Existe em três tempos - o presente, o passado e o futuro – e em três níveis de consciências - inconsciência, pré-consciência e consciência; no seu desenvolvimento passa por três fases - oral, anal e genital; a sua mente divide-se em três partes – Id, Ego e Superego - e possui três cérebros que funcionam autónoma e diferenciadamente no interior um do outro, como uma matrioska de três bonecas.
A teoria dos três cérebros ou do cérebro trino pertence ao neurocientista americano Paul MacLean (1960) que entendeu que as fases da evolução da vida em diferentes espécies até chegar à autoconsciência de si mesma nos seres humanos teve repercussões na génese e evolução do nosso cérebro.
O cérebro trino e a evolução das espécies
O cérebro humano é uma recapitulação da evolução, ou seja, inclui em si todo o conteúdo das fases evolutivas anteriores; o nosso primeiro cérebro é reptílico, do tempo em que os répteis dominavam a Terra. Depois deste veio o reino dos mamíferos, pelo que o nosso segundo cérebro é o cérebro mamífero ou límbico. De entre os mamíferos surgiram os primatas, os nossos antepassados, e, com eles, o nosso terceiro cérebro - o cérebro humano ou neocórtex.
De invertebrado a réptil
O primeiro ser vivo do nosso planeta era um ser unicelular, ou seja, possuía uma só célula; como exemplo de animal unicelular que ainda existe hoje temos a ameba. Ao surgirem os animais pluricelulares, as células tiveram que desenvolver mecanismos para poderem comunicar entre si. Esses mecanismos são ou impulsos elétricos ou sinais químicos: assim nasceram as neuromas, células especializadas em passar mensagens.
Estas células começaram a agrupar-se perto do olho e da boca do ser vivo e assim se formaram os primeiros cérebros, os dos moluscos e dos insetos, antes dos primeiros vertebrados, peixes ou répteis. Pensa-se que o cérebro nasceu há 750 milhões de anos.
A diferença do cérebro dos vertebrados (peixes, anfíbios, répteis, aves e mamíferos) e invertebrados (moluscos e insetos) é que podemos considerá-los como pré-cérebros, pois não concentram em si todas as funções vitais. Por exemplo, muitos insetos conseguem sobreviver durante dias sem cabeça, pois as funções principais de sobrevivência não estão concentradas no cérebro. O primeiro cérebro a controlar todas as funções vitais do animal foi o cérebro reptílico, comum a todos os vertebrados acima mencionados, incluindo os primatas e o ser humano
De réptil a mamífero
“Mais vale estar sozinho que mal acompanhado” - O réptil não cria laços afetivos com nada nem com ninguém. Para o réptil, todos os outros seres vivos para além de si mesmo são inimigos ou comida ou as duas coisas. O réptil é um ser solitário que não convive com os seus semelhantes nem sequer com as suas crias que nascem sozinhas de ovos previamente depositados e escondidos.
“A união faz a força” – O mamífero, ao contrário do réptil, é um animal intrinsecamente social. Os mamíferos nascem do corpo da mãe e durante algum tempo alimentam-se dela e relacionam-se com ela, bem como com os seus congéneres o resto das suas vidas. Ao contrário dos répteis que olham com indiferença para a sua prole, entre os mamíferos, os pais nutrem as suas crias física e afetivamente, protegendo-as do mundo hostil a ponto de arriscarem e às vezes perderem a própria vida. Uma vida tão diferente tem que ter como base um cérebro mais complexo, que assume, integra e engloba o cérebro reptílico, mas vai muito além deste.
Em virtude do relacionamento inexistente no cérebro reptílico, o cérebro dos mamíferos ou límbico desenvolveu motivações e emoções que regulam as relações que se estabelecem entre os animais da mesma espécie e os que não são da sua espécie. Se para os répteis a sobrevivência se resume apenas a comer e fugir ou atacar o inimigo, para os mamíferos a sobrevivência, não excluindo o que significa para os répteis, vais mais além e envolve a dor e o prazer.
O mamífero não se contenta com sobreviver, quer ser feliz e por isso busca o prazer e evita a dor. Grava experiências prazenteiras que repete uma e outra vez e também as experiências dolorosas que procura sempre evitar: “gato escaldado de água fria tem medo”. A felicidade, o conforto, o sentir-se bem são objetivos e motivações do nosso cérebro mamífero ou límbico emotivo e não do neocórtex.
De mamífero a primata e ser humano
Se observarmos a figura que ilustra este texto, verificamos que a maior parte do nosso cérebro é constituído pelo neocórtex, ou seja, pelo cérebro humano. Há um grande salto qualitativo e quantitativo entre os mamíferos, mesmo entre os primatas e os seres humanos.
Nos últimos 2 milhões de anos, o cérebro humano triplicou de peso e tamanho: “os homens não se medem aos palmos”. A dimensão do cérebro no mundo animal, incluindo o ser humano, não é proporcional à dimensão do corpo, mas à sua inteligência. O elefante é bem maior que o ser humano e, no entanto, não é tanto inteligente como este.
Os chimpanzés, que são os animais mais próximos de nós na evolução das espécies, nunca abandonaram o seu meio ambiente, a savana. O homo sapiens emigrou para todos os tipos de clima e topografias diversas. Este esforço de adaptação ao meio, assim como as relações entre congéneres no sentido de ajuda mútua e luta pela sobrevivência em ambientes hostis, levou à linguagem, ao pensamento abstrato e científico. O cérebro constituído apenas por emoções não era suficiente e foi forçado a evoluir e a ultrapassá-las.
A evolução do homo sapiens e a evolução cultural e civilizacional do homo sapiens segue a sua inteligência a par e passo. A descoberta da linguagem parece ser a grande revolução que fez com que o cérebro humano aumentasse consideravelmente de tamanho e de inteligência. Se avaliarmos a inteligência pelo maior número de sinapses ou conexões entre neuromas em rede, a linguagem reflete do mesmo modo uma maior conexão de conceitos entre si.
A isto juntamos a curiosidade própria dos humanos, que os leva a querer conhecer mais, a sua criatividade, a complexidade das estruturas sociais, o pensamento abstrato e a autoconsciência. Tudo isto distingue o cérebro humano do seu congénere ancestral, o cérebro límbico.
Bebé – criança – adulto
Embora um bebé já possua, desde o seio materno, os três cérebros e na fase adulta nunca deixe de possuir as fases anteriores de desenvolvimento, podendo até regressar a elas, maior ênfase é colocada num cérebro em detrimento dos outros dois, consoante a idade.
Nos primeiros tempos da sua vida, o bebé coloca toda a sua atenção no cérebro reptílico - a sua única preocupação é comer, dormir e procurar que todas as suas necessidades básicas sejam satisfeitas. Vive para si mesmo, os laços não são ainda importantes. É neste tempo tão parecido com os répteis, que até se desloca como eles, arrastando-se.
Na infância, a criança desenvolve uma fé cega nos seus pais e, por isso, deixa de se preocupar com a própria sobrevivência e segurança, toma-as como garantidas e passa a dedicar toda a sua atenção aos laços que desenvolve com os pais, professores, irmãos, colegas e amigos. Antes dos sete anos de idade, não tem consciência de si mesma e por isso vive plenamente no seu cérebro mamífero ou límbico. É o tempo idílico das emoções, durante o qual amar e ser amada, ser aceite ou rejeitada afetivamente é mais importante que a sobrevivência.
Na adolescência, juventude e idade adulta, não esquecendo as idades anteriores, o foco desvia-se dos laços e concentra-se mais na procura da própria identidade. É tão forte e tão importante a busca da sua identidade que o indivíduo pode até antagonizar-se com quem mais ama: - os seus pais - e até romper com eles. Foi o que aconteceu com S. Francisco de Assis, quando o pai lhe disse em público que até as roupas que vestia eram dele; Francisco despojou-se das suas roupas e foi-se embora nu. Neste tempo, a busca do sentido da vida, da sua vocação ou do seu lugar no mundo são mais importantes que os sentimentos e emoções; estas últimas são frequentemente sacrificadas quando o indivíduo persegue o sentido e a vocação da sua vida.
Três em um, um em três
Como na evolução das espécies animais, o animal superior não elimina o inferior; ou seja, quando certos répteis evoluíram para aves e mamíferos, continuaram a existir répteis. Da mesma forma, certos anfíbios transformaram-se em animais exclusivamente terrestres, sem que os anfíbios desaparecessem. Quando certos primatas se transformaram em homo sapiens, continuaram a existir - primatas, chimpanzés e gorilas.
Assim acontece com os três cérebros - cada um deles representa uma etapa na evolução das espécies, sucessivamente mais próxima do ser humano; de réptil a mamífero e a primata. Os cérebros posteriores assimilaram o anterior, construíram sobre o anterior sem o eliminarem, ou seja, foram-se agregando funções e capacidades às já existentes, sem as eliminar. O ser humano por ser humano não deixa de ser animal e ter com estes muito em comum.
Estes três cérebros funcionam de um modo não integrado ou com pouca integração, uma vez que cada um tem um grau de autonomia em relação aos outros dois. Este funcionamento autónomo é necessário e positivo porque nos livra de grandes dificuldades e pode salvar-nos a vida em caso de emergência. Mas também pode causar-nos grandes transtornos sociais porque o cérebro visceral ou reptílico influencia o cérebro límbico ou emocional e os dois, em conjunto ou de forma independente, influenciam o cérebro racional. No entanto, segundo nos diz a ciência (e isto é um pouco assustador), o contrário não acontece: em sentido contrário, o cérebro racional não tem capacidade de influenciar/alterar/ transformar o cérebro límbico nem o visceral. A experiência do dia a dia comprova isto: por muito que eu saiba que a barata é inofensiva, sempre terei medo de lhe tocar ou mesmo de a ver.
Embora o neocórtex, mais volumoso, seja responsável por mais funções e comande os outros dois, estes últimos não desaparecem e mantêm as mesmas funções de sempre, já que o neocórtex não se ocupa delas: são soberanos no seu campo. O neocórtex é a sede da razão, o cérebro límbico é a sede da emoção e o reptílico é a sede do instinto. Por isso, perante uma situação nova, o reptílico tem medo e pergunta-se se é seguro, o mamífero pergunta-se se vai resultar em prazer ou dor, se vai ser amado ou odiado, e o neocórtex interroga-se quanto ao sentido, ao que pode aprender, em que medida pode ser-lhe útil.
O neocórtex pode ficar confuso, em stress, ansioso e não saber o que fazer; o mamífero pode ficar deprimido, desmotivado e não ter vontade de fazer nada; o reptílico está sempre ativo, sempre alerta e sabe sempre o que fazer: “em tempo de guerra não se limpam armas”. O cérebro reptílico nunca se confunde, não se deprime e está sempre preparado para a ação em defesa da vida, para a proteger e defender. No entanto, se o neocórtex decide suicidar-se, o cérebro reptílico nada pode fazer. O neocórtex que está assente sobre os outros dois, literalmente por cima deles, é o tribunal supremo sem possibilidade de recurso.
O cérebro reptílico
É comum a todos os seres vertebrados, ou seja, a todos os animais que têm esqueleto e coluna espinal. Situa-se precisamente no topo da coluna. Ocupa 5% da nossa massa cerebral e a sua tarefa é reagir perante os estímulos do meio ambiente. A cobra, por exemplo, resume-se a uma coluna espinal que se movimenta arrastando-se por terra, com um pequeno cérebro no topo desta coluna que se formou há 500 milhões de anos. O cérebro reptílico é constituído por quatro partes distintas:
Gânglios basais – que se encontram na parte mais profunda do córtex cerebral e processam a informação sobre o nosso movimento corporal, ajustando-o a diferentes situações.
Sistema reticular – localizado no encéfalo, próximo da medula espinhal, e que regula o estado de sono e vigília. Filtra a informação que chega dos cinco sentidos, separando o que interessa do que não interessa, que não chega sequer à consciência.
Cerebelo – órgão sumamente compacto e antigo situa-se na parte posterior do crânio e a sua função é manter o equilíbrio e a coordenação muscular.
Tronco cerebral – situa-se entre o encéfalo e a medula espinhal, formado por 4 áreas distintas ligadas ao diencéfalo; serve de via de circulação de todas os mecanismos sensoriais, à exceção do olfato e da visão.
No seu conjunto, este cérebro é pequeno e simples, mas altamente funcional e eficiente. Os outros dois podem ser disfuncionais e até adoecer - o mamífero ou límbico pode deprimir, o humano ou neocórtex pode ficar confuso, neurótico, esquizofrénico, psicótico. Mas o reptílico nunca deixa de funcionar, nunca fica doente, está sempre alerta, vela quando dormimos, só a morte consegue desativá-lo.
Só existe o aqui e agora
O cérebro reptílico não tem memória do passado nem se projeta no futuro. Existe apenas no aqui e agora. Não aprende com as experiências nem precisa, pois é 100% regulado pelo instinto que, em si mesmo, segue as leis da natureza, imutáveis e deterministas, não sujeitas a mudanças no tempo.
Em constante luta pela sobrevivência
Internamente - nunca descansa, nunca dorme, nunca se desliga; regula as funções automáticas, rotineiras, habituais e inconscientes do nosso organismo, como o batimento cardíaco, a respiração, a tensão arterial, a temperatura constante, cura as feridas.
Externamente – também se mantém alerta, à exceção de quando dorme ou está em letargia ou hibernação. Em estado de alerta, possui reflexos que atuam através de um mecanismo simples e imediato chamado estímulo reação. Em caso de emergência, é este cérebro que nos salva.
Se acidentalmente colocarmos a nossa mão numa superfície muito quente, este mecanismo provoca a reação de retirar a mão de forma rápida e inconsciente que não provém de uma decisão consciente do neocórtex, uma vez que este é demasiado lento. A decisão instantânea provém do cérebro reptílico que vela pela defesa da vida em toda e qualquer circunstância.
“Palavra fora da boca é pedra fora da mão” – quando falamos sem pensar, estamos a ter um comportamento reativo; todo o nosso comportamento reativo provém deste cérebro. O comportamento proativo provém do cérebro emocional ou cerebral, pois requer tempo. Mas quando respondemos ou atuamos sem pensar, fazemo-lo a partir do nosso cérebro reptílico que, de forma acertada ou errada, julga a situação como perigosa.
Procura a satisfação das necessidades básicas
A sua única ocupação é a satisfação das necessidades básicas de sobrevivência e preservação do indivíduo. Para tal, ocupa-se com respirar, beber, comer, dormir e também com a sobrevivência e preservação da sua espécie. Por este motivo, procura copular com indivíduos do sexo oposto para assim se reproduzir.
O chamado “amor à primeira vista”, precisamente por ser tão rápido, é instintivo, desprovido de qualquer emoção; é pura atração sexual que provém do cérebro reptílico que motiva o instinto e a conduta sexual com a finalidade de preservar a espécie.
Instinto territorial
O cérebro reptílico simplista tem apenas três tipos de ações ou reações ao meio em que habita: ataca/ foge/ imobiliza-se/esconde-se. Para o réptil, todos os seres vivos se dividem em duas únicas categorias - caçadores ou presas. Perante um outro ser vivo, o réptil decide num milionésimo de segundo se é presa ou caçador. Se é presa, vai ser comida e atacada pelo seu caçador e, portanto, foge ou esconde-se; se é caçador, vai comer a presa e, portanto, ataca.
É frequente vermos no campo a tabuleta que indica uma reserva de caça privada: os seres humanos também possuem um instinto territorial. Poderíamos considerar as fronteiras entre países como uma das manifestações desse instinto.
Este mecanismo de sobrevivência justifica-se muito mais nos animais a partir dos répteis, por entenderem que para se sustentarem, crescerem e reproduzirem-se precisam de um determinado espaço de terra. Uma vez demarcado pela própria urina, como fazem os mamíferos, defendem-no com unhas e dentes e passam o dia patrulhando-o, de norte a sul, de este a oeste.
Quando é provocado, sente medo, e reage agressivamente
Sabemos pela psicologia que a raiva ou a ira são emoções secundárias, são reações ou respostas a uma situação que inspira uma emoção primária: quase sempre o medo. É certo que no contexto do cérebro reptílico, o medo não pode ser uma emoção, mas sim uma perceção de perigo que desencadeia no cérebro reptílico uma das três respostas – atacar, fugir ou esconder-se.
O cérebro reptílico não é agressivo por natureza, não odeia, não se vinga, não guarda ressentimentos porque não tem memória histórica, não guarda em si experiências passadas para poder comparar com as atuais e responder adequadamente, como faz o cérebro mamífero; não ataca ninguém se não for ameaçado; ao contrário do cérebro límbico, o cérebro reptílico não tem à priori amigos nem inimigos.
Caráter visceral ou instintivo
Como adiante veremos noutro texto, do ponto de vista psicológico as pessoas dividem-se em viscerais ou instintivas, emocionais ou cerebrais.
A pessoa com caráter visceral ou instintivo, tal como os répteis, é solitária, não precisa de relações sociais e não é dada a relações sociais e a estabelecer laços afetivos. Está mais orientada para a ação, para realizar tarefas e fazer coisas. Provavelmente, só procura os da sua espécie para copular; tudo o resto é antagónico.
Perdoa facilmente, porque tende a não guardar memória das ofensas passadas. Tem aliás uma memória muito seletiva e só memoriza o que lhe interessa; as ofensas passadas não fazem parte desse interesse; pode ser vingativo no momento, mas se deixa passar tempo, perde o interesse pela vingança, pois facilmente vira a página, não gastando energias a guardar ressentimentos.
É pacifica, está bem consigo mesma no seu cantinho, é territorial, não incomoda nem quer ser incomodada, e só responde agressivamente se for ameaçada ou provocada.
Diante do perigo, tem mais probabilidades de salvar-se a pessoa instintiva porque mantém a calma, não se deixa influenciar pelas emoções negativas do cérebro emotivo nem pela ansiedade, preocupação e stress do cerebral, não entra em pânico e conserva a calma e a frieza do instinto que raramente se engana. Muitos dos que se afogam no mar são bons nadadores mas, como são emocionais ou cerebrais, entram em pânico e morrem de ataque cardíaco antes de se afogarem; se fossem viscerais não se afogariam.
“Vale mais o mal conhecido que o bom por conhecer” – o cérebro reptílico não é muito dado à mudança, é amigo das rotinas e perde-se quando há mudanças muito rápidas. Por isso tende a ser conservador e a rejeitar todo o tipo de inovação, já que receia a mudança por não estar capacitado para enfrentar situações novas e adaptar-se a elas.
O cérebro mamífero (límbico)
Presente nos mamíferos inferiores e incipiente nas aves. Do tamanho de um limão, formou-se há 150 milhões de anos. É constituído pelas seguintes estruturas:
Hipotálamo – significa que está por baixo do tálamo; é tão pequeno que representa apenas 1% de todo o cérebro, tendo o tamanho de uma ervilha. Apesar de pequeno, regula muitas coisas no nosso organismo. Em relação às emoções, espoleta a segregação de hormonas como a adrenalina.
Amígdala – temos duas, uma de cada lado do cérebro; a amígdala é o centro da agressividade, do medo como emoção e da ansiedade. A amígdala associa emoções às memórias, pelo que as memórias mais emotivas são mais recordadas.
Tálamo – temos dois, um de cada lado do cérebro, responsáveis pelos quatro sentidos, à exceção do olfato; também são responsáveis pela sensação de dor, quente ou frio, pressão de um ambiente nos ouvidos. A sua importância para as emoções é clara, uma vez que sem os cinco sentidos não há informação para que as emoções aconteçam.
Hipocampo – tem importância na formação de novas memórias; converte as memórias de curto prazo em memórias de longo prazo. Estas memórias podem invocar emoções.
Cria laços
Uma das características mais expressivas dos mamíferos em relação aos répteis, é a sua tendência para viver em sociedade. Por uma questão de sobrevivência, estes animais tendem evolutivamente a manter-se juntos, para mais facilmente poderem sustentar-se, afastar predadores e garantir a continuidade da espécie.
Por exemplo, os mamíferos herbívoros mantêm-se juntos e muitas vezes conseguem afastar os predadores, pois a união faz a força; por outro lado, muitos mamíferos carnívoros não caçam sozinhos, mas em conjunto, como as leoas, pois assim têm mais possibilidades de conseguir uma presa.
O cérebro mamífero reflete esta evolução, criando mecanismos de aceitação, rejeição e expulsão do grupo com as suas emoções específicas. A figura da mãe e a relação que estabelece com as crias é importante para a sobrevivência destas; de facto, às vezes as mães rejeitam as crias e estas morrem. Eu mesmo verifiquei, num rebanho de ovelhas, uma cria rejeitada que era amamentada artificialmente com um biberão pelo pastor. A cria queria chegar-se à mãe, mas a mãe rejeitava-a e, já adulta, pastava sempre sozinha, fora do rebanho, pois se a mãe a rejeitava as outras ovelhas também a rejeitavam.
Sede das emoções
É a sede das emoções sobre as quais não temos controlo. Não decidimos ter raiva nem decidimos sentir amor ou ódio. As emoções não surgiram do nada, de alguma forma já estavam latentes nos instintos do réptil; a emoção é mais duradoura que o instinto, é como se fosse um instinto prolongado no tempo com memória histórica.
O amor provém do instinto sexual, que primeiramente faz com que dois seres se unam, usando-se um ao outro como objeto de prazer e desenvolvendo só mais tarde o sentimento de afeto um pelo outro. Isto acontece ainda hoje entre pessoas que se uniram sexualmente, pensando que seria por uma noite e depois permaneceram unidos o resto da vida. Depois do ato sexual, surge o amor incondicional pela cria, tão típico dos mamíferos.
O medo com perceção de perigo provoca a fuga; como emoção, acompanha e nasce do ato de fuga, do ato de esconder-se, imobilizar-se ou camuflar-se. A ira nasce e acompanha o ato de ataque da presa. A emoção é um estado mental que surge autonomamente no sistema nervoso e é positiva ou negativa, pois está ligada à satisfação ou não satisfação de uma necessidade. Portanto, é negativa se a necessidade não está satisfeita e positiva se está. O instinto é uma disposição inata e inerente a um organismo vivo, é uma reação a um determinado estímulo.
Aprende e guarda memória
Os mamíferos são também um dos grupos mais adaptáveis no que diz respeito ao habitat. Os répteis estão confinados aos climas quentes e moderados, onde hibernam durante o inverno, enquanto que os mamíferos existem em todos os climas porque são capazes de modificar o seu comportamento de acordo com o local onde se encontram. Possuem capacidade de aprendizagem devido ao seu cérebro com centro de memória a curto e a longo prazo. Os répteis não aprendem, por isso necessitam de um meio que não se altere, já que não têm capacidade para se adaptar.
Foge do sofrimento, procura o prazer
Se compararmos um gato com uma cobra, vemos que o gato possui um conjunto de emoções e respostas emotivas, o que não acontece com a cobra. O gato tem um cérebro que lhe permite procurar o prazer e evitar a dor, tendo mais liberdade que a cobra porque aprendeu, e aprendeu porque tem memória, pode guardar experiências que lhe provocaram dor ou prazer e saber no futuro o que repetir para ter prazer e o que não fazer para evitar a dor.
O carácter emocional
Como vimos, o réptil é geralmente solitário, não convive; o mamífero, pelo contrário, estabelece laços com os indivíduos da sua espécie que são importantes para a sua sobrevivência desde que nasce. Por isso, grande ênfase é atribuída ao estado de humor e aos sentimentos dos outros a fim de conservar a sua sensação de estar ligado a eles.
Mais do que os outros tipos, depende da aprovação e reconhecimento dos outros indivíduos para conservar a sua própria autoestima e a sensação de ser amado. Para garantir esse reconhecimento e essa aprovação, a pessoa emocional chega a criar uma imagem de si mesma que fará com que os outros a aceitem e a vejam como uma pessoa amável.
O cérebro humano (neocórtex)
É a camada mais externa, enrolada em torno do cérebro dos mamíferos. É a fase final do desenvolvimento do nosso cérebro. Formou-se há 3 milhões de anos, representa 76% de toda a massa cinzenta e está presente em todos os primatas, como gorilas e chimpanzés, bem como nos mamíferos superiores, como baleias e golfinhos. No entanto, os humanos possuem a versão mais desenvolvida e única. O ser humano é de facto o único mamífero que apresenta uma concentração tão elevada de neuromas em tão pouco espaço.
O cérebro humano está dividido em dois hemisférios: o hemisfério esquerdo que está associado ao raciocínio lógico, análise e decomposição de um todo em partes e à linguagem, e o hemisfério direito que está associado à criatividade, imaginação, aos processos associativos globais, ao processamento das emoções e das relações espaciais.
Lobo parietal – existe um em cada hemisfério do cérebro e a sua função é receber estímulos sensoriais exteriores ao corpo e interpretá-los cognitivamente com a ajuda da memória de perceções passadas. É importante para a atenção e o desenvolvimento de mapas mentais.
Lobo occipital – também existe um em cada hemisfério. Processa estímulos visuais de forma permanente, analisando distâncias, formas, cores, movimentos.
Lobo frontal - também existe um em cada hemisfério. É a área motora do cérebro, controla todas as funções do movimento. É também neste lobo que se encontra a área de Broca, responsável pela linguagem em todas as suas formas, falada ou escrita.
Lobo pré-frontal – é uma das áreas mais interessantes e decisivas para entender o nosso pensamento abstrato e até mesmo a nossa autoconsciência. Está também encarregado dos processos executivos, da tomada de decisões e de diferentes aspetos relacionados com a regulação das emoções.
Lobo temporal - também existe um em cada hemisfério. Tem várias funções, sem se especializar em nenhuma em concreto; é por isso “poli sensorial”, pois integra vias neurais auditivas, sensoriais, visuais e límbicas.
Linguagem e capacidade lógica
Este cérebro é muito mais volumoso que os outros dois e bem mais complexo. Trabalha no âmbito da lógica e do raciocínio: processa informação, possui uma linguagem e expressa-se por intermédio da fala e da linguagem corporal e escrita; vive no presente, mas tem acesso a memórias do passado que usa como base de dados, e chama a si o futuro, projetando-o através de conjeturas, antecipando-o e preparando-se para ele, fixando objetivos e metas.
Raciocínio abstrato
Tem a ver com a criação de ideias inovadoras, partindo da ligação entre diferentes conceitos aparentemente diferentes e sem nenhuma ligação lógica. É um pensamento desligado da realidade, dos factos e também do aqui e agora. Trabalha com conceitos gerais e não com coisas particulares. É o pensamento do filósofo e de alguns cientistas.
Curiosidade e criatividade
Usa o passado como base de dados para o presente e para se projetar no futuro, mas não é dependente desta base; pode também ignorá-la e ser 100% criador e inovador; pode enfrentar novos desafios de forma criativa, sem necessidade de se reportar a experiências passadas. “A necessidade aguça o engenho” - quando precisa verdadeiramente de algo, a criatividade é motivada. Em geral, o homem é curioso, tem uma sede insaciável de saber.
Autoconsciência e poder de decisão
A autoconsciência é o grande salto qualitativo entre o homem e os restantes animais. O ser humano tem consciência do ambiente que o rodeia, de si mesmo e dos seus processos e tem poder sobre a própria vida, até para acabar com ela, se quiser. Tem poder de decisão e de orientar a vida para um objetivo ou ideal, de acordo com a sua vocação ou talento.
Em relação aos animais, o homem vive enquanto os animais apenas estão vivos, uma vez que não são senhores do seu destino, estão ligados à natureza de uma forma simbiótica, obedecendo-lhe sem possibilidade de se rebelar. O homem não depende da natureza de uma forma simbiótica e acrítica e até tem poder para a adaptar aos seus desígnios e necessidades.
Projeção para o futuro
Tem capacidade para identificar um problema e encontrar uma solução para o mesmo; é muitíssimo mais criativo que o mamífero, por isso possui uma capacidade muito maior de se adaptar ao meio. Mais que adaptar-se, o homo sapiens adapta o meio a si mesmo, coisa que nenhum animal consegue fazer.
Como, ao contrário dos animais, tem poder sobre a própria vida, pode programar, projetar, fazer planos para o futuro. E em grande medida acerta, valendo-se da análise de experiências passadas e do conhecimento cada vez maior da natureza, das coisas e da sua própria natureza.
O caráter cerebral
Tende a perceber o mundo através do filtro cognitivo das faculdades mentais. Os objetivos desta estratégia são os de minimizar a ansiedade, lidar com situações potencialmente dolorosas e adquirir uma sensação de certeza por meio dos processos mentais de análise, conceção, imaginação e planeamento.
Abstrai-se da realidade onde pode perder-se e refugia-se no mundo das ideias, onde tudo obedece a parâmetros e paradigmas, onde tudo é previsível, contabilizável e qualificável. É ainda menos sociável que o instintivo. Face a experiências emocionais, usa os subterfúgios de mecanismos de defesa, como a racionalização e a negação
Presos no cérebro reptílico e límbico
O cérebro mamífero/límbico não possui nenhum conceito de tempo, presente, passado ou futuro; vive num eterno presente; um cão pode saudar-nos da mesma forma daqui a 3 minutos como daqui a três meses, três anos ou 30 anos. Para ele, o tempo não passou.
Este fenómeno também ajuda a explicar como funciona o mecanismo do trauma. O trauma é sempre uma experiência emocionalmente negativa que, portanto, pertence fundamentalmente ao cérebro límbico; o cérebro reptílico não tem traumas, pois carece de memória.
Pode parecer que as pessoas traumatizadas ficaram presas no passado. Para elas, algo que aconteceu há 50 anos é sentido como se estivesse a acontecer agora. Quando algo semelhante à experiência traumática, ou com a mesma natureza acontece no presente, espoleta a mesma reação que a pessoa teve no passado. Não é fácil convencer o nosso cérebro de que, como diz Heráclito, “não podemos banhar-nos duas vezes nas águas do mesmo rio”
Um bom exemplo, seria o jovem que cada vez que enfia uma camisola de gola alta na cabeça entra em pânico. Eventualmente, descobre que no momento do parto, a vagina da mãe não dilatou o suficiente e ele ficou por algum tempo preso. Agora, de cada vez que passa por uma situação semelhante, sente o que sentiu na altura.
Neuro marketing
Diz-se que 95% das nossas decisões de compra ou de voto neste ou naquele partido, não são decisões racionais. Por isso os que vendem produtos ou fazem campanhas políticas não apelam ao cérebro racional ou neocórtex; apelam aos outros dois, sobre os quais, como já referimos, exercemos menos controlo.
Propaganda comercial
Do ponto de vista lógico, faz mais sentido que se faça a publicidade a um carro usando um famoso piloto de Fórmula 1 do que uma mulher bonita, sexy e atraente; porém, é esta que mais aparece nas campanhas publicitárias de carros, mesmo quando o vulgo pensa que as mulheres não são grandes condutoras e não havendo, de facto, nenhuma competição de automóveis feminina.
Propaganda política
A Europa está invadida por partidos populistas que usam tanto o medo como o otimismo desmesurado e irrealista. Pessimistas e realistas não ganham eleições. O povo não quer ouvir a verdade, mas uma mentira conveniente, uma mentira que, pela repetição, soa a verdade, não a realidade verdadeira, mas uma realidade alternativa. Soluções fáceis para problemas complexos.
A propaganda política dos nossos dias tem muito de maquiavélico, pouco racional, apelando mais aos cérebros reptílico e límbico. A democracia está pervertida porque somos dominados sem nos darmos conta.
Conclusão: Os três hóspedes da nossa alma - a razão, o instinto e a emoção - não só têm diferente natureza, como também provêm de cérebros distintos; entre eles, a convivência nem sempre é fraterna, as decisões nem sempre se tomam por consenso, e a razão nem sempre é o fator determinante do nosso comportamento. Como dizia Pascal, o coração tem razões que a razão desconhece.
Pe. Jorge Amaro, IMC
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