seja, não só para Kung, descrever que tipo de experiência os apóstolos tiveram, mas de certo “houve algo, não nada” afirma, veementemente, o teólogo. Do nada só Deus cria; os homens só criam a partir do já criado por Deus.
Algo teve que acontecer, para transformar uns discípulos amedrontados e covardes, os quais até já tinham regressado à vida que tinham antes de conhecer a Jesus, nuns evangelizadores destemidos e corajosos, como mostra o discurso de Pedro no livro dos Atos os Apóstolos 2, 14-36.
É certo que a experiência que os apóstolos tiveram de Jesus Ressuscitado, não tem, provavelmente, todo o realismo que vem descrito nos evangelhos; mas teve que ser real, de alguma forma; se assim não fosse, não seria descrita com tanto realismo, mas de uma forma tlavez mais mística.
O mesmo raciocínio invoco para as aparições da Virgem Maria às três crianças em Fátima. Algo deve ter acontecido, pois, pela sua tenra idade e a sua ignorância, não é possível que eles tivessem maquinado, tanto o evento, como o conteúdo da mensagem.
A mudança radical de vida que os apóstolos experimentaram, foi também experimentada por aquelas três crianças; também neste caso, algo de grandioso deve ter acontecido que posa explicar a mudança radical que as suas vidas sofreram. Não só exteriormente pelo facto de passarem a viver debaixo do olhar escrutinador dos habitantes do lugar, mas interiormente ao configurarem as suas vidas à mesma mensagem da Senhora experimentando assim uma verdadeira conversão.
Há detalhes do fenómeno Fátima que podem ter uma explicação meramente humana, tais como a visão do inferno, e as visões em forma de flashes da Nossa Senhora das Dores, São José e o menino Jesus, Cristo abençoando o povo e Nossa Senhora do Carmo; no entanto, os acontecimentos principais de Fátima, assim como a mensagem não é suscetível de ter uma explicação meramente humana ou natural. Algo de sobrenatural, fora do comum, e da experiencia de todos os dias, deve ter passado
Os videntes não sabiam nada do que acontecia fora do seu pequeno mundo, tanto a nível nacional como internacional; e, ainda que eles tivessem ouvido alguma coisa, não seriam capazes de entender ou conceptualizar o que quer que fosse que ouvissem; o nível de cultura era tão baixo que nem sabiam da existência de um país chamado Rússia; de facto, Lúcia pensava que se tratava de uma mulher de má vida que precisava de ser convertida.
Isto leva-nos a concluir que algo suficientemente objetivo e real deve ter acontecido; as experiências místicas nunca são coletivas, mas sim íntimas e individuais, e acontecem ao fim de um longo processo que envolve ascética e oração contemplativa.
Tal como nas aparições de Cristo Ressuscitado aos apóstolos, a visão do anjo em 1916 e da bem-aventurada Virgem Maria em 13 de maio de 1917 apanhou as três crianças de surpresa. No momento da primeira aparição de Maria, as crianças nem sequer estavam a rezar, mas sim a guardar o rebanho.
Quando viram um relâmpago, pensando que ia vir trovoada, correram para se abrigar; foi neste momento que elas se deram conta de algo incomum e inesperado; eis que uma senhora mais brilhante que o sol se apresentou diante deles, de pé, em cima de uma azinheira; e, como em todas as teofanias, tanto no Antigo como no Novo Testamento, a senhora disse-lhes para não terem medo dela, pois não lhes queria fazer mal.
Como aconteceu com os apóstolos, em Fátima deparamo-nos não com uma, ou duas, mas três testemunhas logo na primeira aparição; muitos mais estavam presentes nas aparições que se seguiram até à última, na qual umas 70.000 pessoas presenciaram "o milagre do sol", como a senhora tinha prometido aos pastorinhos.
Em todas as aparições, houve pessoas que testemunharam sentir e ver algo. Tanto os três videntes, como o resto das pessoas, presenciaram o mesmo fenómeno sobrenatural, cada um à sua maneira, mas o mesmo. Nem sequer os pequenos videntes experimentaram as aparições da mesma maneira: Francisco via a Senhora, mas não a ouvia; Jacinta via e ouvia; só Lúcia tinha com a Senhora uma comunicação completa, via, ouvia, falava e a Senhora respondia.
Pe. Jorge Amaro, IMC
Maravilhada...com a clareza com que escreve.
ResponderEliminarSim, a clareza dos textos é muito importante para quem lê, seja crente ou agnóstico. A Senhora que apareceu em Fátima é a mesma Senhora, Mãe de Jesus do Advento que deu o seu SIM a Deus ao Anúncio do Anjo. Muita gente pensa que é uma "Nossa Senhora desdobrada" por ser a Senhora de Todos os Nomes: de Fátima, de Lourdes, da Ortiga, da Guadalupe, de Madjorik, a Virgem Negra da Polónia, a Senhora da Aparecida do Brasil, etc. Em cada momento da História A Virgem Maria entra no tempo para falar de como se ganha o Céu! A maior parte das Aparições são a crianças - como em Fátima aos Pastorinhos - porque é na boca das crianças e dos meninos de leite que saem as maiores verdades, reveladas por Deus aos pequeninos. A pureza e a candura da infância no caso português, converteu o povo, e lentamente o mundo inteiro, à Mensagem de Nossa Senhora. A preparação do Santo Anjo de Portugal em 1916, antes das Aparições, foi muito importante até para a Igreja Hierarquia que tinha algumas reservas - excepção para o padre Formigão que desde o início acreditou nos Pastorinhos. Os cépticos e agnósticos são de todos os tempos dentro e fora da Igreja/fora de qualquer Religião. A vida deles não está ligada a Deus. O mundo lhes basta e tudo se resume a isso. Mas faz impressão como tanta gente letrada, entre civis, padres e leigos que se dão ao trabalho de tudo fazerem para "desacreditar" as Aparições. Fátima ajuda à conversão de todos e para mim é caminho que conduz ao Pai - independentemente de ser através dos Pastorinhos e da Virgem do Rosário. Fátima é tudo o que precisamos para encher a alma e limparmos o coração. A Fé e a Oraçao são os pilares de qualquer vida cristã mas exige percursos. Fátima é um deles como o é qualquer outro Santuário Mariano. E quanto ao extraordinário que aconteceu em Fátima - é tão extraordinário que o Segredo de Fátima teve impacto no mundo que acabou por confirmar o Segredo da Senhora do Rosário revelado especialmente à Irmã Lúcia e interpretado pelos seus Confessores. São João Paulo II foi o Papa de Nossa Senhora - o Papa de branco que havia de sofrer muito - como sofreu - um símbolo de tantos mártires do nosso tempo, sacerdotes e religiosas perseguidas e decapitadas em várias partes do mundo e não apenas na Síria. O extraordinário de Fátima é mesmo exctraordinário e misterioso e cai no domínio da fé e não da razão inteligível. Ou se adere de coração ou não se crê. Santo Anselmo deixou-nos esse ensinamento: Creio para compreender e não compreendo para crer". Os Mistérios da nossa Fé não são discutíveis. Ou se aceitam ou se rejeitam. Fátima põs o mundo mais de acordo consigo mesmo ainda que em termos de Religião assistamos a uma espécie de "Igreja do princípio" que no dizer do então Cardeal Ratzinguer, é esta a Igreja do Futuro- a começar, a dar os primeiros passos nesta nova era caótica onde a guerra nunca triunfará sobre a paz! E contra aqueles que escreveram :"Fátima, nunca mais", acreditamos em Fátima, sempre!
ResponderEliminarQuem quer que seja... se tiver uma mente aberta, deixa-se interpelar por Fátima ou Lourdes ou Guadalupe, só os que têm a mente fechado não se deixam interpelar, nem por Fatima nem por nada de verdadeiramente bom humano e util
ResponderEliminarCaro amigo Jorge estas palavras que acabei de ler são muito muitas elucidativas que muitas que ouvi durante estas duas semanas,eu acredito mesmo sem ver ,assim como a minha fé não necessita de milagres para poder existir ,mas isso sou eu como católico ,mas quem está de fora questiona-se pois necessita de algo mais para compreender e as noticias são mais que muitas ,principalmente este ano que se celebram os 100 anos ,e mesmo para uma mente aberta existem às vezes coisas ou momentos difíceis de compreender ,ouvi D.António Marto na renascença onde dizia que era um céptico como padre em relação a Fátima,convertido depois em 1997 se não me engano ,para mim pessoalmente foi um choque aquele momento ,mas cheguei à conclusão que como ele existem muitos padres que comungam da mesma visão ,e no meu ver nesta minha caminhada como católico a maior parte dos padres que conheci não via neles aquela intensidade com a Nossa Senhora não tinham uma grande cultura Mariana,apenas um que via nele ,aliás ainda vejo apesar de estar longe de mim o padre Manuel Ribeiro Alves pároco de S.Pedro Azurém ,um devoto Mariano que naquele tempo todos nós o seguíamos através do movimento de Schoenstatt ,um ser extraordinário que tinha o dom de comunicar ,assim como o Jorge que naquele dia de todos os santos me cativou pelas palavras profundas que disse ,para terminar acreditando ou não acreditando todas as pessoas não ficam indiferentes a Fátima sinal disso são os milhares de pessoas que a visitam e encontram lá a paz que tanto necessitam ,um grande abraço Jorge .
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